Enquanto os centros urbanos se preparam para a chegada do 5G, a quinta geração da rede de telefonia móvel, a zona rural ainda sofre com a ausência de um sinal de internet de qualidade. Seja para o contato dos produtores com clientes, para a emissão de notas fiscais eletrônicas ou até mesmo para incentivar as novas gerações a permanecer no campo, a conexão instável faz com que as distâncias pareçam ainda maiores.
Em Antônio Prado, na Serra gaúcha, essa realidade irá mudar, inicialmente, para 360 famílias beneficiadas com a instalação de 250 quilômetros de fibra óptica em 32 comunidades rurais. A novidade, idealizada por meio do programa municipal Conecta Rural, deve duplicar o número de assinantes nos próximos meses, conforme a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente. Isso porque é grande o interesse dos produtores que já acompanham a chegada da inovação nas propriedades vizinhas. A ação é da prefeitura, que buscou parceria público-privada para levar a banda larga para diversas localidades que hoje dependem de internet via rádio, por exemplo, ou sequer conseguem fazer um ligação de celular.
— Começamos com esse número que foi o apresentado para buscar as empresas interessadas, mas estamos com quase 400 cadastrados. Conforme as famílias assistem o fio passando, se interessam — conta a diretora da pasta, Cátia Chilanti, que aponta cerca de 800 famílias vivendo atualmente no interior do município.
O que é jornalismo de soluções?
É uma prática jornalística que abre espaço para o debate de saídas para problemas relevantes, com diferentes visões e aprofundamento dos temas. A ideia é, mais do que apresentar o assunto, focar na resolução das questões, visando ao desenvolvimento da sociedade.
Para a compra do cabeamento, a prefeitura investiu R$460 mil no processo licitatório para a concessão do serviço. De Nova Prata, a empresa Adylnet ficou responsável pela instalação e comercialização dos planos de 20, 60 e 120 megabytes (MB) de velocidade que irão levar o sinal para propriedades distantes até 30 quilômetros do centro do município.
De acordo com o representante da empresa, o engenheiro de telecomunicações Deividi Longaretti, a velocidade poderá ser aumentada, conforme a necessidade e o interesse do cliente, podendo chegar até 600 MB.
— Onde não tinha nem sinal de celular, agora poderá ser feito videochamada. É um aumento e tanto na qualidade de vida do interior — exalta o engenheiro.
A empresa utiliza os postes da Rio Grande Energia (RGE) para a instalação do cabeamento e deixa uma caixa a cada 300 metros para bifurcar os cabos em futuras conexões.
A demanda por um sinal de qualidade no interior da cidade aumentou ainda mais durante a pandemia, uma vez que alunos do meio rural foram obrigados a estudar em casa. Professora do curso de Medicina Veterinária da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Cátia Chilanti acompanhou estudantes que precisavam deixar a propriedade dos pais para concluir os estudos na cidade, onde a internet era mais confiável.
—Eram universitários que tinham muita dificuldade de acessar e participar das aulas — conta.
Foi o que aconteceu com Érica Camatti, 22, nos últimos semestres do curso de Agronomia. Na propriedade da família em São José do 2º Distrito, a instabilidade da internet por rádio era um complicador. Os estudos perdiam a constância e se tornavam um desafio a cada a aula.
— Era difícil, se dava um mau tempo, sempre caía. Agora vai mudar muita coisa. Um exemplo é poder acompanhar em tempo real o quanto de energia as placas solares estão gerando, antes isso era sempre complicado — revela Érica, que permanece no campo e investe em uma agroindústria ao lado de casa para produzir suco de uva e molho de tomate orgânicos comercializados em feiras de Porto Alegre.
Com 43 placas solares para abastecer câmaras frias, estufas e irrigação dos pomares, a propriedade da família Camatti possui produção diversa de orgânicos e tecnologia que não deixa as geadas queimarem a produção. Atento às inovações, a produção capitaneada pelo pai de Érica não poderia seguir sofrendo com as dificuldades de comunicação causadas pela ausência de sinal.
— A gente passou a fazer muitas coisas pela internet, aí que a gente viu a necessidade de ter um sistema melhor — explica Nilson Camatti, 50, que há 32 anos leva hortifrútis para as feiras do parque da Redenção e do bairro Menino Deus, na Capital. Agora com banda larga em casa, o contato com os clientes ficará mais fácil e será possível mostrar de onde vêm os produtos comercializados aos sábados.
— A minha filha decidiu ficar na agricultura, é um motivo de orgulho, ela criou um (perfil no) Instagram, que por ali os clientes fazem pedidos antecipados e retiram na feira. Antes, era só por telefone, que inclusive piorou muito o sinal nos últimos anos — compara Camatti.
Com a internet instalada, a ideia é ir além da publicidade nas redes sociais. Segundo ele, o sinal possibilitará monitorar a umidade do solo por meio de um aparelho já instalado na lavoura.
Rompendo a burocracia
A chegada da fibra óptica no interior de Antônio Prado não é apenas um atrativo para reter o jovem no campo ou para ampliar a tecnologia utilizada nas propriedades. A simples emissão das notas fiscais eletrônicas esbarrava na ausência de sinal, forçando agricultores a se deslocar para a área urbana para registrar o documento.
— Era a principal função da colônia sem internet. Quando precisava fazer a nota, tinha que ir até a cooperativa pra enviar. Lá na cidade, aproveitava a conexão pra fazer tudo que precisava — relata Aldino Foscarini, 38, que a cada safra envia a produção de uva, maçã e pêssego para São Paulo.
A esposa de Foscarini, a agricultora Cátia Menon, 31, comemora conseguir fazer os contatos, a partir de agora, via aplicativo de mensagens.
— Vai ajudar muito, fica tudo mais fácil para fazer notas, para escoar a produção e nos manter conectados. A gente se sentia excluído sem internet — desabafa.