Enquanto uma das mãos da agricultora Ivânia Morais, 51 anos, segura firmemente uma caixa com mudas apoiada sobre o ombro, a outra sustenta um vaso de plantas e se prende a uma corda para garantir o equilíbrio durante a travessia do Arroio Pinhal. Essa tem sido a rotina não só dela e do marido para garantir o sustento da casa, como de outras 39 famílias que vivem em Vila São Pedro, interior de Caxias do Sul. Sem a ponte levada pela força da água em maio, uma passadeira para pedestres instalada pelo Exército há pouco mais de um mês tornou-se a principal alternativa para os moradores acessarem a BR-116 e a área urbana do município.
Embora garanta a saída e a entrada da comunidade, a passadeira é considerada uma solução paliativa, uma vez que só permite o acesso a pé e também porque é retirada pelos militares em dias de chuva. Quando isso ocorre, uma pinguela, feita de madeira pelos próprios moradores em maio, é o único caminho disponível, mesmo não tendo a segurança atestada pelas autoridades. Não há previsão de construção de uma nova ponte, com trânsito para veículos, em um futuro próximo.
— Eu e meu marido vendemos nossas plantinhas no Ponto de Safra nas sextas-feiras, então, toda quinta de tarde a gente tem que levar as coisas para cima (às margens da BR) nas costas. Isso quando o tempo não está chovendo. Porque, quando chove, a única alternativa é a pinguela, que está bem perigosa. A gente se sente muito triste com essa situação — lamenta a agricultora Ivânia Morais.
O arroio é ladeado por barrancos íngremes, com pedras soltas, que tornam o acesso à passadeira ainda mais complicado, principalmente para as crianças e os idosos que vivem na Vila São Pedro e precisam se deslocar à escola diariamente ou recorrer a serviços médicos, por exemplo.
— É ruim, porque às vezes a neném tá doente e precisamos ir no pediatra. Tem que sair no meio do barro. A gente não tem para onde ir, não temos o que fazer — ressalta a moradora Jaqueline Kaminski Ferreira, 22 anos, mãe de uma bebê de três meses.
Para tentar agilizar a reconstrução da ligação, os moradores planejam abrir uma vaquinha online. A arrecadação de recursos, entretanto, depende da formalização de uma associação, com CNPJ, e também da idealização de um projeto que aponte o custo de uma nova estrutura.
Ministério Público sugere busca de recurso federal
A situação da Vila São Pedro é acompanhada pelo Ministério Público antes mesmo da queda da ponte, em maio.
De acordo com o promotor de Justiça Adrio Gelatti, a área passou a ser do Estado em razão de uma execução fiscal contra uma antiga empresa local. Com o tempo, os terrenos foram ocupados e, sem ação para remover os moradores da época, veio o processo para urbanização. Em março, o governo estadual foi condenado a garantir a infraestrutura no local.
Segundo o promotor, diante deste impasse, há uma tratativa para que se busque recursos federais para a construção da ponte.
— Se não for positiva essa hipótese, irei buscar a reconstrução via cumprimento de sentença de uma ação civil pública que ajuizei contra a Estado e foi julgada procedente, e na qual o Estado é obrigado a, entre outras obrigações, implantar a infraestrutura do loteamento, na qual entendo estar incluído o acesso (ou seja, a ponte) — sinaliza.
Por meio de nota, o governo do RS informou que a ponte "não é de responsabilidade do Estado, pois interliga uma rodovia municipal a uma rodovia federal. Atualmente, o governo do Estado faz a interlocução junto ao Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) para a construção do acesso alternativo".