A espera por um leito foi longa demais para duas pacientes da Serra. Uma delas morreu no Hospital São José, em Antônio Prado, na última terça-feira (13), enquanto aguardava transferência para um leito na unidade de terapia intensiva (UTI) em Caxias do Sul. Ela estava entubada e esperou por quatro dias. Outra paciente foi levada da Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) Zona Norte, para o Hospital Geral (HG), mas também não resistiu e morreu. As informações são do presidente do Conselho Municipal de Saúde (CMS) de Caxias do Sul, Alexandre de Almeida Silva.
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) afirma que as pacientes estavam cadastradas na Central de Regulação de Leitos e foram avaliadas conforme os critérios clínicos de cada uma e reguladas para hospitais. Ainda segundo a SMS, as circunstâncias dos óbitos serão analisadas pela comissão interna de investigação da instituição, que é responsável por revisar todos os procedimentos e condutas profissionais realizadas. A secretaria também se solidarizou com as famílias dos pacientes.
Somente nesta sexta-feira (16) são 61 pacientes na fila de espera, sendo que 37 estão em nas unidades de pronto-atendimento de Caxias e 24 em UPAs e hospitais de outros municípios.
— A situação é caótica. A falta de leitos não somente continua, como aumentou. E nessa última semana gira em torno 50 a 60 leitos faltantes por dia. Não é um grito da minoria —ressalta Silva.
Ele conta que na última quarta-feira (14), 25 pessoas aguardavam por leitos só na UPA Central. O presidente volta a citar Bento Gonçalves como um exemplo a ser seguido para acabar com a fila de espera em Caxias. Lá, está sendo construído um Centro Clínico de Imagem e Diagnóstico, com bloco cirúrgico.
— Muitos pacientes aguardam na UPA por exames clínicos mais complexos, que precisam ser feitos em hospitais. Eu acredito que desses 60, cerca de 35% estão à espera de exames. Eles ficam ali dentro do hospital de duas a quatro horas e são liberados. Como não há vagas, ficam por dias nas UPAs e em hospitais da região.
Falta de planejamento
O CMS recebe diariamente pedidos de ajuda de pessoas que vivem a angústia de ver integrantes da família à espera de vagas. Os relatos são de que a espera é longa e, muitas vezes, o quadro de saúde do paciente se agrava enquanto o familiar não tem o que fazer para confortar quem espera. Para o presidente é preciso planejamento estratégico a curto e longo prazos para solucionar o problema.
— Quando falamos que o sistema de saúde colapsou não é de hoje. Quando falamos da participação da administração atual nisso é porque o atual prefeito foi vereador da cidade e não tem como dizer que desconhece essa realidade. A secretária diz que está dentro do cenário histórico. Quero ver falar isso para quem perdeu familiares e para quem está esperando leitos há mais de dias com risco de morte —destaca Silva.
Ele afirma ainda que não se refere à vaga zero, que são pacientes com situação de saúde agravada. Essas pessoas são encaminhadas para os hospitais Geral e Pompéia, que são referências para os municípios da Serra. Ele cita como exemplo um paciente de Vacaria, que foi transferido para Caxias, com leito regulado pelo Samu, e precisa de uma cirurgia de urgência. Esse paciente judicializou hospital e, para cumprir a determinação, o Nossa Senhora da Oliveira teve que o encaminhar para o Pompéia.
Contrapontos
O Hospital São José, de Antônio Prado, confirma a morte da paciente. Segundo a instituição, ela já havia conseguido leito, mas morreu na terça-feira (13), antes de ser transferida para a UTI de um dos hospitais de Caxias do Sul.
A Secretaria Municipal da Saúde de Caxias, por sua vez, emitiu uma nota sobre o assunto. Confira abaixo:
"Caxias do Sul tem, historicamente, demanda reprimida por leitos de internação. Por esse motivo, o município garantiu, em abril de 2022, a permanência de 34 leitos que seriam fechados após a emergência de saúde por causa da covid-19. São 16 de UTI e 18 de enfermaria que estão em operação porque a Prefeitura faz o custeio, que é de R$ 900 mil ao mês. Neste momento não há capacidade instalada (espaço físico e equipes) nem previsão orçamentária para mais leitos.
Os hospitais de Caxias do Sul com atendimento SUS recebem pacientes de 49 municípios da Macrosserra, nos casos em que a instituição da cidade de origem da pessoa não têm estrutura para determinado atendimento.
Nesta sexta-feira (16) são 61 pacientes em lista, sendo que 37 estão em UPAs de Caxias e 24 em UPAs e hospitais de outros municípios. O tempo de espera varia conforme cada situação, sendo que casos de complexidade específica, ou seja, que demandam por serviço que menos hospitais ofertam, podem ter tempo de espera maior. A maior parte dos pacientes em lista nesta sexta-feira têm situações clínicas diversas, situação diferente de dezembro de 2021, quando a maior parte dos casos era de síndrome respiratória.
Dos 37 pacientes em UPAs de Caxias, 19 estão em lista há no máximo 48 horas, que é o tempo médio de espera atual, sendo que as transferências ocorrem à medida que há liberação de vaga.
Para se ter uma ideia, em dezembro de 2019, ou seja, antes da pandemia, a UPA Zona Norte chegou a ter 20 pessoas em espera no dia 5, cerca de metade dos pacientes que estão em duas UPAs nesta sexta-feira (a UPA Central começou a operar em 21/12).
A SMS explica, ainda, que para os casos de pacientes com iminente risco de morte é previsto em portaria do Ministério da Saúde o conceito de “vaga zero”, para que seja assegurado o acesso do paciente em tempo oportuno.
Em relação aos dois pacientes que vieram a óbito, ambos estavam cadastrados na Central de Regulação de Leitos, foram avaliados conforme os critérios clínicos de cada um e regulados para hospitais. As circunstâncias dos óbitos devem ser analisadas pela comissão interna de investigação de óbito da instituição, que é responsável por revisar todos os procedimentos e condutas profissionais realizados. A SMS se solidariza às famílias."