Nesta quarta-feira (25) foi definida a conciliação entre os proprietários dos lotes 2 e 3 do Monte Carmelo, em Caxias do Sul, e os moradores. O acordo já era esperado pelas partes. O encontro durou cerca de uma hora e meia e foi realizado pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), no Salão do Júri, no Fórum.
Os mediadores judiciais Eduardo Sotoriva e Viviana Magrini conduziram a audiência de conciliação, que contou com a presença do advogado dos proprietários da área, Cláudio Fichtner, além do advogado Rodrigo Balen e da Defensoria Pública em nome dos moradores do loteamento. A prefeitura de Caxias não faz parte deste processo de conciliação, mas foi convidada a participar pelo interesse na compra dos lotes. O procurador-geral do município, Adriano Tacca, e o secretário municipal de Habitação, Giovani Fontana, acompanharam o ato. Cerca de 150 moradores estavam presentes.
O caso Monte Carmelo é dividido em duas partes. Um dos processos foi judicializado pelos donos da área ainda em 2004 para reintegração de posse. Para evitar o despejo dos atuais moradores da parte baixa do Loteamento Monte Carmelo, a prefeitura sinalizou o desejo de compra oficializado na audiência desta tarde.
— A prefeitura ingressou oficialmente no caso. Até então ela não tinha entrado. Agora, existe um documento nos autos de um processo em que a prefeitura declarou expressamente que vai desapropriar a área. Esse foi o grande ganho da audiência: a prefeitura assumir a inteira responsabilidade pela desapropriação da área — avaliou Balen.
Na audiência, foi redigido um Termo de Sessão, documento que será enviado para a homologação. Ao ser aprovado pelo juiz, se tornará um Título Executivo Judicial, com execução imediata dos termos ali descritos. Na prática, essa ação de compra pelo município extinguirá o segundo processo que tinha sido movido pelos atuais moradores e que pedia a inclusão da prefeitura no processo de reintegração. O argumento é que a prefeitura fez melhorias no loteamento, portanto, tem responsabilidade pela ocupação maciça da área.
Segundo o advogado que defende a maior parte das cerca de duas mil famílias que atualmente residem no Monte Carmelo, elas são pessoas que compraram os lotes e não os ocupantes originários, portanto, agiram de boa fé. Por isso, a luta pela regularização fundiária dos terrenos.
José Sena, mora há mais de nove anos no loteamento. Ele destacou que pagou, à época, R$35 mil pelo lote. Ao longo do tempo construiu a casa e se estabeleceu com a família. O receio de ser despejado da própria casa o assombrava, mas a esperança de tudo ser resolvido era maior.
Francisco Moreira, morador há 18 anos no Monte Carmelo, também fez o pagamento de um valor no início. Ele conta que na época estava desempregado e precisou arranjar R$ 2 mil, para a compra de um pequeno pedaço de terra onde construiu a própria casa. Moreira concorda com a ideia de ressarcir um valor para a prefeitura. Assim como André Fagundes, vice-presidente da Associação de Moradores, que passou pelo mesmo processo dos dois primeiros vizinhos, pagando um valor na compra de um pequeno espaço no loteamento.
Após conciliação, prefeitura fará o projeto de regularização fundiária
Segundo acordado, o município fará a compra dos lotes 2 e 3 pelo valor de R$ 5,5 milhões. Sendo R$ 4 milhões pagos com recursos do Fundo da Casa Popular (Funcap) e os R$ 1,5 milhão restantes quitados em índices construtivos aos atuais proprietários. De acordo com o secretário municipal de Habitação, Giovani Fontana, esse valor é oriundo de um estudo já realizado pela prefeitura, com o objetivo de saber a viabilidade da compra e o preço da área.
O advogado Claúdio Fichtner, representante das famílias proprietárias, está analisando a minuta do acordo. A expectativa é que na próxima semana, o contrato seja assinado.
Fontana ressalta que como a prefeitura terá custos na compra, a população moradora deverá ressarcir o valor aos cofres públicos. A forma de pagamento e a demarcação dos terrenos ainda estão indefinidos. Segundo ele, estes detalhes serão discutidos durante o processo de regularização fundiária.
O poder público teve o aval do Conselho Municipal de Habitação para dar andamento à compra. Agora, o projeto será encaminhado à Câmara para apreciação dos vereadores, no dia 1º de fevereiro, quando há o retorno do ano legislativo. Após, serão reunidos os moradores, o representante deles e demais envolvidos para a discussão dos trâmites da regularização fundiária.
Entenda o caso
:: Entre o final de 2003 e começo de 2004, cerca de cem famílias deram início à ocupação de uma área, batizada como Monte Carmelo.
:: Em 9 de fevereiro de 2004, os proprietários dos lotes 2 (com 39,3 mil metros quadrados) e 3 (com 39,7 mil metros quadrados) ingressaram com uma ação de reintegração de posse na Justiça. Processo que tramita até hoje.
:: Dois dias depois (11 de fevereiro de 2004), os donos de uma outra parte da área (o lote 7, com 139 mil metros quadrados) também pediram, judicialmente, a reintegração de posse. Em maio (2004), obtiveram liminar pela reintegração.
:: Em 7 de julho do mesmo ano (2004), o então prefeito, Pepe Vargas (PT), declarou o lote 7 "de utilidade pública, para fins de desapropriação", "visando o assentamento de famílias para fins de habitação de interesse social". Como garantia, a prefeitura efetuou um depósito de cerca de R$ 390,3 mil.
:: Segundo os moradores, após a publicação do decreto houve um verdadeiro inchaço da ocupação, chegando a mais de mil famílias.
:: Em 22 de fevereiro de 2005, o município, já sob a administração de José Ivo Sartori (então, PMDB) requereu na Justiça a suspensão da desapropriação. O parecer do Ministério Público, à época, aponta comportamento contraditório por parte da prefeitura: "De um lado diz que não tem mais interesse na desapropriação; por outro, executa atos próprios de quem está imitido na posse do bem que, segundo o decreto, seria destinado à regularização do loteamento". Fotografias anexadas ao processo mostrariam máquinas da prefeitura realizando obras de arruamento, inclusive, com derrubada de árvores, no mês de junho de 2005, após a manifestação da desistência.
:: De lá para cá, a prefeitura teve de pagar aos proprietários pela área desapropriada (lote 7) – o valor foi superior a R$ 1 milhão – mas nunca colocou em prática o loteamento com habitações populares e a regularização fundiária.
:: Em dezembro de 2019, em audiência de conciliação na Justiça, com intermediação do Ministério Público Estadual, foi apresentada proposta para que os pouco mais de 300 moradores dos lotes 2 e 3 formassem uma cooperativa e adquirissem essas áreas pelo valor de R$ 9,7 milhões. Ficou agendada nova audiência para o dia 19 de março.
:: Em 25 de março de 2022, o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) liberou recursos que irão auxiliar na regularização de dois loteamentos em Caxias – R$ 5.824.950,00 para o Monte Carmelo.
:: Em 11 de janeiro de 2023, poder público municipal recebeu a aprovação do Conselho de Municipal de Habitação, de forma unânime, para desapropriar os lotes 2 e 3 do complexo, que juntos somam em torno de oito hectares. Para isso, deve destinar R$ 5,5 milhões.
:: Acordo para desapropriação foi acertado em audiência de conciliação na tarde desta quarta-feira (25).
:: De acordo com o presidente da Amob Monte Carmelo, Adroaldo Silva, cerca de 2 mil famílias moram, atualmente, no local.