Não foi difícil encontrar, no Parque de Rodeios Nicanor Kramer da Luz, em Vacaria, o fenômeno do laço comprido que até a sexta feira (8) já havia ganhado um automóvel Fox zero quilômetro na 35ª edição do Rodeio Internacional. “Segue à direita pelo acampamento, onde tiver dois caminhões pequenos e uns 20 guris na volta ele vai estar lá”, recomendou um tradicionalista.
Com 22 anos de idade, Pompilio Ramos, natural de São Matheus do Sul (PR), faturou no ano passado mais de R$ 450 mil em premiações. É campeão por onde passa e tem em sua conta do Instagram 101 mil seguidores. Entre eles, as crianças que o reconhecem e o cumprimentam em meio aos cavalos.
Considerado a melhor mira do Brasil, em referência à pontaria precisa com que laça o gado nas provas, Ramos é um dos cerca de 50 laçadores espalhados pelo país que fizeram do Laço Comprido uma profissão e que rodam o Brasil em busca das premiações distribuídas por rodeios como o de Vacaria.
Mas, para isso, é preciso bancar as inscrições, que podem chegar a até R$ 3 mil. O valor que garante a participação nas provas, aliás, é a maior fatia dos R$ 2 bilhões que os rodeios fizeram girar em 2023 no Rio Grande do Sul. Juntos, os participantes desembolsaram no ano passado, R$ 980 milhões em 3.264 eventos. Os dados são de um estudo da Universidade Feevale, em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico do RS (Sedec-RS).
Privilégio concedido aos melhores, Ramos conta há mais de dois anos, com o patrocínio do fazendeiro matogrossense João Xingu, banca os altos custos das viagens, acampamentos e inscrições:
— Hoje, minha profissão é o tiro de laço. Minha família sempre laçou e desde que nasci acompanho eles. Fui ganhando as premiações e foi aumentando a vontade de vencer. Viajo o Brasil inteiro sempre em busca do dinheiro, depois de Vacaria vou para Guarapuava (PR) —contou Ramos.
Inscrições garantem o custo e premiação do rodeio
Em Vacaria, são cerca de 2,5 mil vacas a serem laçadas por 800 duplas durante os 15 dias de rodeio. Só o aluguel dos animais, segundo a organização, representa um custo de quase R$ 650 mil, o que também justifica o preço da inscrição.
— Tentamos manter um padrão que é tradicional em Vacaria, de ter um bom gado nas competições. O grande campeão vai ganhar uma caminhonete Amarok zero quilômetro e, somados os prêmios de todas as modalidades, a premiação ultrapassa R$ 1 milhão. Antigamente era uma brincadeira, um hobbie de final de semana, hoje se tornou uma profissão. Para muitos, as premiações representam uma renda extra no mês, mas para outros, patrocinados por empresários e pecuaristas, é a renda fixa — explicou o patrão da Campeira, Jeferson Araldi de Camargo.
Para além dos prêmios em dinheiro, o título de ser o campeão do rodeio dá notoriedade aos peões, que passam a ter nome e sobrenome conhecidos entre os tradicionalistas. Acampados junto dos demais, são visitados por fãs e têm suas façanhas divulgadas em mídias segmentadas, como a página do catarinense João Borges de Moraes. A “Falando de Laço” no Instagram acumula 120 mil seguidores e reconhece as estrelas do rodeio pelas entidades que representam e cidades de onde vêm.
— Cada vez tem mais jovens que se dedicam para isso, por conta das premiações. Se for bom laçador certamente terá incentivo, sempre tem alguém interessado em mostrar seu CTG ou Centro do Treinamento. Tem rodeio todo final de semana, é só escolher — explicou Moraes.
O também laçador se divide entre as provas e as publicações. A segunda função, no entanto, tornou-se profissão, que o deixou ainda mais próximo dos rodeios e de seus protagonistas. Experiência que faz Moraes colocar os participantes em prateleiras diferentes, conforme o perfil de cada um:
— Tem o bom laçador, mas que não vive de rodeio em rodeio, esse paga sua própria inscrição e escolhe aonde ir. E tem o grupo que se prepara e treina, que são em torno de uns 50 em todo o Brasil. Rodeios que premiam a partir de R$ 100 mil no total são considerados grandes. Vacaria é a Copa do Mundo deles, o melhor daqui sairá com até R$ 100 mil porque vai ganhar em mais de uma modalidade — disse.
O bicampeão que trocaria o prêmio pelo reconhecimento
Poucos são os peões que conquistam a façanha de ser duas vezes campeão do Rodeio de Vacaria. Entre eles, o catarinense Daniel Cunha, 39, campeão da Dupla Oficial pela primeira vez aos 19 anos, em 2004. O bicampeonato veio 10 anos depois, o que aumenta a superstição do empresário em conquistar um inédito tricampeonato em 2024:
— Não tem um tri campeão da Vacaria. Ganhei um Celta em 2004 e duas Saveiro Cross em 2014. É um rodeio de custo mais elevado, mas a premiação compensa. Venho pelo título, trocaria facilmente o prêmio pelo título que se carrega pelo resto da vida.
Diferente dos profissionais, mais novos, Cunha laça por hobbie. Administra uma distribuidora de descartáveis em São José (PR), paga a própria inscrição e vê o esporte ficar cada ano mais valorizado.
— Já treinei muito quando era mais novo. Até os 20 anos era rodeio todo final de semana num nível profissional. É um bom mercado, a cada ano que passa tem prêmios melhores, conheço muitos que vivem do mundo dos rodeios. Quem se dedicar, consegue levar como profissão — disse.
Gineteada
A gineteada, esporte homenageado por uma estátua na BR-116, em Vacaria, também motiva bons prêmios para quem conseguir se manter por até oito segundos em cima do cavalo. Nos últimos 10 anos, a modalidade garantiu a Leonardo Marques, 32, uma premiação de R$ 300 mil em dinheiro. Além disso, ganhou 15 motos e dois automóveis zero quilômetros:
— Fui por muito tempo patrocinado pela Tropilha da Grota, que é dona dos cavalos que pulam nos rodeios. Montei 10 anos da minha vida indo em rodeios todos os finais de semana. Hoje já não é prioridade, mas quando se é novo e se tem sonho de ser o campeão, a vida é na estrada — contou.
De acordo com o organizador da Gineteada, Rafael Goulart, 30, o Rodeio Internacional de Vacaria é o único da América Latina que premia o campeão com um carro avaliado em R$ 80 mil. Ao todo, a gineteada paga R$ 130 mil em premiações.
— A doma do cavalo passa pela etapa da gineteada. Temos competidores do Uruguai, Argentina e de todo o Sul do país. O nível é alto, ginetes que se preparam em academias para a monta.
Os campeões do Rodeio de Vacaria serão conhecidos ao longo deste final de semana. Os ingressos que dão acesso ao Parque Nicanor Kramer da Luz custam R$ 30.