Assim que recebeu uma pasta com documentos que certificam que o terreno onde mora há 24 anos é, a partir de agora, formalmente seu, a metalúrgica Adriana Brezolin Pereira, 49 anos, não escondeu o sorriso no rosto e deu um abraço nos papéis como se sentisse aliviada. Ela e o esposo Ademir de Assunção, 57 anos, estão entre as 100 primeiras famílias do loteamento Vitória, em Caxias do Sul, a receber o título de propriedade dos terrenos onde moram no núcleo habitacional localizado na região do bairro Planalto. A entrega das escrituras foi realizada na tarde deste sábado (21), no Centro Administrativo.
Na prática, as famílias do Vitória são as primeiras da cidade contempladas pelo programa municipal Esse Terreno é Meu, instituído a partir de lei para desburocratizar processos de legalização de propriedades que tramitam na cidade. Regularizar as áreas significa permitir que os moradores obtenham a escritura dos imóveis, etapa realizada neste sábado, e possam vendê-los ou transferi-los a herdeiros, por exemplo. A regularização permite também a construção da infraestrutura de serviços públicos, como construção de escolas, em troca de cobrança de impostos pelo poder público. A previsão é que seja possível arrecadar R$ 148 milhões por ano com essa iniciativa.
O loteamento Vitória começou a ser formado em maio de 1998 e, desde aquela época, muitos moradores buscam a regulamentação de seus terrenos e imóveis. Na solenidade, os moradores foram chamados em ordem alfabética, fazendo com que Adriana e Ademir fossem os primeiros a serem anunciados. Com a escrituração definitiva do lote nos braços, ela pretende contratar uma linha de crédito por meio de programas habitacionais para que seja possível reformar e ampliar a moradia, que o casal divide também com a filha Caroline, 15 anos.
— Tenho isso (regularização) como um presente. Peguei na mão e não queria mais soltar. Lutamos muito. No início, não havia água, luz, saneamento básico. Morávamos antes no bairro Salgado Filho, pagando aluguel, quando surgiu a oportunidade de ir para onde a gente mora. Pagamos pelo terreno e, agora, temos a propriedade de fato. É um novo momento. Agora, quero buscar recursos e melhorar a nossa casa — conta ela.
A entrega gratuita das primeiras escrituras simboliza a principal etapa do programa de regularização fundiária da prefeitura de Caxias. No Vitória, foram cadastradas 455 famílias, o que corresponde a 392 lotes. A coleta dos dados das famílias residentes no local começou em setembro do ano passado. Além de documentos pessoais, precisaram comprovar a propriedade do espaço por meio de contrato ou recibo de compra e venda.
Após, servidores da Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) trabalharam na análise individual da documentação dos 100 primeiros contemplados. Em novembro, a prefeitura protocolou o pedido de registro do loteamento junto ao Registro de Imóveis da 2ª Zona Imobiliária de Caxias do Sul. Com o avanço do processo no cadastro, foi possível emitir as certidões e entregá-las aos moradores. Além da entrega, a solenidade anunciou as 101 próximas famílias do Vitória a receberem o título de propriedade. Outras duas etapas devem ocorrer para finalizar o processo.
O processo foi liderado pelo titular da SMU, João Uez. Os moradores creditam o envolvimento dele como fundamental para o avanço do processo, que iniciou há vários anos e foi acompanhado por diferentes administrações. Além do Vitória, o loteamento Conquista deve receber a regularização nos próximos meses.
— Para nós, secretário e servidores, é muito gratificante. Percebemos a alegria e a felicidade nos olhos dessas pessoas, quando recebem a sua certidão, porque estão há anos lutando e não podiam dizer que o terreno era delas. Na verdade, não estamos dando nada para essas pessoas. Elas pagaram, estão morando há décadas, e resta ao poder público entregar as certidões — explicou.
Quem também foi bastante aplaudido pelas centenas de moradores que participaram da solenidade na prefeitura foi o presidente da Associação de Moradores de Bairro (Amob) Vitória, Genésio Jesus dos Santos.
— Gastei dois pares de sapato. A luta foi grande, andei bastante, saia de manhã cedo, sempre junto com a prefeitura para garantir a documentação. O pessoal da prefeitura não aguentava mais me ver por aqui. Hoje, quero agradecer a todos que ajudaram e quero que todo mundo (contemplados) olhe para esse documento porque simboliza um esforço muito grande de muita gente — discursou.
Construção de praça está parada
Uez explica também que a regularização possibilita o desenvolvimento do bairro, com a emissão de alvarás de localização que permitam a instalação de comércio, farmácias, colégio e até mesmo de um centro comunitário. Ainda não há projetos para implantação dessas melhorias, mas a prefeitura trabalha na construção de uma praça no local.
O espaço, com mais de 2,5 mil metros quadrados, receberá uma série de equipamentos para esportes e atividades físicas, além de locais para descanso. O investimento de R$ 352 mil para implantação da estrutura será feito pela MRV Engenharia como compensação a um empreendimento construído no Desvio Rizzo. Entretanto, a obra está parada e a prefeitura espera que os trabalhos retornem na próxima semana.
— A obra, neste momento, está parada devido a questões com a empresa. A expectativa é que ela retorne na segunda-feira — afirma Uez.
E é esse desenvolvimento que a dona de casa Elisete Gonzaga da Silva, 48 anos, quer ver no loteamento onde mora há 22 anos.
—Agora a gente tem certeza que é da gente mesmo. Antes a gente tinha medo. Queremos o melhor pra todo mundo e agora é ver crescer, ter mais comércio, mais oportunidades para o lugar onde a gente vive — conta ela, que mora com o esposo Alcides e é mãe de Alex, Lizandra, Evandro e Alexandro.