Os moradores das ruas Feijó Junior e Leonel Mosele, no bairro São Pelegrino, têm convivido com a insegurança no complexo da antiga Cooperativa Vinícola Nova Aliança, em Caxias do Sul. Eles percebem diariamente a degradação dos prédios, sendo que vândalos entram no espaço para furtar alumínio, metal e outros materiais que podem ser comercializados.
Com o impacto do tempo, os vidros foram quebrados e a sujeira se acumula pelos cantos do terreno, que tem quase um hectare (essa medida corresponde a 10.000 m²). Além disso, quem passa na calçada corre o risco de ser atingido por telhas, já que é possível observar diversos pedaços espalhados pela calçada da Feijó. Um morador de uma rua lateral, que prefere não se identificar, conta que a insegurança é constante, especialmente, devido aos furtos.
Na última segunda-feira (8), a Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) recebeu um representante da cooperativa que foi retirar uma comunicação sobre a perda de prazo da autorização de demolição. Agora, a empresa deve colocar tapumes em volta do prédio e, após, receberá uma nova autorização para demolir parte do complexo.
Lembranças
O morador vive nas proximidade da antiga cooperativa desde 1954. Além de vizinho, ele trabalhou mais de 30 anos no setor de produção do complexo. Ao longo dos anos, ele acompanha da janela de casa os vândalos destruindo aquilo que já lhe pagou o sustento da família e ainda traz boas lembranças.
O avô dele foi um dos fundadores da cooperativa Aliança, em Caxias, que depois se uniu a outras quatro, formando a Cooperativa Nova Aliança. O pai também foi um dos associados ao longo dos anos. Assim como o município, a Cooperativa foi crescendo e erguendo a estrutura física. Enquanto folheava o livro de 25 anos de fundação da vinícola, o antigo funcionário relembrava de pontos importantes da história:
— Ela começou em 1931, quando Caxias devia ter mais ou menos 15 mil habitantes. Em 1954, quando a Festa da Uva foi feita ali onde hoje é a prefeitura, a vinícola já participava. Quando completou 25 anos, em 1956, eles lançaram esse livro com o nome dos fundadores e de todos os associados. Era uma cooperativa pequena e deu muito certo na época.
Na época em que trabalhava, o homem relembra que havia cerca de 15 funcionários e o quadro era ampliado quando se aproximava o período da safra. Inicialmente, segundo ele, cerca de 100 associados, a maioria produtores de Caxias, integravam a cooperativa. Ele acompanhou nessa fase a construção dos pavilhões. O ex-funcionário lembra também que a produção aumentava gradativamente. O homem, que hoje trabalha na garagem de casa, se aposentou na cooperativa em 1994.
Nos últimos 60 dias, o morador percebeu que a vandalização do prédio aumentou. Ele acorda durante a noite ouvindo barulhos de objetos caindo e, ao olhar em direção aos prédios, vê que o telhado e parte da estrutura estão sendo furtados, que há pessoas circulando e consumindo entorpecentes. Uma empresa de segurança é responsável pelo prédio e, quando acionada, vem até o local. Contudo, segundo o morador, poucas vezes foi possível localizar os vândalos:
— Temos um sentimento de insegurança, têm os moradores de rua que estão sempre na volta pedindo roupa e dinheiro. É bem ruim, a gente não sabe o que vai acontecer com os prédios ali, a gente não sabe o que aconteceu de eles terem ido embora e nem porque não fazem a demolição disso — questiona o morador.
Na visão dele, o ideal é que a empresa Nova Aliança faça a limpeza do terreno e construa prédios mais modernos, algo que possa valorizar a região, já que é um ponto quase central da cidade.
Revitalização da região
A primeira cooperativa que integrou o grupo nasceu em 1929, em Caxias, e foi chamada de São Victor. No ano seguinte surgiu a São Pedro, em Flores da Cunha, depois as cooperativas Aliança, em Caxias do Sul, Linha Jacinto, em Farroupilha, e Santo Antônio, em Flores da Cunha. Em 2010, elas se uniram e formaram a Cooperativa Nova Aliança. Em 2014, a sede foi concentrada em Flores da Cunha, em uma nova estrutura com 24 mil metros quadrados.
De acordo com o superintendente da cooperativa, Heleno Fachin, a mudança se deu devido à queda nas vendas em Caxias, pela falta de segurança no bairro onde estava localizada e pelas facilidades oferecidas pela prefeitura de Flores da Cunha. Atualmente, 700 famílias da Agricultura Familiar são associadas e estão espalhadas pela Serra. Ao longo dos anos, a estrutura em Caxias foi parando aos poucos e restou apenas a venda no varejo.
Em abril do ano passado, apenas as vendas online seguiram e o espaço era utilizado como um depósito desses produtos. Em setembro, toda a comercialização foi direcionada para Flores da Cunha, encerrando efetivamente as atividades em Caxias. Após o fechamento, o prédio da loja foi cedido à Fundação Caxias para guardar mantimentos durante as enchentes.
Alexandre de Oliveira, diretor de operações, conta que foi instalado um poste para manter a energia no depósito, mas em poucas horas os cabos foram furtados. Além disso, o gerador sofreu com vandalismo e furtos e também ocorreu um aumento na depredação dos demais espaços atrás da loja.
— Nós não imaginávamos que ia chegar nesta situação. A sede de Caxias não está abandonada. Os crimes contra o patrimônio são inúmeros e numa proporção que não conseguimos controlar pelo tamanho do complexo. Soldamos os portões cinco vezes, mas toda vez tivemos os portões quebrados — lamenta Fachin.
Contraponto
Os integrantes da cooperativa relataram que desde o fechamento das atividades solicitaram autorização para a demolição da estrutura dos pavilhões, antes utilizados para a produção. Contudo, essas autorizações duram apenas seis meses, período que, na visão deles, é curto para todo o trabalho necessário.
O diretor de operações Alexandre de Oliveira justifica que uma empresa foi contratada para fazer a demolição por partes, pois nenhuma conseguiu orçar a derrubada total da estrutura. As condições financeiras da cooperativa e as condições climáticas dos últimos meses de 2023 desfavoráveis também foram citados como fatores para a demora na conclusão da demolição. Ele nega que a cooperativa tenha perdido o prazo de autorização da demolição.
Contudo, ele relata que na última segunda-feira (8), após o contato do Pioneiro com a Secretaria Municipal de Urbanismo, a cooperativa foi chamada pela prefeitura e informada da necessidade de colocação de tapumes antes da nova liberação de demolição. A partir disso, a Nova Aliança providencia o pedido. No entanto, na visão dele, isso não irá barrar a entrada de vândalos.
— Os tapumes não vão trazer maior segurança aos moradores, aos trabalhadores terceirizados e a nós, que constantemente estamos lá. Você acha que tapumes vão segurar as pessoas que querem entrar para furtar algo ou usar entorpecentes? Eu acho que não — afirma Oliveira.
Fachin reforça que a Cooperativa precisa estar unida com o poder público, com os moradores e com a polícia para dar um destino à sede em Caxias. A demolição e a destinação daqueles resíduos, a revitalização das três casas históricas, a segurança do espaço e a projeção de um novo espaço no restante do terreno precisam de apoio financeiro.
Na visão dos cooperados, é preciso que haja uma revitalização no bairro. Atualmente, segundo Fachin, a estrutura está disponível para venda, aluguel ou demais projetos que proporcionem uma utilidade à antiga sede.