Com a suspensão dos voos no Salgado Filho, em maio, e o ataque a um carro-forte um mês depois, em junho, o Aeroporto Regional Hugo Cantergiani, em Caxias do Sul, ganhou a atenção de todo o país. Possivelmente, nunca se pronunciou tanto o nome masculino, de raízes italianas, como nos últimos tempos. Mas, afinal, quem é homem que dá nome ao aeroporto da Serra?
Hugo Cantergiani teve uma vida breve, morreu aos 29 anos, mas que pode ser caracterizada como intensa. O livro Um risco no céu - Odisséia de um aviador, do ex-vereador Enrico Emilio Mondin, conta que Cantergiani foi o primogênito de uma família de 10 irmãos. Filho da professora Luiza Marchioro Cantergiani e do comerciante Heitor Ettore Cantergiani, ele nasceu no dia 2 de janeiro de 1908, em Caxias do Sul.
A vida, como conta o livro, seguiu em um casarão verde, de esquina, na Rua Coronel Flores. Foi ali que o amor pela aviação começou a ser despertada no rapaz.
— Ele recebia jornais e revistas da época e eram ilustradas com notícias e fotos de avião. Isso foi aumentando a paixão dele — conta o aposentado Hugo Roberto Cantergiani, 82 anos, sobrinho do aviador e que foi batizado com o mesmo nome em homenagem ao tio.
O sonho alimentado pelas fotografias de jornal, na infância, começou a ser colocado em prática aos 21 anos, quando Cantergiani se matriculou na Escola de Aeronáutica do Exército, no Rio de Janeiro. Lá, alcançou a patente de 3º sargento aviador.
— Ele começou como piloto no Exército, mas, alguns anos depois, sofreu um acidente e teve uma perda parcial do movimento de um dos braços. Isso fez com que ele não pudesse mais servir — detalha o professor de História Vagner Augusto Pedri, cujo trabalho de conclusão de curso se debruçou sobre a criação do aeroclube do município.
A ocorrência narrada pelo pesquisador foi registrada no fim de 1933. Conforme publicação do Jornal Diário de Notícias, do dia 5 de dezembro do mesmo ano, Cantergiani estava acompanhado do piloto Edmundo Seixas, de 24 anos, quando a aeronave modelo Moth K142 caiu nas águas do antigo Porto Maria Angu.
Seixas, descrito pela reportagem como um dos melhores mecânicos da aviação militar, não resistiu aos ferimentos. Já Cantergiani sofreu ferimentos graves no braço esquerdo, além de contusões e escoriações, sendo internado no Centro Médico da Aviação Naval.
Impossibilitado de seguir a carreira na aviação militar, diante da condição do braço esquerdo após o acidente, Cantergiani, então, resolveu se dedicar à aviação civil, fundando, com amigos, a própria escola.
Uma matéria do jornal Correio da Manhã, de 1937, detalhava que Cantergiani atuava como instrutor de pilotagem na Escola de Aviação Civil e que "tinha grande e justo orgulho" da própria instituição. Segundo o material, em dois anos, 25 pilotos foram "brevetados", ou seja, receberam o brevê — a carta de curso de aviação.
"Brasil" escrito em fumaça no céu carioca
Um dos fatos mais comentados sobre a vida de Cantergiani foi registrado em 1935. A pesquisa de Petri e o livro de Mondin narram que em novembro daquele ano, o piloto, a bordo de um Breda, escreveu, com ácido e gás sulfúrico, a palavra "Brasil" no céu carioca.
O "arrojado feito", como descreve o jornal Correio do Povo da época, rendeu, inclusive o reconhecimento do presidente Getúlio Vargas, que acompanhou a apresentação.
O trágico acidente de 1937 e a morte aos 29 anos
Hugo Cantergiani morreu aos 29 anos, em um acidente aéreo registrado no dia 6 de fevereiro de 1937, no Rio de Janeiro. A queda do avião ocorreu durante um voo de instrução. O acidente resultou na morte dele e do aluno César Vasconcelos.
Os registros mais pessoais sobre Cantergiani são imprecisos. Alguns jornais detalham que ele era casado e que deixou dois filhos. Já a biografia escrita por Mondin descreve que o piloto teve três filhos com a esposa Laura — Hugo, Sadi e Elda — e que todos faleceram cedo, entre a infância e a juventude.
Nome do aeroporto
O aeroporto de Caxias do Sul foi batizado com o nome de Hugo Cantergiani a partir da proposta do vereador Enrico Emilio Mondin, em 1964. O projeto de lei foi aprovado por unanimidade na sessão do dia 23 de junho. Na própria descrição, junto ao acervo da Câmara de Vereadores, Mondin detalha que levou cerca de 10 anos coletando dados para escrever a biografia do piloto (livro Um risco no céu - Odisséia de um aviador).
Embora não tenha conhecido o tio e pouco saiba da família que ele formou no Rio de Janeiro, o comerciante aposentado Hugo Roberto Cantergiani conta ser homônimo do aeroporto rende brincadeiras por onde passa:
— Sempre me perguntam "como que o aeroporto tem teu nome?" e eu respondo que o aeroporto é meu e que doei para o Estado — brinca ele, que também recebeu o brevê e, por algum tempo, se dedicou à aviação caxiense.