A mudança de gestão da RS-122 e do pedágio de Flores da Cunha, na virada de terça-feira (31) para quarta-feira (1º), não irá apenas mudar o valor das tarifas e iniciar a cobrança para motos. Quem vive no entorno das cancelas está prestes a perder a isenção de tarifa, benefício fundamental para o acesso a serviços no centro sem um custo adicional. A passagem livre é praticada pela Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), mas não está prevista no contrato entre o Estado e a Concessionária Caminhos da Serra Gaúcha (CSG).
Construída no fim da década de 1990 para a concessão da Convias e posicionada no km 100 da RS-122, a praça divide comunidades do interior e isola a localidade de Capela São Roque do centro de Flores da Cunha. São famílias que moram tão próximo das cancelas (cerca de 200 metros), que o desvio utilizado por outros moradores da cidade e da região não se torna vantajoso por aumentar tempo, custo e distância do trajeto.
— Eu teria que sair daqui e dar toda a volta. Não vale a pena, mas é o que vou ter que fazer. No fim do mês é uma bolada. Daqui ao centro dá cinco quilômetros pelo pedágio. Pelo desvio dá 12 a 13 quilômetros. Tenho uma filha que trabalha na cidade todos os dias e vai de carro. Com o novo valor dá R$ 17 por dia — afirma o agricultor Antônio Aparício Picoli, 77 anos.
Vizinha de Antônio, Inês Picoli, 65, não tem carro, mas se desloca pelo menos uma vez por semana ao centro com o irmão, que mora na casa ao lado.
— O erro grande foi terem se instalado ali da primeira vez. Se nós queremos fazer compras, temos que ir a Flores da Cunha, se queremos comer temos que ir a Flores da Cunha. Poderiam deixar isento pelo menos para quem mora do acesso ao desvio para cá — propõe Inês, acrescentando que não há supermercados na comunidade.
Mesmo quem mora do outro lado do pedágio e não precisa passar pelas cancelas para ir ao centro defende a manutenção da isenção. Nesse caso, existe a necessidade de cruzar o ponto de cobrança que fica em direção a Antônio Prado. É o caso, por exemplo, de Fernandes Veadrigo, que mantém um restaurante às margens da RS-122 com a família.
— Sempre tivemos a isenção. Não vejo o porquê de nos tirarem. O dia que o pedágio for para outro local até concordo que não há necessidade, mas hoje é bem necessário — destaca.
Já outro morador do lado de Flores da Cunha, que prefere não se identificar, nem chegou a se cadastrar. Além de morar, ele mantém uma empresa ao lado de casa e não costuma viajar para a região de Antônio Prado.
— Graças a Deus moramos para cá — afirma.
Expectativa de deslocamento do pedágio
O modelo da concessão que começa na próxima quarta-feira (1º) em seis rodovias da Serra e do Vale do Caí prevê o deslocamento do pedágio de Flores da Cunha. O objetivo principal é inutilizar o desvio pavimentado existente pelo interior, mas a mudança também é aguardada por quem vive no entorno da praça atual, já que vai reintegrar as comunidades. A proposta é mudar do km 100 para o km 103, já no início da descida da Serra das Antas.
Os moradores ainda têm dúvidas se a mudança vai se concretizar, mas aceitam pagar a tarifa no novo endereço. Como o prazo contratual prevê que os novos pedágios entrem em operação no fim do ano, a reivindicação é que a passagem livre se estenda somente por 2023.
— Gostaríamos que saísse daqui o quanto antes — afirma Antônio Picoli.
A mudança de local do pedágio também é uma esperança a quem mantém algum comércio às margens da rodovia. A existência da praça afasta muitos motoristas, que optam pelo desvio para economizar. Então, fica com o movimento muito abaixo do potencial nos trechos entre os acessos ao desvio e o pedágio.
— Tem gente que não sabia que tínhamos o estabelecimento há três anos. Mudar o pedágio vai melhorar — acredita Joel Anderson Costa, 45, proprietário de uma loja quase vizinha às cancelas.
Conversas entre prefeitura e Estado
O novo contrato de pedágio não prevê nenhum tipo de isenção a quem trafega pelas rodovias concedidas. O único benefício previsto é o desconto de usuário frequente, que pode chegar a 20% e pode ser aproveitado por quem utiliza o sistema de cobrança automática, com as chamadas tags.
O fato de não estar contemplado nos planos é um empecilho para tentar manter a passagem livre, mas há esforços nesse sentido. O prefeito de Flores da Cunha, César Ulian, chegou a se reunir com a CSG para buscar o benefício, mas não obteve sucesso. Por conta disso, a administração deve se reunir na próxima semana com representantes do governo do Estado para buscar uma alternativa. Ulian deve se manifestar somente após o encontro.
Conforme o diretor de Parcerias Público-Privadas da Secretaria Extraordinária de Parcerias, Rafael Ramos, a possível manutenção da isenção até a mudança de endereço está em avaliação. Contudo, ele não deu mais detalhes.
Flores da Cunha não é a única cidade que busca benefícios do tipo. O pedágio de Portão, no Vale do Caí, também será transferido para um ponto, distante quatro quilômetros, em São Sebastião do Caí. A prefeitura do município, porém, afirma que a praça dividirá duas comunidades e se mobiliza até mesmo para construir desvios. Em entrevista à Gaúcha Serra, em dezembro, o diretor técnico da Silva & Bertoli, uma das empresas proprietárias da CSG, afirmou que o Estado avalia algum tipo de benefício para os moradores da localidades. Questionada, a Secretaria de Parcerias não respondeu até a publicação desta reportagem.