Desde que o empresário baiano Pedro Oliveira de Santana foi preso em Bento Gonçalves — e solto 10 horas depois —, por manter 207 safristas da uva em condições "análogas à escravidão", três advogados atuaram na defesa dele. Todos batem na mesma tecla: o que foi flagrado na pensão é um episódio isolado, do qual ele tem pouca ou nenhuma responsabilidade e será explicado ao longo do inquérito policial. Mas não são isoladas as queixas de empregados quanto às condições de trabalho propiciadas pelas empresas de Santana.
Entre 2012 e 2019, o Ministério do Trabalho autuou 20 vezes a empresa Oliveira e Santana Prestador de Serviços Ltda., por problemas logísticos e atrasos salariais. Essa empresa ainda está ativa, e as multas se referem a serviços de carregamento de frangos vivos.
Conforme o chefe da representação do Ministério do Trabalho na Serra, Vânius Corte, esse não é um número normal de autuações, é acima da média. Empresas desse setor, em geral, não apresentam essa quantidade de problemas.
A reportagem teve acesso às autuações do Ministério do Trabalho. Muitas delas são de cunho formal, como falta de registro de transporte de empregados ou do próprio empregado (em livro, ficha ou sistema eletrônico), mas outras são mais graves. As mais comuns envolvem atrasos salariais e falta de condições de alojamento para os trabalhadores.
Entre elas: falta de roupas de cama, ausência de armários individuais para guarda de objetos pessoais, manter os empregados em condições inadequadas de asseio e higiene, deixar de fornecer marmitas e recipientes para conservação dos alimentos, não providenciar em condições de prevenção e proteção em saúde para as atividades laborais e itens prosaicos, como portas de banheiros que não trancam.
Nesse campo das irregularidades trabalhistas, constam: falta de depósito de FTGS, não recolhimento de contribuições sociais, não pagamento de rescisões contratuais, falta de recibo de salário, não pagamento de férias, falta de atestados de saúde (quando necessários), falta de exame médico admissional, ausência de registro mecânico de entrada e saída do serviço (cartão-ponto ou similar), deixar de conceder 11 horas de descanso entre uma jornada e outra de trabalho, deixar de conceder intervalo de descanso.
Com relação à Fênix, uma das empresas administradas por Pedro Santana e que foi flagrada semana passada por trabalho em condições análogas à escravidão, a única autuação do Ministério do Trabalho foi nesse caso específico dos 207 safristas da uva.
CONTRAPONTO
O que diz Pedro Oliveira de Santana:
A reportagem tenta entrevista com Santana. Em nome dele, o escritório de advocacia Giacomini Advogados, considera que "a imagem de um homem foi denegrida por acusações infundadas" e enviou nota com pontos da defesa do baiano:
Sobre trabalho escravo: todos safristas tinham contrato de trabalho e todos os seus direitos previstos na legislação.
Sobre jornadas exaustivas de trabalho: a legislação era seguida à risca. Em caso de horas-extras, recebiam pelas mesmas.
Sobre condições degradantes: todos usavam equipamentos obrigatórios. Atuavam como os demais trabalhadores da uva.
Sobre restrição à locomoção dos trabalhadores: não havia restrição à locomoção deles, nem retenção no local de trabalho.
Sobre retenção de documentos dos trabalhadores por parte do patrão: havia trabalhadores que perdiam seus documentos. Em alguns casos, foi feita retenção temporária das carteiras de trabalho, para assinar as mesmas e para atualização contábil dos contratos.
Sobre vigilância na pousada e brigas envolvendo os empregados: alguns safristas novos causaram tumulto na pousada onde estavam. Foram feitos vários boletins de ocorrência, sem envolvimento de Pedro Santana, tendo em vista que ele não tinha qualquer controle sobre os empregados em seus momentos de folga. O empregador não possui qualquer responsabilidade sobre os seus funcionários em momentos livres. A pousada também não pertence a Pedro.