Passados mais de dois meses em que a chuva causou grande destruição na BR-470, principal conexão entre Veranópolis e o restante dos municípios da Serra gaúcha, os sinais de recuperação econômica na cidade começam a surgir.
A partir da abertura parcial da rodovia, em 2 de julho, as indústrias veranenses retomaram parte do envio de produtos. Mesmo com as condições limitadas de trafegabilidade (apenas caminhões de 16 toneladas podem circular no local), a liberação da BR-470, que ocorre sempre no início da manhã e no final da tarde, foi um avanço essencial.
Isso porque, sem essa rodovia, a distância entre Veranópolis e cidades da região, como Bento Gonçalves, Farroupilha e Caxias do Sul, saltou de 70 quilômetros para mais de 300 quilômetros.
O período em que foi impossível trafegar pela BR-470, entre maio e junho, é apontado por empresas e entidades comerciais da cidade como o mais crítico. A falta de insumos para manter a produção e os estoques com grande volume de produtos, foram reflexos diretos dos problemas logísticos causados pelos estragos que a chuva deixou na rodovia.
— Houve uma grande negociação entre os fornecedores e empresas para que o prejuízo fosse minimizado. Os fornecedores buscaram reduzir o valor dos fretes e as empresas se comprometeram em trabalhar em conjunto. Mas, com certeza, os gastos com o transporte, tanto para trazer insumos para a cidade, quanto para mandar produtos para outros municípios, aumentaram expressivamente nessa fase — avalia o presidente da Associação Comercial e Industrial de Veranópolis (Aciv), Neivaldo Carvalho.
Aumentar a frota, mesmo que temporariamente, foi a alternativa adotada pelas empresas para manter a produção em ritmo próximo à normalidade e garantir as entregas aos clientes.
Um exemplo vem da empresa Oleoplan, produtora de biodiesel e beneficiadora de farelo de soja, que mantém essa estratégia há dois meses. Conforme o diretor de Relações Institucionais e Sustentabilidade da empresa, Leonardo Zilio, a contratação de transporte foi o que possibilitou cumprir todos os compromissos com os clientes.
— O que não foi possível atender com a frota própria, recorremos à frota terceirizada. O farelo de soja enviamos para toda a Serra gaúcha, para a produção de suínos, aves, pecuária leiteira. Já o biodiesel vai para Canoas, Passo Fundo, Lajeado, Ijuí, basicamente para todo o mercado de combustíveis do Rio Grande do Sul. De maio até agora, nenhum cliente da empresa ficou desabastecido — comemora Zilio.
Aquecimento do comércio local
O fechamento da BR-470 também mudou o comportamento do consumidor veranense. Sem acesso a cidades da região ou às entregas de compras online, os moradores recorreram ao comércio local. Para impulsionar as vendas, a Aciv promoveu ações de fomento ao consumo local. A campanha "Sou daqui, invisto aqui" envolveu lojas de vestuário, livrarias, bazar, óticas e restaurantes, com descontos e condições de pagamento facilitadas.
— Esse tipo de ação movimenta a economia municipal, o que é fundamental para a cidade, principalmente porque não temos uma definição de quando a situação das rodovias estará resolvida — aponta o presidente da Aciv, Neivaldo Carvalho.
A comerciante Elisabete Turani, proprietária da Effeito Moda e Café, notou no cotidiano a transformação no hábito dos consumidores. Além de loja de roupas, o espaço na área central de Veranópolis conta com um café.
Na segmento do vestuário, os clientes se concentram em atrair os moradores da cidade. Já o café atende a turistas que passam pela cidade a caminho de Bento Gonçalves. Sem o acesso pela BR-470, o estabelecimento registrou queda de 30% no faturamento na cafeteria. Por outro lado, a loja teve um acréscimo de 20% nas vendas.
— As pessoas acabaram valorizando mais o comércio local, isso foi um ponto positivo para nós. Mas não podemos esquecer que o turismo ainda sofre com a falta de acessos — pondera a empresária Elisabete Turani.
Incertezas no turismo
A preocupação com o segmento turístico é compartilhada por Antônio Brandalise, sócio-proprietário do Restaurante Giratório e Restaurante Dona Cândida, localizados na BR-470, porém, em pontos diferentes. Os tradicionais espaços gastronômicos dependem quase que exclusivamente do fluxo da rodovia para as atividades. Nos últimos meses mantê-los abertos foi um verdadeiro desafio.
— O Giratório teve uma queda de 95% na ocupação e o Dona Cândida, 70%. Hoje, conseguimos recuperar 50% dos clientes do Giratório e 30% da ocupação do Dona Cândida. A situação é complicada porque o Giratório atende o turista. Já o Dona Cândida recebe muitos representantes comerciais, pessoas em viagem que passam por Veranópolis. Neste momento, estamos com pouco fluxo desse perfil de cliente — pondera.
A solução foi apelar para o público local. Conforme Brandalise, os restaurantes estão fortalecendo a publicidade nas rádios locais e realizando ações promocionais para atrair moradores de Veranópolis e região para consumir nos locais. A expectativa do proprietário é encerrar o ano sem prejuízo, mas também com uma margem de lucro próxima ao zero.
— Nos momentos mais críticos, cogitamos fechar os restaurantes. Mas quando a gente para pra pensar, a qualidade de vida que se tem aqui é incomparável. Seguimos na esperança de um dia poder recompor a Serra e fazer o turista voltar para Veranópolis — torce o empresário Antônio Brandalise.
Perspectivas para o segundo semestre
De acordo com a prefeitura de Veranópolis, o período chuvoso e os danos na BR-470 geraram em uma perda de R$ 5 milhões na arrecadação municipal. Entre as receitas com maior queda estão o ICMS, com menos R$ 1,6 milhão, ITBI, com menos R$ 360 mil, e R$ ISS, com menos R$ 227 mil. Além disso, o município precisou mudar o calendário de vencimentos dos tributos. O impacto desses pagamentos postergados deve ser sentido por mais um mês, pelo menos.
— Claro que o impacto foi mitigado com transferências governamentais de auxílio, porém, esses valores não irão constituir a normalidade da arrecadação nos próximos meses — prevê o secretário municipal de Governo, Eliezer Dalla Costa.
No entanto, a projeção para o segundo semestre aponta um cenário de recuperação. Isso porque uma nova empresa acaba de iniciar as operações no município. Instalado na BR-470, no bairro Valverde, o tradicional espaço industrial, que já sediou a São Paulo Alpargatas, agora é uma unidade da Rosalen Tintas. A empresa com sede em Nova Bassano, a 35 quilômetros de Veranópolis, também conta com plantas em Santa Catarina, Paraná, São Paulo.
As operações na unidade de Veranópolis já se iniciaram, e, segundo prefeitura, cerca de 10 colaboradores estão empregados. Mesmo que em fase inicial, as contratações se somam aos saldos positivos de geração de vagas de empregos no município.
Dados do Sine municipal indicam que, entre maio e junho, meses mais críticos do período chuvoso, a cidade teve 141 admissões e 96 demissões, refletindo a capacidade de resiliência do segmento industrial veranense.