Depois de seis meses de investigação, a Delegacia de Repressão de Ações Criminosas Organizadas (Draco) de Caxias do Sul identificou 25 criminosos, sete deles caxienses, que formavam uma organização criminosa especializada em estelionato, principalmente golpes como o conto do bilhete e lavagem de dinheiro. Ela agia no Brasil inteiro: no RS, os golpes eram aplicados em Caxias do Sul e em Porto Alegre, mas também foram registrados casos em São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Segundo a polícia, em seis meses, a quadrilha movimentou R$ 2 milhões com os golpes.
Os 25 foram indiciados pelos crimes de organização criminosa, já que atuavam com tarefas e funções definidas e objetivo de obter vantagens financeiras, mediante a prática do crime de estelionato. Eles também foram indiciados pelo crime de lavagem de dinheiro porque depois dos golpes, disfarçavam a origem ilícita do dinheiro, efetivando diversas transações, conversões e movimentações para distanciar ainda mais o dinheiro da origem ilícita. Os nomes dos indiciados não foram divulgados em função da lei de abuso de autoridade. Nenhum dos integrantes foi preso em função do chamado pacote anticrime, e até mesmo em função da pandemia, já que é avaliada a periculosidade do infrator, avaliando se é um crime violento.
— Com a alteração, a Polícia Civil tem que procurar as vítimas de inquéritos em andamento e questionar se elas autorizam as investigações. No momento, com a pandemia, só irá para o presídio, por exemplo, pessoas com maior periculosidade que cometeram crime violentos. No caso do estelionato, atinge apenas o patrimônio — explica o titular da Draco, delegado Luciano Righês Pereira.
A investigação, concluída nesta sexta-feira (11), aponta que os estelionatários escolhiam os municípios avaliando o alto poder aquisitivo das vítimas. Em apenas um dos golpes, eles lesaram uma vítima em R$ 600 mil.
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Para o delegado, mesmo sem prisões, a operação é positiva:
— Conseguimos identificar cada um e sua função dentro da organização criminosa e solicitar o bloqueio de bens. As investigações começaram a partir de boletins de ocorrência registrados em Caxias do Sul. Por isso, ressalto a importância das pessoas registrarem e permitirem que a investigação prossiga. Sabemos que há muitos casos que sequer chegam ao conhecimento da Polícia Civil porque as vítimas têm vergonha de registrar. Muitos depósitos identificados nas contas dos golpistas são de vítimas que não registraram, impossibilitando uma investigação mais apurada.
Ele ressalta ainda que a investigação desvendou como funcionava o esquema de estelionato e lavagem de dinheiro do grupo e explica que o roteiro da quadrilha era sempre o mesmo: no momento da abordagem, o teatro dos estelionatários faz com que a vítima desvie do pensamento racional.
— Ele é roteirizado, sempre há a presença de dois golpistas, a pessoa humilde e a "autoridade" que dá veracidade a história. A vítima acaba acreditando que ganhou dinheiro, sendo envolvida e se iludindo e, às vezes, perde a economia de uma vida — detalha Pereira.
A rapidez do estelionatário, segundo o delegado, evita que a vítima tenha tempo de pensar sobre o golpe.
— Os golpistas apostam na ganância humana e a vítima acredita que irá ganhar grandes quantias de dinheiro ou obter vantagens. Ela nem percebe que ninguém troca um bilhete no qual ganharia muito mais dinheiro por um valor menor — aponta.
COMO ATUAVA A ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
O líder da organização escolhia os integrantes de confiança, que encontravam pessoas que aceitavam ser "laranjas". Essas pessoas abriam contas em diversos bancos e também se cadastravam em casas de câmbio. Após, eles repassavam os dados para que o dinheiro dos golpes fosse depositado nessas contas. Tanto os integrantes de confiança, quanto os "laranjas" recebiam comissões, de acordo com o valor que o golpistas conseguissem retirar das vítimas.
Com os dados dos "laranjas", os estelionatários escolhiam as vítimas nas ruas das cidades. As transferências ou depósitos iam diretamente para as contas dos "laranjas". Assim que a transferência ou depósito era efetuado, os golpistas informavam aos integrantes de confianças da organização. Esses membros e os "laranjas" iam até diversos bancos sacar ou transferir quantias de dinheiro para outras contas ou para contas de casas de câmbios, onde convertiam o valor recebido do crime em moeda estrangeira.
A QUADRILHA
Um integrante é de Barracão, com antecedentes por homicídio, porte ilegal de arma de fogo e jogos de azar No RS e por associação criminosa e estelionato tentado em SC. Na organização atuava na liderança. Natural de Portão e com antecedentes criminais por porte ilegal de arma restrita. É companheira do líder. Na organização criminosa atua de forma administrativa conseguindo contas bancárias, "lavando" dinheiro proveniente do crime, conseguindo "laranjas" para colocar os bens adquiridos com o dinheiro do crime.
Sete criminosos são de Caxias do Sul. Destes dois tem antecedentes por estelionato e um por roubo a pedestre e outros crimes. Os demais não tem antecedentes relevantes para a investigação. Pelo menos três caxienses tinham função de liderança e escolhiam "laranjas". Um deles recebia comissão por cada transação e pagava comissão aos "laranjas", e tem ligação estreita, recebendo orientações diretas do líder da organização. Os outros quatro eram "laranjas". Um dos indiciados é de Vacaria, sem antecedentes relevantes e atuava como laranja.
Três integrantes são de São José do Ouro, sendo que um deles tem laço estreito e recebe orientações diretas do líder da organização. O outro tem diversos antecedentes por estelionato e conto do bilhete. Na organização criminosa atua aplicando os golpes de estelionato e o terceira integrante não tem antecedentes e atuava ajudando o marido que ocupa um cargo de responsável por "laranjas". Outros dois integrantes são de Paim Filho e Tapejara, e ambos não tem antecedentes e eram "laranjas". Há ainda um integrante de Passo Fundo com antecedentes por lavagem de dinheiro, estelionato e furto qualificado no RS e por associação criminosa e estelionato tentado em SC.
A lista é composta ainda por três pessoas da região metropolitana, sendo dois de Porto Alegre e um de São Leopoldo. Os da capital, um deles tem antecedentes por latrocínio tentado e furtos e o outro não tem antecedentes, e ambos atuavam como laranja. O integrante de São Leopoldo e atuava como "laranja" emprestando o nome para registro de bens adquiridos por sua filha que é membro da organização e seu genro que é líder da organização
Três são do Paraná. Um natural de Curitiba, sem antecedentes. Outro de Foz do Iguaçu e o terceiro de Paranavai. Na organização criminosa atuavam como "laranja". Outras três pessoas são de Santa Catarina. Um de Ponta Grossa com antecedentes por associação criminosa e estelionato tentado. Outro de São Miguel do Oeste com antecedentes por ameaça e violência contra a mulher e o terceiro de Chapecó (SC), sem antecedentes relevantes.