A Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) indiciou quatro pessoas por tortura contra bebês em uma escola infantil de Caxias do Sul. A informação é do diretor do Departamento de Polícia do Interior (DPI), delegado Anderson Spier. As agressões foram gravadas em vídeos de monitoramento interno da própria escola, sendo que há imagens das salas dos berçários e da câmera do refeitório. Depois de fazer a manutenção das câmeras e assistir às imagens, em 31 de outubro, um dos pais entregou três cartões de memória à Polícia Civil. A denúncia ocorreu em 1º de novembro.
O inquérito foi finalizado em 8 de dezembro e remetido ao Judiciário em segredo de Justiça, mas a reportagem apurou que as indiciadas são a proprietária da Escola Maternal Colorindo o Mundo, no bairro Desvio Rizzo, e três professoras da escolinha. O indiciamento contra a dona da escola é por tortura omissiva, que significa, pela tipificação penal, que ela tinha o dever de evitar ou apurar os maus-tratos contra as crianças. O nome das indiciadas não foi divulgado.
O advogado Airton Barbosa de Almeida, que representa a proprietária da Escola Maternal Colorindo o Mundo, se manifestou por meio de nota: "a defesa não teve acesso às conclusões do inquérito. A persistir o entendimento preliminar de que a proprietária praticou conduta omissiva, se esta for também a posição do MP numa eventual denúncia, a defesa terá o processo judicial para apresentar todas as provas da inocência. A proprietária da escola agiu quando poderia e deveria agir.”
Vídeos
A investigação contra a escola começou em 1º de novembro, quando policiais da DPCA foram até a escolinha pela primeira vez. Na ocasião, a polícia afirmou que ao menos duas professoras apareciam nos vídeos agredindo as crianças. Conforme adiantou a delegada Aline Martinelli, em 14 de novembro, antes de encerrar o inquérito, isso não excluía a responsabilização de outras pessoas se fosse comprovado crime contra os bebês. A titular da DPCA também esclareceu que, no direito penal, há crimes que são praticados por ação e outros por omissão, sendo que as condutas omissivas também podem ser criminosas, especialmente quando cometidas contra crianças. Ainda segundo a polícia, as professoras foram desligadas da escola assim que o inquérito policial foi instaurado.
A escola está temporariamente fechada. A decisão foi motivada, segundo comunicado de 28 de novembro, anexado na porta do escola, pela inviabilidade financeira de manter as atividades. Isso porque, mesmo que fosse uma escola particular, a instituição atendia 36 crianças por meio de compra de vagas públicas, sendo 13 crianças no período integral e 23 crianças no período parcial. Logo após a investigação começar, em 10 de novembro, a Secretaria Municipal de Educação (Smed) rescindiu os dois contratos com a escolinha e transferiu as crianças para outras escolas conveniadas no município.
Nos vídeos, que recentemente vazaram nas redes sociais, professoras foram flagradas agredindo as crianças. Duas delas foram demitidas depois que a investigação começou, segundo a polícia. A mãe de uma menina de dois anos relatou à reportagem que reconheceu a filha levando chutes, tapas na boca e beliscões nas filmagens. O pai de outra menina na mesma faixa etária contou que a filha gostava de ir para a escolinha, mas chegava em casa machucada. Inicialmente, isso não levantava suspeitas, porque a família acreditava que era algo normal para a idade e que ela pudesse ter se ferido brincando ou caindo. A professora, ao ser questionada, teria afirmado que a menina se machucava sozinha enquanto estava brincando. Ao assistir às imagens em 31 de outubro, a família viu a profissional sacudindo a menina, que cai e depois levantando a criança pelos braços.
Entenda o caso
Conforme relatos de pais ouvidos pela reportagem, crianças do berçário da escolinha teriam sido agredidas por professoras. O caso foi descoberto a partir de gravações do sistema de monitoramento interno da escolinha. Um boletim de ocorrência foi registrado no dia 1º de novembro. Com as denúncias formalizadas, a DPCA abriu inquérito.
Após o caso vir à tona, a prefeitura de Caxias do Sul encaminhou uma nota à imprensa no dia 13 de novembro. Segundo o comunicado, havia 34 crianças matriculadas na escolinha, por meio do sistema de compra de vagas pelo município. Esse grupo foi transferido para outras instituições.
Ainda conforme a prefeitura, relatos de maus-tratos envolvendo duas ex-funcionárias da escolinha chegaram à Secretaria Municipal de Educação (Smed) no dia 8 de novembro por meio de familiares de crianças matriculadas na escola. No dia seguinte, representantes da prefeitura foram até a instituição, sendo informados sobre o afastamento das então funcionárias. No mesmo dia também houve a notificação de rescisão contratual com a escolinha.
Na ocasião, a direção da escola respondeu à reportagem que estava ocorrendo uma investigação em sigilo e que não tinha muito a dizer. Ainda acrescentou que "todas as manifestações são livres" e que "após a conclusão das investigações, aí teremos o que dizer, mas, neste momento, estamos respeitando a lei pelo sigilo".
O inquérito da DPCA foi concluído em 8 de dezembro e encaminhado ao Poder Judiciário. Os detalhes não foram divulgado por estar em segredo de Justiça.