Crime que mais cresce no Rio Grande do Sul, os estelionatos podem fazer qualquer pessoa de vítima, basta alguns momentos de desatenção. Essa foi a lição apreendida pela advogada Cassiana Nery, 42 anos, que mora em Cambará do Sul, município de 6 mil habitantes nos Campos de Cima da Serra. Ela queria quitar o financiamento do seu carro quando foi enganada com um boleto falso.
O golpe aconteceu pela internet em agosto do ano passado. Cassiana havia tentado falar pelo telefone 0800 do banco financiador para realizar a quitação, mas teve dificuldades com o atendimento.
— Foi uma enrolação e não consegui. Aí entrei na internet, busquei pelo Google e abri o site do banco. Estavam lá diversas opções, como segunda via e cartão de crédito, mas cliquei no ícone do WhatsApp e fui redirecionada para uma conversa. Conversei com o atendente, que fez um bom atendimento e tinha um português correto — lembra a advogada.
Após confirmar o nome completo e CPF de Cassiana, o atendente enviou um boleto pelo próprio aplicativo. A advogada encaminhou o arquivo para o gerente do banco em que possui conta corrente e pediu a impressão. No dia seguinte, foi até a sua agência e fez o pagamento de R$ 10 mil.
— O valor condizia e tinha um pequeno desconto pela quitação. Fui até o banco e fiz o pagamento de R$ 10 mil. O documento tinha logotipo do banco, o código de barras, o valor, meu nome e CPF, parecia tudo certo — lembra Cassiana, que 15 dias depois foi procurada pelo banco financiador para tratar sobre uma parcela em atraso.
— Achei que fosse engano e informei a quitação. Mandei o comprovante, eles abriram o protocolo, fizeram análise do boleto e me responderam que o boleto era fraudado, que eu tinha sido vítima de um golpe.
A única alteração visível no boleto falso era uma observação abaixo do nome da vítima, com letras miúdas, onde era informado o nome e CPF de outra pessoa — provavelmente outra vítima que teve os dados clonados por estelionatários para abertura de contas fantasmas.
— Na hora não acreditei, é uma sensação muito horrível. Nos sentimos a pior pessoa do mundo, burra, impotente, enganada e violentada. É um abuso psicológico muito forte. Depois, começou a saga para tentar reaver meus R$ 10 mil, mas todos diziam que este tipo de crime é comum e é muito difícil recuperar dinheiro.
A advogada falou com ambos os bancos envolvidos e fez pesquisas com advogados especialistas e na internet. Cassiana relata que a conta em que o boleto depositou já era conhecida por estar envolvida em golpes.
— Não é coisa de bandidinho, tem muita gente envolvida nisso. O advogado sugeriu entrar com uma ação contra os dois bancos envolvidos, o meu que deveria ter checado o boleto e o do financiamento que deveria ter um ambiente seguro na internet, não permitir esses sites clonados. Foi um erro meu também, não quero ser inocente da história, porque vacilei. Mas, nós somos os consumidores. A parte hipossuficiente. Quando fazemos um negócio, confiamos nesse banco ou loja nossos dados pessoais que são, por lei, sigilosos. Como vamos desconfiar que o nome deste banco pode ser falso na internet.
A ação judicial não se concretizou, na verdade a fraude sequer foi registrada na Polícia Civil. Após um mês, o banco de Cassiana entrou em contato e informou que iria ressarcir os R$ 10 mil.
— Fui uma privilegiada neste mundo de golpes. Eles assumiram a responsabilidade e me ressarciram. O advogado me garantiu que este foi um procedimento fora do padrão. Acredito que minha sorte foi ter enviado o boleto para impressão pela agência. O banco pode ter se sentido responsável por não ter feito a conferência. Ou por ser uma cidade pequena, com uma única agência, onde todos se conhecem — cogita.
Normalmente, a resposta seria a que foi dada pelo banco do financiamento, que respondeu para Cassiana que não tinha responsabilidade sobre o caso e que cabia ao cliente ver a veracidade do site e boleto.
— O meu caso foi excepcional de fraude de boleto, pois a regra é as pessoas serem enganadas e extorquidas. Os bancos sabem que acontece. São processados e isso afoga o judiciário. Infelizmente, o Brasil, nos crimes de internet, é muito falho. Não acontece nada. Não conseguem rastrear o que acontece — opina a advogada de Cambará do Sul.