Farroupilha chegou a 13 mortes violentas neste ano, igualando a marca de todo o 2021. No caso mais recente, dois homens foram mortos em confronto com policiais do 4º Batalhão de Polícia de Choque (4ºBPChoq) da Brigada Militar.
Os policiais atendiam uma ocorrência de roubo a uma casa na noite de terça-feira na cidade. Nas proximidades do antigo pedágio, entre Caxias do Sul e Farroupilha, um veículo Fox de cor prata foi abordado. Nele estava um homem de 38 anos que admitiu estar aguardando para levar os assaltantes até Caxias após o ato criminoso. O indivíduo possui antecedentes por ameaça e vias de fato.
Simultaneamente, na Rua Santa Maria, no Monte Pascoal, outra equipe do 4ºBPChoq tentou a abordagem a outro veículo suspeito onde estavam cinco homens. Conforme o Batalhão, três deles conseguiram fugir com o carro e os outros dois iniciaram uma troca de tiros com os policiais. A dupla foi atingida e morreu no local. Com eles, foram apreendidos três armas de fogo e o veículo que seria utilizado na fuga. Um deles estava com uma tornozeleira eletrônica. Até o momento, a identidade dos mortos não foi divulgada.
Durante a ação, foram apreendidos três revólveres e um carro. O primeiro homem abordado foi preso.
Moradores do Industrial temem violência
Com o número de mortes em um dos bairros mais violentos da cidade, os moradores do Industrial tem receio do que pode acontecer. Um morador de 28 anos que tem a identidade preservada conversou com a reportagem enquanto esperava para ir para o trabalho:
— A gente fica assustado. Nunca vi nada, mas sabemos que é perto de onde moramos.
Outro morador de 58 anos que vive no Industrial há 38 anos também tem medo:
— É assustador. Nós saímos para rua porque temos que trabalhar e é perigoso. Tem uma guerra aqui fora.
Uma moradora do bairro América de 42 anos que trabalha há 16 anos no Industrial também teme a situação:
— Faço esse trajeto todos os dias e não sei o que posso encontrar no caminho.
Escalada de violência
Pesquisador de segurança pública, o cientista social Charles Kieling diz nunca ter presenciado índices de violência tão altos em um município do interior gaúcho. Para ele o confronto entre organizações criminosas em Farroupilha é reflexo de uma estratégia realizada a partir de 2017 que transferiu apenados para presídios de outros Estados.
— Essas transferências possibilitaram um intercâmbio entre as duas maiores organizações do Estado e quadrilhas paulistas e cariocas que se reorganizavam no Brasil. Através de coalizões, elas expandiram seu território no interior gaúcho —explicou.
A relação entre o crime organizado de diferentes regiões, de acordo com Kieling, fez surgir um terceiro grupo dissidente que briga por espaço na Serra gaúcha e comanda as ações de dentro dos presídios.
— A penitenciária é um ponto de referência, onde as organizações estabelecem as ações, e isso comprova que o serviço de inteligência do Estado não está funcionando. As informações não são coletadas de forma científica nos presídios e a polícia não tem dados classificados para combater o crime organizado — afirma.
Sobre a escalada da violência no município, o titular da delegacia de Polícia Civil de Farroupilha, Ederson Bilhan, confirma que a maioria das mortes violentas tem relação com o tráfico de drogas e partiram dos presídios.
— Conversamos sempre com a Susepe (Superintendência dos Serviços Penitenciários) para aprimorar nossa relação institucional. Temos uma comunicação muito fluida — garantiu o delegado.
Ainda de acordo com Bilhan, a ocorrência da noite passada não tem relação com a disputa por território. Segundo ele, os homens mortos em confronto com a Brigada Militar estavam na iminência de assaltar uma residência e o caso é tratado dessa forma, pois "não há qualquer indício de relação".
A Polícia Civil aguarda a liberação do Posto Médico-Legal (PML) para identificar os homens que morreram em Farroupilha. O delegado Bilhan destaca que o Estado ainda mantém o controle da segurança pública e cita as prisões realizadas nos últimos dias.
—Foram oito prisões realizadas, também pela Brigada Militar, e assim vamos aniquilando aos poucos o poder das organizações. Ainda temos muito controle da situação — afirmou.
Sobre as questões levantadas pelo cientista social Charles Kieling, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) do Rio Grande do Sul informou ao Pioneiro que o “aumento pontual” de crimes contra a vida em Farroupilha será uma das pautas prioritárias deste mês da chamada reunião A1.
Esse encontro reúne lideranças do governo estadual para a elaboração de um plano de ação a ser validado diretamente pelo governador, Eduardo Leite, e pelo vice-governador e secretário da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior. Ainda de acordo com o texto, as informações de inteligência trazidas pelos servidores da Susepe serão consideradas.
O contraponto abaixo também elenca ações realizadas na Serra nos últimos dias como resposta à criminalidade.
Leia o contraponto na íntegra :
O município de Farroupilha é uma das 23 cidades priorizadas pelo Programa RS Seguro para o monitoramento intensivo mensal pela Gestão de Estatística em Segurança (GESeg).
Desde o seu lançamento, em fevereiro de 2019, o trabalho de avaliação e estratégia tem início em cada unidade operacional das cidades abrangidas, com representantes de todas as forças de Segurança, incluindo a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe).
Essas reuniões iniciam pelas autoridades locais, sobem para o nível de gestão das chefias das instituições e, na sequência, chegam ao colegiado de governo, a chamada reunião de A1, onde o plano de ação passa a ser validado diretamente pelo governador, Eduardo Leite, e pelo vice-governador e secretário da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior.
O aumento pontual dos crimes contra vida em Farroupilha já está previsto como uma das pautas prioritárias da reunião de A1 neste mês, que deve ocorrer na próxima semana e, levará sim em conta, como de praxe há mais de dois anos, as informações de inteligência trazidas pelos servidores da Susepe.
Cabe destacar ainda que, só na noite desta terça-feira (8/3), a Brigada Militar prendeu nove suspeitos de participação em crimes na Serra. Em Farroupilha, o efetivo do 4º Batalhão de Polícia de Choque (4º BPChq) deteve seis traficantes na rua João Fabro Filho, no bairro Industrial.
Houve a apreensão de 161 munições de calibres variados, duas pistolas calibres 380 e nove milímetros, três revólveres calibres 22 e 38, duas máquinas de cartão de crédito, 255 gramas de cocaína, 52 pedras de crack, três buchas de maconha, 18 câmeras de monitoramento, 11 telefones celulares, uma capa de colete balístico e R$ 2.432,00 em dinheiro. Na rua Sobradinho, bairro São José, também em Farroupilha, uma dupla foi presa pelo 36º BPM com 33 porções de crack, 32 porções de maconha, R$ 70,00 em dinheiro e oito munições de calibre 38.
Houve ainda, em Caxias do Sul, a prisão de um suspeito flagrado pelo 4ºBPChq com uma balança de precisão, uma espingarda calibre 28, cerca de 1, 6 quilo de cocaína e em torno de 1,3 quilo de maconha, na rua Giuseppe Pietro Zattera no bairro Desvio Rizzo.
Os assassinatos deste ano:
:: 8 de março = Dois homens foram mortos a tiros em confronto com a Brigada Militar durante uma tentativa de roubo a uma casa, na Rua Santa Maria, no bairro Monte Pascoal. A BM tinha informações de que a ação criminosa ocorreria e interceptou os suspeitos. Eles trocaram tiros com os policiais e foram mortos.
:: 6 de março = Jáison André Balbinot, 29 anos, foi morto por volta das 20h na Linha Paese, no interior do município em uma suposta tentativa de assalto. A Brigada Militar foi acionada para ir até o Hospital São Carlos para onde o jovem foi levado depois de ser ferido por um disparo de arma de fogo e onde já chegou sem vida. Conforme o boletim policial, o irmão da vítima, relatou à BM que os dois estavam saindo da casa de um amigo, quando um veículo de cor preta teria chegado ao local, e parado. O passageiro desceu, usando uma máscara, anunciou um assalto e efetuou um disparo de arma de fogo que atingiu a vítima, mas fugiu sem levar nada. Crime será investigado como latrocínio.
:: 1º de março = Itamar Alves Nunes, 48 anos, foi morto em um ataque a tiros a uma mecânica. Os atiradores estavam em um carro que foi incendiado após o crime. O ataque ocorreu por volta das 14h30min, próximo a uma oficina mecânica no bairro Industrial. Os atiradores usaram uma espingarda calibre .12. Investigações da Polícia Civil apontam para a disputa entre duas facções pelo tráfico de drogas na cidade, principalmente nos bairro Industrial e São José. A suspeita é que os grupos criminosos acionam comparsas de outras cidades para os executarem rivais. Cinco pessoas foram presas depois do crime.
:: 27 de fevereiro = Sidinei da Silva, 27 anos foi morto a tiros, na Rua Sobradinho, bairro São José, por volta das 17h30min. Ele morreu no local. Segundo informações levantadas pela polícia, os disparos teriam partido de uma caminhonete branca com três tripulantes. Ainda conforme a BM, a vítima tinha antecedentes relacionados ao tráfico de drogas. Foram apreendidas munições de diversos calibres.
:: 22 de fevereiro = Ediomar Pirolli dos Santos, 35, foi morto a tiros na esquina da Rua Tercílio de Mello, no bairro São José. Ele estava próximo de uma residência conhecida como ponto de tráfico e que foi um dos alvos da Operação Retorno.
:: 16 de fevereiro = Elisandra Flores dos Santos, 33, e Daniel Carlos Conceição Ferreira, 37, foram alvejados próximo da meia-noite em uma calçada da Rua Carlos Fanton, no São José, próximo a uma casa conhecida como ponto de tráfico. A residência foi atacada e incendiada por criminosos dois dias depois.
:: 16 de fevereiro = Kevin dos Santos da Silva, 18, e Daniel Rodrigues, 30, foram mortos no pátio do Condomínio Morada do Sol, no bairro Industrial. O autor surgiu a pé de um matagal dos fundos do residencial, por volta das 12h30min. No dia seguinte, um adolescente de 17 anos foi apreendido pela Polícia Civil como suspeito do duplo homicídio.
:: 30 de janeiro = Leocir Alves, 41, foi morto com um tiro no abdômen na Rua Ambrósio Crippa, bairro América. Ele estava em um matagal, ao lado de um condomínio, quando foi alvejado.
:: 22 de janeiro = Laurentina de Fátima Pereira, 59, e Ariomar Rodrigues da Silva, 55, foram assassinados ao lado do carro de Ariomar na Rua João Fabbro Filho, no Monte Pasqual. Segundo a investigação policial, o crime teve origem em uma desavença num bar próximo.