Charles Rodrigo Rossler, 46 anos, Maria Sueli de Oliveira, 56, e Marta de Andrade Costa de Souza, 46, não se conhecem, mas enfrentam a mesma doença. Os três moradores da Serra foram diagnosticados, nos últimos três anos, com diferentes tipos de câncer.
Suas histórias mostram o tamanho da importância da prevenção, do diagnóstico e do tratamento, atitudes que serão lembradas em escala global neste domingo, 4 de fevereiro, data que marca o Dia Mundial do Câncer. A campanha é promovida pela União Internacional para o Controle do Câncer (UICC), com o apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS) para promover ações coletivas.
Rossler é atendido pela equipe do Instituto do Câncer do Hospital Pompéia (Incan). Morador de Farroupilha, ele está internado na instituição para tratamento de um linfoma de Hodgkin. Em julho de 2021, foi diagnosticado com câncer nos testículos e depois de extrair o órgão, descobriu a doença na medula óssea.
— Passei 40 dias em casa e nesse período comecei a sentir uma dor intensa no braço esquerdo. A dor era tão forte que eu achei que ia infartar. Depois de uma tomografia, veio o diagnóstico de câncer de medula. Eu entrei aqui em estado grave e com certeza teria morrido se não tivesse o atendimento que encontrei aqui no hospital. Eu peço de coração aos empresários e à comunidade que ajudem esses hospitais, porque nós dependemos desse serviço para viver — apela.
Casado e pai de uma filha, atualmente ele passa 21 dias em casa e restante do mês internado no Hospital Pompéia. Antes da doença, ele trabalhava como ajudante de caminhoneiro. A esperança agora é um transplante de medula. Em 16 de fevereiro, a irmã dele fará um exame para saber se os dois são compatíveis. Caso ela não seja, Rossler entrará para a lista de espera do Estado.
"Eu escapei da morte"
Mãe de três filhos, Maria Sueli foi diagnosticada com leucemia mieloide crônica em março de 2021. Esse é o tipo de leucemia mais comum em adultos, sendo que o desenvolvimento é lento, e causa nenhum ou poucos sintomas no começo da doença. Moradora de Ana Rech, em Caxias do Sul, ela ia ao posto de saúde do bairro para acompanhar pressão alta e diabetes, entre outras. Depois de uma das médicas solicitar um exame de sangue, ela descobriu a leucemia. Três meses depois do diagnóstico, a enfermidade já estava no segundo estágio.
— Tomo cerca de 16 remédios por dia e faço a quimioterapia à noite, mas estou viva e sou muito grata a Deus por isso. Os médicos lutaram para controlar a doença e me ajudaram a lutar pela minha vida. Eu escapei da morte e hoje eu faço tudo o que posso para ficar um pouco mais por aqui. Eu vou casar com o meu companheiro, com quem estou há 40 anos, no mês que vem, e quero seguir um bom tempo ao lado dos meus filhos e netos.
"Me sinto 100%, e é meu recomeço"
Moradora do bairro Sagrada Família, em Caxias, Marta de Andrade Costa de Souza, 46, sentia uma dor intensa nas costas. Viúva, e mãe de um adolescente de 16 anos, ela buscava ajuda no posto de saúde do bairro. Na manhã de sexta-feira (2), ela estava na Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon), no Hospital Geral, para seguir o tratamento. Ela lembra que um dos momentos mais difíceis foi quando precisou cortar o cabelo, que hoje já cresceu um pouco.
— Depois que fui diagnosticada em dezembro de 2022, passei 17 dias internada. Eu tinha um cabelão cacheado. Chorei muito de perder meu cabelo. No momento em que a equipe me disse para cortar porque ele iria cair todo, caiu a ficha de que eu tinha câncer. Foi bem marcante. Eu fiquei seis meses sem conseguir sair da cama e cheguei a pesar 43 quilos, mas hoje eu venho fazer o tratamento sozinha. Sinto bem pouca dor, me sinto 100%, e é um recomeço.
Marta esta à espera de um autotransplante de medula óssea, previsto para entre o final de março e começo de abril em Porto Alegre. O procedimento é realizado para promover o restabelecimento fisiológico após intensas doses de quimioterapia. Esse procedimento é indicado para o tratamento de linfoma não Hodgkin. Leia mais sobre o que é esse tratamento neste link.
Tipos de câncer em Caxias
Em Caxias do Sul, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), nove tipos de câncer provocaram mais mortes em 2023:
- Traqueia, brônquios e pulmões: 122 mortes (total)
- Cólon, reto e ânus: 98 (total)
- Mama: 55
- Próstata: 50
- Pâncreas: 44
A oncologista Veronica Denardin da Rosa ressalta que a tendência é de aumento da incidência da doença, o que tem sido visto no mundo todo:
—A gente tem feito diagnósticos mais precoces, tratamentos com novas medicações, que aumentam a sobrevida dos pacientes mas, infelizmente, isso ainda não repercute em menos mortalidade porque tem muito mais casos. Por isso que batalhamos por mais ações como essa de prevenção e rastreamento para ter um diagnóstico precoce — ressalta a oncologista.
Leucemia volta a ganhar atenção
Recentemente, chamou a atenção do país o caso de Fabiana Justus, filha do empresário Roberto Justus, que revelou ter recebido o diagnóstico de leucemia. A influenciadora vem divulgando nas redes sociais como tem sido o tratamento. A doença é um dos 10 tipos de câncer mais comuns no Brasil. Ocorre na formação das células sanguíneas e compromete a capacidade do organismo de combater infecções.
Conforme dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), o número estimado de casos novos de leucemia para o Brasil, para cada ano do triênio de 2023 a 2025, é de 11.540 casos. A doença atinge adultos e crianças, e divide-se em aguda e crônica.
A hematologista Mariângela Moschen explica as diferenças. Segundo ela, a leucemia aguda é 0 colapso total da medula óssea, em que existe uma proliferação muito rápida de células imaturas que fazem com que todo o sistema de sangue, glóbulos brancos vermelhos e plaquetas entre em falência:
— Quando a pessoa recebe um diagnóstico de leucemia, ela sempre vai pensar na leucemia aguda, vai achar que tem uma doença que vai matá-la. A leucemia aguda é uma doença muito agressiva de crescimento muito rápido e que faz com que a pessoa tenha risco iminente de vida se não iniciar tratamento, mas há chances — explica a médica.
Já a leucemia crônica é diferente, pois é mais lenta e existe a preservação da função celular que tem algum defeito. Nesse caso, o paciente convive com a enfermidade e tem condição de trabalho normal, sendo o tratamento por via oral:
— São doenças bem mais tranquilas, em que dá para administrar como se administra uma hipertensão, um diabete.
Uma das dificuldades em relação ao diagnóstico é que as leucemias não têm sinais muito específicos. No entanto, o hematologista Roque Domingos Lorandi orienta que ficar atento a hematomas e ínguas pode ajudar no reconhecimento.
— Ficar com hematomas pode ser um sinal de que pode ter algo errado com o sangue. As ínguas também merecem atenção. Mesmo que não sejam tão específicas de leucemia, podem ser um sinal. Os sintomas iniciais, eles são muito inespecíficos, mas nesses dois casos é importante prestar atenção. Então, a pessoa que começa a ter hematomas, que começa a ter sangramentos tem que procurar um hematologista para fazer um exame — ressalta Lorandi.
Já Mariângela aborda a importância do hemograma e da contagem de plaquetas:
— Custa menos de R$ 20 e é muito muito importante no diagnóstico de leucemia. Então quando a gente faz um check-up precisa ter um hemograma. As alterações do hemograma são muito preditivas de uma doença hematológica. A gente considera que a chance de ter uma leucemia com hemograma normal é menos de 2%.
Tratamento
A hematologista Mariângela ressalta que atualmente há novas tecnologias e o diagnóstico é feito por estudo moleculares. Em casos de leucemia e doenças hematológicas, não existe metástase porque o sangue circula pelo corpo inteiro e, portanto, ele acaba necessitando um tratamento para o corpo inteiro.
— A leucemia sempre vai ser tratada com quimioterapia, e é uma quimioterapia muito intensa e por isso que tem os riscos do tratamento, mas a gente também tem notícias boas. Tem doenças que são curáveis. Na leucemia aguda em criança, por exemplo, a chance é muito alta, em torno de 70%. No adulto, em torno de 60% a 70%. Tudo isso vai variar do tipo de leucemia.
Algumas leucemias agudas precisam, ainda como tratamento, do transplante de medula:
— A gente tem o tratamento através de como uma consolidação do tratamento, transplante de medula, e agora mais recentemente já tem a terapia chamada CAR-T cells, que é a utilização dos linfócitos T como um agente de tratamento. No caso de transplante de medula em leucemia aguda, é feito o transplante chamado halogênico, que é de outra pessoa, porque a gente troca a medula óssea, do paciente, no caso, a fábrica do sangue — acrescenta a especialista
Atitudes preventivas ao câncer
- Adotar uma alimentação saudável
- Manter o peso corporal adequado
- Praticar atividades físicas
- Amamentar
- Realizar exame preventivo de câncer do colo do útero a cada três anos, para mulheres com idade entre 25 e 64 anos
- Vacinar as meninas de 9 a 14 anos e os meninos de 11 a 14 anos contra o HPV
- Vacinar-se contra a hepatite B
- Evitar bebidas alcoólicas
- Evitar carnes processadas
- Evitar a exposição ao sol entre 10h e 16h
- Evitar a exposição a agentes cancerígenos no ambiente de trabalho
Fonte: Instituto Nacional do Câncer - Inca