Há pouco mais de um ano, a prefeitura de Caxias do Sul anunciou três medidas que buscavam melhorar os atendimentos nas urgências e emergências do Sistema Único de Saúde (SUS), além de desafogar as filas em hospitais e unidades de pronto atendimento (UPAs).
Além de orientar a população, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) planejava aumentar a oferta de consultas nas UBSs, reorganizar atendimentos de emergências nos prontos-socorros dos hospitais Geral e Pompéia e criar um fluxo para encaminhar crianças com doenças respiratórias que não precisassem de internação ao Ambulatório de Doenças Respiratórias em Pediatria (Adrep), que funciona no Centro Especializado de Saúde (CES).
Desde o anúncio das medidas, a Secretaria da Saúde começou a divulgar um quadro, dividido nas faixas não urgente (azul), pouco urgente (verde), urgência (amarelo) e emergência (vermelho). A tabela traz os sintomas e onde cada paciente pode buscar ajuda (veja abaixo). Conforme a titular da pasta, Daniele Meneguzzi, algumas das medidas surtiram efeito positivo, uma vez que foram implementadas de forma imediata e continuam sendo adotadas pelo município. A secretária ressalta, porém, que o controle do acesso às emergências dos hospitais ainda é um desafio.
— As emergências do município estão sempre de portas abertas, ou seja, os pacientes podem buscar atendimento em qualquer uma delas. O que buscamos sempre reforçar é que é preciso educar a população para que busquem o recurso adequado para o tipo de atendimento necessário. Por exemplo, se o paciente está com febre, com uma indisposição, ou com uma dor de garganta, ele não deve buscar atendimento no pronto-socorro de um hospital e, sim, numa unidade básica de saúde ou nas UPAs. Essa organização é muito importante para que os espaços de atendimento possam estar organizados e disponíveis para os casos que realmente precisam do atendimento — destaca a secretária.
A titular da saúde afirma ainda que em torno de 80% a 85% dos atendimentos nas UPAs são de casos leves, classificados como não urgentes ou pouco urgentes, que poderiam ser consultados nas UBSs, ao mesmo tempo que sobram consultas nos postinhos, pois muitas pessoas que marcam atendimentos, por vezes não aparecem.
Segundo Daniele, as pessoas preferem ir às UPAs pela comodidade, localização e facilidade de acesso aos métodos de diagnóstico, como raio x, por exemplo, podendo sair com os exames realizados e a medicação fornecida. Além disso, o horário de funcionamento das UBSs são reduzidos em comparação às UPAs, que operam 24 horas.
— Essa é uma questão muito cultural. Muitas vezes, as pessoas nem tentam procurar a UBS e vão direto para as UPAs. E não há nada de errado, mas o ideal é buscar a unidade básica de saúde porque ela, sim, vai fazer um acompanhamento global e sistêmico desse paciente, não apenas médico — afirma Daniele.
Relatos de pacientes que procuram a UPA Central
A reportagem do Pioneiro esteve na UPA Central na última terça-feira (3) ouvindo alguns usuários. Durante a manhã, cinco pessoas relataram problemas como enxaqueca, sinusite, amigdalite, tonturas e dores de estômago. Dentre os relatos, alguns disseram que não procuraram as UBSs e foram direto para a UPA, outros relataram que na UBS teria que marcar consulta, disponível apenas para dia seguinte.
Já durante a tarde, outras cinco pessoas foram ouvidas pela reportagem. Uma delas relatou problemas nos rins, citando que foi até a UBS, porém as fichas de atendimento já haviam sido entregues. Na UPA, a paciente entrevistada pela reportagem disse que tinha certeza de que seria atendida. Outras pessoas relataram dores de cabeça, fisgadas na barriga, tosse e febre.
Os pacientes relataram ainda que se as UBSs pudessem atender as pessoas no mesmo dia, sem a necessidade de agendamento, eles prefeririam procurar as unidades básicas sem precisar se deslocar até as UPAs.
— Nas unidades básicas de saúde, temos uma divisão para utilização das consultas médicas. Uma parte fica reservada para as consultas do dia, ou seja, aquelas pessoas que estão com gripe ou dor nas costas, por exemplo, ou que estão com alguma situação de saúde que não é tão urgente a ponto de precisar ir pra UPA, se ela não consegue a consulta, tem um enfermeiro que faz a triagem e uma avaliação. Se ele (enfermeiro) entender que aquele caso precisa ser priorizado no dia ou, no máximo, no dia seguinte, o paciente será atendido ou encaminhado para outra UBS da região ou para a UPA — explica a secretária.
Oferta de consultas nas UBSs
Outra medida anunciada pela prefeitura à época foi o aumento da oferta de consultas nas unidades básicas de saúde do município. Desde o ano passado, a secretária afirma que foram ampliadas as ofertas de consultas para urgência daquelas disponíveis no dia. Por exemplo, se uma UBS tem 50 consultas disponíveis por dia, anteriormente, 20% dos atendimentos eram reservados para urgência. Agora, a SMS passa a ofertar 30%, sendo que outros 70% ficam para os atendimentos eletivos, agendados pelo paciente na própria UBS, ou pelo Agenda+UBS.
— Essa medida foi adotada para desafogar as UPAs, porque o paciente que precisa de uma consulta no dia, se ele não consegue, para onde ele se dirige? Para as unidades de pronto atendimento, que também estavam com um número de atendimentos muito acima daquele esperado, gerando muitas vezes uma demora, acima daquilo que é preconizado pela escala de Manchester, que é o protocolo que usamos para fazer a triagem e classificação dos pacientes por risco — detalha a secretária.
Já em julho de 2024, a prefeitura adotou outra medida que, segundo a secretária, ampliou o número de consultas nas UBSs. Foi a contratação de uma empresa para suprir ausências pontuais de médicos em postinhos do município.
A MedEnf Serviços Médicos e de Enfermagem, com sede em Ivoti, realiza a contratação de horas-médicas para completar o quadro clínico das unidades básicas de saúde (UBSs) em situações pontuais, como férias, folgas e atestados de três dias ou mais.
— Hoje, de fato, nós estamos ofertando mais consultas. Em julho do ano passado, por exemplo, as unidades básicas de saúde ofertaram em torno de 31 mil consultas. Já em julho deste ano, foram quase 34 mil — comemora.
Hospitais para urgências e emergências
A secretária da Saúde reforça que os hospitais devem ser buscados pelo paciente quando existem situações de risco de vida. Antes de chegar à instituição de saúde, o paciente sempre deve buscar a unidade básica de saúde.
— O hospital é um recurso de alta complexidade e que precisa ser bem utilizado, justamente porque nós temos também esse problema na cidade que já está instalado há muitos anos que é a falta de leitos. E a emergência, muitas vezes, acaba se tornando uma unidade de internação. Quando não tem leito no quarto ou na UTI, o paciente fica na emergência. Então, é importante buscar a emergência para casos realmente graves — recomenda a secretária.
No mês passado, foi finalizada a ampliação da nova ala do Hospital Geral, com a abertura de 40 novos leitos de internação e enfermaria. A titular da pasta reitera que, atualmente, o tempo de espera por leito gira em torno de 24 a 72 horas, nos casos em que os pacientes não apresentam risco de vida. O hospital deve sempre reservar os leitos para pacientes graves. Essa regulação, segundo Daniele, é feita pelos próprios médicos.
— Ainda temos alguma fila de espera, sim, isso é natural. É utópico pensar que uma cidade como Caxias do Sul, e que é referência para alta complexidade para 49 municípios, nunca vai ter uma fila de espera. Essa fila vai acontecer, mas para aqueles casos que não são tão graves. Aquele paciente que realmente corre risco de vida tem a sua prioridade e o acesso ao hospital através da emergência — afirma Daniele.
Atendimento a crianças e por meio da telemedicina
Crianças com doenças respiratórias, que não precisam de internação, passaram a ser atendidas no Ambulatório de Doenças Respiratórias em Pediatria (Adrep), no Centro Especializado de Saúde (CES).
Conforme a secretária, o ambulatório atendeu mais de 4 mil crianças nesse primeiro ano. Lá, elas têm tratamento com um pneumologista, sendo que alguns dos casos podem ser de crises de asma, suspeita de bronquiolite viral aguda, suspeita de pneumonia ou tosse persistente, por exemplo. Elas podem ser encaminhadas ao local pelas UBSs, sendo que a consulta é marcada para o dia, ou, no máximo, para o dia seguinte.
Esse novo fluxo para encaminhar as crianças com doenças respiratórias foi pensado tendo em vista o inverno característico da região, que traz consigo um volume maior de pacientes com doenças respiratórias.
— São 4 mil crianças que talvez precisassem acessar uma internação hospitalar e que tiveram, a partir do encaminhamento das UBSs, o atendimento nesse ambulatório. Então, ele segue funcionando o ano todo, não apenas no inverno — reforça Daniele.
Na ocasião do anúncio das medidas da prefeitura, a telemedicina foi citada com uma alternativa para o futuro da saúde. Conforme a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), 24 empresas se candidataram e apresentaram propostas, porém, na última semana, a pasta informou que as empresas tiveram a documentação reprovada durante uma análise técnica.
Com isso, a SMS irá repetir a licitação para selecionar a empresa que será responsável por implantar o serviço de telemedicina no município. A nova data de abertura da licitação deve ser publicada nos próximos dias.
Em nota, a SMS afirmou que cada documento entregue foi verificado de forma rigorosa pela equipe da prefeitura, conforme os critérios informados no edital da licitação. Com a documentação, cada licitante deve demonstrar que tem capacidade de realizar o projeto previsto.
A ideia é que a telemedicina em Caxias seja usada para atendimentos de casos leves e para renovação de receitas.