A possível construção do Parque Municipal da Proteção Animal em São Virgílio da 2ª Légua, no interior de Caxias do Sul, tem tirado o sono dos moradores. O município não confirma que o local esteja definido, porque o terreno ainda não foi comprado e outras áreas foram visitadas em Santa Lúcia do Piaí e Vila Seca. Contudo, o secretário do Meio Ambiente, João Osório Martins, admite que das seis áreas avaliadas, essa, na região da Forqueta, é a que melhor se enquadra na proposta.
— É uma área bastante adequada, isolada e com a mata abundante no entorno. Um terreno com isolante térmico, isolante contra intempéries. Essa área oferece uma série de condições favoráveis para esse tipo de projeto.
O parque substituirá o atual Canil Municipal, que fica em um terreno de 20 mil metros quadrados em São Virgílio da 6ª Légua. A proposta prevê visitação, contemplação da natureza, despedida de animais de estimação, além de alojamento para cães.
Resistência entre os moradores
No ano passado, o Executivo desistiu da implantação do Centro de Bem-Estar Animal em Capela de São Francisco, na 6ª Légua, porque enfrentou resistência de moradores e por estar no período eleitoral. A escolha volta a enfrentar resistência de quem vive na localidade de Forqueta. No domingo (3), a comunidade de São Virgílio e São Valentim da 2º Légua e de Loreto protestaram contra a construção nesta região. A área fica entre as três comunidades e eles reclamam de não terem sido consultados sobre o assunto. A proposta já foi apresentada ao Ministério Público (MP), à maioria dos vereadores e para líderes comunitários.
"Não consigo mais dormir", relata morador da divisa com o terreno avaliado para receber a obra
Jair Bampi, 51 anos, é um dos moradores mais apreensivos, já que as terras dele estão na divisa com a área.
— Faz três noites que não consigo dormir. Como vou conseguir dormir? Estou muito triste, preocupado e com medo que tudo termine. A preocupação maior é com o meio ambiente. Temos nascentes desde a época do meu avô e nunca secou. Vai acabar com a mata nativa e água potável das nascentes — teme ele.
O produtor ressalta que não é contra os animais:
— Acredito que aqui, com poucas pessoas e com as casas afastadas, e próximo ao Centro de Caxias, vão vir de carro e largar os cães. Logo vão ser 2 mil cães ali nesse parque. Como os cachorros vão estar bem? O município não vai mais ter controle — aponta Bampi.
O produtor rural Manuel Bernardi, 67, mora em São Valentim da 2ª Légua. As terras dele estão há cerca de 1,5 quilômetro da área avaliada pelo município:
— Eu produzo uvas ecológicas e tenho clientes que compram as frutas até para fazer suco. Alguns já falaram que se o novo canil for construído próximo as minhas terras não vão mais comprar as uvas. Quero saber se a prefeitura vai comprar a minha produção se isso acontecer — questiona ele.
Leandro Melchior mora em Loreto e é presidente da Associação da Água, que representa as três localidades. A escola de Loreto e o Salão Paroquial são abastecidos pela água de um poço artesiano, que também chega até 75 famílias.
— Hoje, muitos moradores dependem dessa água para tudo. Não confiamos que não vai comprometer a água que bebemos. A área fica a mil metros do poço artesiano — alerta ele.
"Ficamos sabendo que pode ser aqui por acaso", aponta ex-vereador
O ex-vereador e presidente do Sindicato Rural, Raimundo Bampi, conta que os moradores descobriram sobre a instalação do novo canil por acaso. Ele e o ex-secretário do Meio Ambiente e vereador Ari Dalegrave foram convidados pelo prefeito Adiló Didomenico (PSDB) para conhecer o projeto do parque:
— Não somos contra os animais, mas nessa área é impraticável. Não houve diálogo, conversa com os moradores. Eles começaram a construir a casa pelo telhado. Queremos que eles descartem essa área, porque nós preservamos o lugar em que vivemos.
Dalegrave também questiona a escolha do local:
— Se não há risco de poluição porque não colocam próximo à bacia de captação, no Jardim Botânico? Nos falaram de um projeto ambiental e tem apenas um desenho. Onde está o estudo de impacto ambiental? Eles falam em bem estar animal, mas os cães vão estar isolados. Sabemos que na prática o município é incompetente, então logo teremos um novo depósito de animais.
O secretário do Meio Ambiente João Osório Martins garante que as etapas ambientais e legais que antecedem a execução do projeto vão ser obedecidas:
— Nós somos responsáveis pela questão ambiental no município e, se existe uma área que não vamos falhar, é nessa porque é o nosso dia a dia. Temos 24 técnicos qualificados, talvez os melhores do Estado, para trabalhar em cima do projeto e atentos a todos os requisitos legais em termos de licenciamento.
Avaliações
O presidente da Comissão de Saúde e Meio Ambiente, vereador Rafael Bueno (PDT), diz que é a favor do projeto, mas defende diálogo do município com a comunidade. Ele adianta que depois de solicitar um encontro para debater o assunto irá ocorrer uma reunião no dia 17, a partir das 9h, no Salão Paroquial de Loreto.
— É preciso ter a palavra prudência como premissa e serem feitos estudos antes de bater o martelo quanto à compra dessa área. É imprescindível um estudo técnico antes da implantação. O espaço é ótimo para contemplação, soltar animais silvestres, mas é preciso ouvir a comunidade, porque o que é para ser um grande projeto pode se transformar em uma frustração.
A promotora Janaína De Carli dos Santos ressalta que o MP irá analisar questões de legalidade, mas lembra que a escolha do local é decisão do administrador público. Ela ressalta ainda que aprova a proposta:
— Eu gostei do projeto, da concepção dele, pois alia alojamento para os animais e também espaços para uso pela população e também uma área para as ONGs. Espero que dessa vez realmente saia do papel — aponta.