Três semanas após a noite dramática em que as cerca de 40 famílias moradoras da Vila São Pedro, no distrito caxiense de Vila Cristina, tiveram de deixar o local às pressas, abrindo caminho pelo mato, com idosos e crianças, a vida começa a voltar ao normal. Pelo menos já foi possível, para a maioria das famílias, retornar para casa, limpar o barro e sanar os danos possíveis. A comunidade, no entanto, ainda lida com a dificuldade de acessar a zona urbana, onde estão seus empregos e as escolas das crianças.
Sem poder contar com a ponte que passava sobre o Arroio Pinhal, conectando os moradores com a BR-116, a ponte temporária construída como solução oferece pouca segurança, especialmente em dias de chuva e ventania, mas também à noite, devido à falta de iluminação. Muitos trabalham fora e têm de fazer o trajeto pela pinguela mais de uma vez por dia. Fora situações em que é preciso se deslocar por motivos de saúde ou para fazer compras. As crianças, que estudam na Escola Municipal Assis Brasil, não estão indo às aulas.
Quem precisa trabalhar e pode dar um jeito de se manter fora de casa ainda prefere esta opção. É o caso de Gustavo Prestes, 20 anos, que está morando temporariamente na casa dos sogros, em Farroupilha.
A nossa sensação sempre foi a de que somos invisíveis. Antes disso tudo, quem sabia que existia a Vila São Pedro de Vila Cristina?
EDEMAR BRUCH
Morador
— Nós conseguimos sair meia-hora antes de descer a terra na nossa casa. No outro dia, às 5h, a ponte caiu. Temos uma filha de um mês e a gente já estava sem luz, por isso quis ir para a casa da sogra. Não esperava que ia acontecer isso tudo. Só conseguimos voltar ontem (quarta-feira, dia 22) para começar a limpar com uma máquina emprestada, porque tinha um metro de terra na parede — conta Gustavo.
Ainda com o acesso precário garantido apenas pela ponte improvisada, alguns moradores que tiveram de sair da localidade ainda não puderam retornar para buscar carros ou motos. Voltar a ter a circulação de veículos é uma das urgências para poder solucionar a falta que faz a ponte até a BR-116, ainda que os moradores tenham pouco claro a quem pedir ajuda. Isso porque, antes mesmo da enchente, o governo do Estado, que passou a ser dono daquela área após execução fiscal da empresa que era a antiga dona, foi condenado, em março deste ano, a construir uma ponte mais segura no local. A ponte original também havia sido feita pelos moradores, assim como a pinguela atual.
— Ganhamos esta ação, mas nada aconteceu. Até agora, tudo o que foi feito foi por nossa própria conta. A sensação sempre foi a de que somos invisíveis. Antes disso tudo, quem sabia que existia a Vila São Pedro de Vila Cristina? — desabafa o morador Edemar Bruch, 41, que retornou para casa no último domingo, após ter passado três semanas abrigado no Ginásio do Sesi com a esposa e os dois filhos.
O Ministério Público já solicitou ao governo estadual a reconstrução da ponte, sugerindo a instalação de uma estrutura provisória enquanto a obra não for efetuada. Enquanto aguarda por uma solução, a comunidade já pediu socorro à subprefeitura de Vila Cristina e à prefeitura de Caxias. A prefeitura, no entanto, sinalizou que não há previsão para a obra, que depende de um estudo minucioso e da obtenção de recursos. Independentemente de onde venha, só com ajuda os moradores poderão retomar a vida que tinham antes.