Duas uvas francesas, a chardonnay e a pinot noir, são as primeiras a brotar nos pomares da família Mariani, no interior de Bento Gonçalves. Desde a primeira semana do ano, os cachos das duas variedades de brotação precoce são colhidos desde o amanhecer até a metade da tarde, quando são armazenadas no caminhão que, na manhã seguinte, irá partir para entrega na cooperativa. Ao longo de três semanas, os irmãos Gustavo e Cristiano Mariani estimam colher cerca de 50 toneladas das duas variedades.
- Tivemos um início de safra antecipado em relação a anos anteriores, talvez em uma ou duas semanas. Isso é bom, porque nos permite aproveitar um período de dias ensolarados e de menos chuva, como é característico dos primeiros de janeiro. Para o produtor, quanto antes puder fazer a colheita, aproveitando o máximo do clima de verão, melhor - destaca Gustavo, 45.
O agricultor explica que a quantidade certa de horas de sol e de dias de chuva é o motivo principal para o sucesso de uma safra, reunindo qualidade excelente e boa produtividade nos cachos. Foi isso que o último ciclo apresentou, permitindo aos agricultores crer que será possível compensar, no balanço deste ano, a perda registrada na última temporada (cuja queda foi de 26% no Estado, a mais acentuada desde 2016).
- Ter uma quantidade razoável de chuva e não ter a ocorrência de frio e geada fora de época ajudou muito as videiras a produzirem bem desde a brotação. Não é o volume de chuva o que mais importa para ter uma uva bem nutrida, mas sim as horas. Se chove por dias a fio, prejudica todo o processo, principalmente porque podem aparecer fungos que irão fazer alguns cachos apodrecerem. Uma chuva de curta duração por semana, para manter o solo molhado, é o ideal.
Para aproveitar ao máximo os primeiros dias do ano, período ideal para extrair as variedades precoces, os agricultores não apenas despertam cedo, por volta das 5h, como abrem mão do descanso até no período de festividades. Cristiano Mariani comenta que, ainda que se permitisse ir à praia ou fazer qualquer outra viagem, a cabeça estaria nos parreirais:
- Ao longo do ano a gente mantém esse cuidado para não trabalhar mais do que o necessário, porque descansar também é importante. Mas, quando chega nessa época, a gente não consegue ficar tranquilo sabendo que o trabalho do ano todo pode ir abaixo com uma chuva mais forte. Tu sempre acha que deveria estar colhendo. No final é que a gente vai poder parar uma semana ou duas, antes de começar tudo de novo.
Uma mão lava (e ajuda) a outra
Quando a safra da uva estiver em seu auge, propriedades como a da família Mariani estarão repletas de trabalhadores contratados para ajudar na colheita. Para dar conta da colheita das variedades precoces, uma prática comum neste período é a chamada “troca de dias” com os agricultores vizinhos, que se dispõem a oferecer - para depois receber - ajuda.
Na manhã de ontem, quem contribuía com os irmãos Mariani, como já fazem há pelo menos 10 anos, era o casal Alex e Rejane Balotin, 47 e 45 anos. Os vizinhos ainda terão de esperar pelo menos mais uma semana para colher as primeiras uvas de suas videiras, da variedade malvasia de cândia, utilizada principalmente no preparo de espumante moscatel. Enquanto isso, é com a mesma dedicação que emprestam sua força aos vizinhos.
- Antigamente não havia tanta variedade precoce, então era comum que todos colhessem suas uvas na mesma época. Conforme foi possível diversificar, passamos a investir nesse sistema de troca de dias de trabalho entre vizinhos. Porque não compensa chamar alguém para trabalhar por uma semana ou duas para depois parar de novo até colher a próxima variedade _ explica Alex, membro da terceira geração de agricultores da família.