Distantes geograficamente por cerca de 80 quilômetros, Guaporé e Antônio Prado estão muito mais próximas do que se possa imaginar. Afinal, as duas cidades foram as únicas da Serra a conquistarem o selo Boas Práticas da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs). Guaporé por ter sido destaque nas áreas da educação, direitos humanos e fazenda, com atividades desenvolvidas nas escolas da rede municipal. Enquanto Antônio Prado foi lembrada por garantir internet de alta velocidade em locais onde nem sinal de celular havia há até pouco tempo.
Conheça os três projetos de Guaporé
Um jogo da memória com siglas e respostas voltados à educação fiscal não é algo comum para os pais comprarem aos filhos em qualquer loja de brinquedos. Esta é apenas uma das atividades praticadas pelos alunos da Escola Municipal Zaida Zanon. As ações envolvem também o programa trilha da educação, no qual os estudantes brincam de perguntas e respostas, naquele que deveria ser um tradicional jogo de dados. O sudoku - jogo onde há a colocação de números de 1 a 9 em cada uma das células vazias numa grade de 9x9 - foi adaptado especialmente para responder questões tributárias e sociais. Uma das mentoras da ideia foi a professora de matemática Gislaine Davi Zambam.
— É uma atividade de aprendizagem e consciência fiscal. Temos jogos interativos que despertam o conhecimento que vai além do habitual. Responsabilidade fiscal não é apenas pedir nota e exigir CPF num estabelecimento. Eles aprendem e repassam as informações para suas famílias — completa a professora.
Na escola ainda há um ponto de coleta para o destino correto do lixo. E a atividade se estende também para além dos muros do colégio. Foram instaladas bombonas pela cidade. Uma das motivadoras da prática é a aluna do sétimo ano, Laura Hartmann, 12 anos.
— Nosso ponto de coleta é para incentivar os alunos de todas as idades a dar o destino correto do lixo e levar essa ideia para sua casa. Fomos no aterro sanitário ver como funciona o processo do lixo e fizemos atividades nos bairros — comenta a aluna.
As ações se espalham pela cidade. Em uma escola infantil, existe o programa Biodigestor, que busca uma alternativa viável para o ambiente, capaz de reduzir o envio de resíduos orgânicos da instituição para o aterro. Os resíduos orgânicos provenientes da merenda são pesados e colocados no biodigestor. O biogás e o biofertilizante são capazes de suprir parte da demanda da escola. O biogás, por exemplo, é usado para acender o fogão e ferver a água para o chá da tarde para o estudantes.
Na escola municipal Alexandre Bacchi, localizada em um dos bairros da periferia de Guaporé, mais se 500 alunos participam de projetos. São oficinas formadas por turmas de 20 pessoas onde eles aprendem, entre várias atividades, a prática do plantio de verduras, chás e legumes.
— Nós plantamos alface, beterraba e até uma florzinha para dar para as profes. A minha profe dá o alface para eu levar para casa pros meus pais — comemora o jovem agricultor da horta Murilo dos Santos Andrade, 8 anos.
As oficinas têm por objetivo atividades práticas, lúdicas e voltadas ao compromisso com a vida e a natureza. Há uma mistura de idades. As atividades são realizadas por alunos do pré ao 9º ano.
— O legal é que o maior cuida e ensina o menor. Eles montaram também uma pequena floresta, fazem trilhas nos arredores da escola e aprendem a cuidar e a preservar o meio ambiente — aponta a coordenadora pedagógica, Adonice Ozelame.
Todas essas atividades envolvem cerca de três mil alunos das 11 escolas municipais de Guaporé. Ao todo, 580 educadores e instrutores educacionais orientam as atividades diariamente. Destas ações nasceram três projetos: o Bem Viver, o Cidade Educadora e o Educação Fiscal.
— O projeto Bem Viver surgiu após uma denúncia que tivemos na qual alguns alunos estariam programando um atentado a uma das escolas. Detemos a ação e, em 2019, nasceu o projeto, em parceria com a ONG Serpaz, de São Leopoldo, no qual fazemos ações de não violência e contra o bullying dentro das escolas. Está funcionando, além disso, nós não temos escolas pichadas, nem lixo no chão — destaca a secretária de Educação de Guaporé, Veridiana Tonini.
Todas as secretarias de Guaporé realizam ações diárias e as famílias dos alunos também participam de projetos, como a construção de brinquedos.
— É uma rede que se constrói dentro dos padrões que exigem cuidados com questões ambientais e sanitárias. Ele é um projeto amplo, nasceu na educação, mas é intenso com a saúde, meio ambiente, com ações integradas. É uma interação em que a comunidade faz parte do poder público — aponta a secretária.
Com o projeto Cidade Educadora, Guaporé ficou em segundo lugar na área da Educação em evento realizado pela Famurs. O programa Bem Viver conquistou o terceiro lugar em Direitos Humanos e o Educação Fiscal levou o terceiro lugar em Fazenda.
Conecta Rural liga interior de Antônio Prado
Em Antônio Prado, a internet de alta velocidade vem alterando a vida de moradores das áreas rurais. Uma das famílias beneficiadas é a da moradora Sirlene Gambin, que tinha dificuldades em ter acesso e fazer negócios de forma online.
— Antes a internet só "trancava". A colônia está como a cidade grande, nós precisamos nos conectar para vender e comprar produtos — declara a agricultora.
O programa Conecta Rural já mudou a vida de mais de 500 famílias beneficiadas com a instalação de 250 quilômetros de fibra óptica nas 32 comunidades rurais.
A ação da prefeitura buscou parceria público-privada para levar a banda larga para localidades que hoje dependem de internet via rádio, por exemplo, ou sequer conseguem fazer uma ligação de celular.
De acordo com o secretário de Agricultura, Meio Ambiente e Desenvolvimento Industrial, Gilmar Pontel, 43% dos moradores foram contemplados até o momento com a fibra óptica.
— Fomos premiados porque o projeto é pioneiro. Os moradores pagam R$ 470 pelo modem ou roteador, os demais custos são da prefeitura. Ao final, o Conecta Rural vai mudar a vida de pelo menos 1,2 mil famílias das 32 comunidades — comemora o secretário.
Para a compra dos cabos de fibra óptica, a prefeitura investiu R$ 460 mil no processo licitatório para a concessão do serviço. De Nova Prata, a empresa Adylnet ficou responsável pela instalação e comercialização dos planos de 20, 60 e 120 megabytes (MB) de velocidade que levam o sinal para propriedades distantes até 30 quilômetros do centro do município. A empresa utiliza os postes da Rio Grande Energia (RGE) para a instalação do cabeamento e deixa uma caixa a cada 300 metros para bifurcar os cabos em futuras conexões.
Com o programa, Antônio Prado levou o terceiro lugar, em Desenvolvimento Rural, no prêmio entregue pela Famurs.
Projetos premiados podem ser replicados
A 4ª edição do Prêmio Boas Práticas, realizado pela Famurs, reuniu 557 projetos de 220 municípios gaúchos. Destes, 45 projetos de 36 prefeituras receberam a premiação. A ação é um instrumento para reconhecer e estimular a realização de práticas inovadoras e replicáveis, desenvolvidas pelas administrações municipais e que contribuem para a implementação de políticas públicas. Não há premiação em dinheiro para os vencedores. Os municípios recebem o selo de Boas Práticas que serve de exemplo e inspiração para que as ideias sejam implantadas em qualquer cidade que necessitar de algum serviço.
De acordo com o presidente da Famurs, Paulinho Salerno, as iniciativas dos municípios foram divididas em 15 áreas, sendo que em cada uma, três projetos foram definidos como os que mais impactaram e que podem ser reproduzidos em outras comunidades para melhorar a qualidade de vida da população. As áreas premiadas envolvem projetos sobre: Assistência Social, Comunicação, Cultura, Desburocratização, Desenvolvimento Rural, Direitos Humanos, Ecossistemas de Inovação, Educação, Fazenda, Meio Ambiente, Melhor Idade (acima de 60 anos), Mobilidade Urbana e Trânsito, Saúde, Segurança Pública e Turismo.
— Os critérios principais na avaliação dos vencedores são a aplicabilidade do projeto, os resultados que gera e a possibilidade de replicar em outros locais. A partir da premiação, a gente faz uma aplicação com todas as iniciativas premiadas e repassa aos municípios do Estado, para que haja uma troca de experiências entre eles — aponta Salerno, que também é prefeito de Restinga Sêca.
Após a troca de experiências, os municípios que gostarem de uma iniciativa devem agendar uma visita para conhecer e avaliar a viabilidade da aplicação do projeto na sua cidade.