Com a casa nas costas, milhares de quilômetros rodados e roteiros conhecidos, o casal Adriana e Caio Cruz adicionaram nesta semana uma nova experiência para quem optou por uma vida sobre rodas: estacionaram o trailer em Cambará do Sul, na Serra, para curtir o frio e esperar pela neve em um dos destinos mais gelados do Rio Grande do Sul. Há três meses, Adriana e Caio decidiram fixar moradia na estrada e deixaram a vida tranquila em Indaiatuba, no interior de São Paulo, para viajar o país carregando a casa junto com eles. Desde então, colecionam novas histórias e compartilham o aprendizado na internet.
A ideia de passar semanas na estrada, com o trailer sendo rebocado pela caminhonete do casal, surgiu durante a pandemia. O período de distanciamento fez com que Adriana e Caio, 55 e 60 anos, respectivamente, decidissem encontrar uma nova rotina que servisse como válvula de escape após a aposentadoria. Por isso, o veículo ganhou até mesmo uma identificação especial e a frase “viva intensamente hoje”.
Apesar da preferência em conhecer novos locais no Exterior, eles estavam impossibilitados de sair devido às restrições de circulação. Para driblar a dificuldade, o casal resolveu desbravar destinos nacionais e, além disso, assumir o controle do modo como se deslocam em viagem e planejaram a compra de um motor home que, diferentemente do trailer, é conduzido pelo motorista e que geralmente são ônibus ou vans adaptados. Após a aquisição, perceberam que o modelo escolhido não satisfazia o desejo de ambos e decidiram, então, liderar o projeto da construção de um trailer especialmente pensado para o casal.
— Diferente do motor home, o trailer nos permite deixá-lo em algum local e usarmos o carro para passear, principalmente dentro das cidades. Não queríamos depender de outro tipo de transporte. Viajamos de forma mais barata. Pagamos R$ 50 para ficar em um camping em Gramado, por exemplo. Você não vai conseguir isso em hotel nunca. A gasolina está cara, mas não chega ao preço de uma passagem aérea — explica Adriana.
Caio conta que a experiência de viajar ganhou um novo sentido desde que iniciaram a aventura.
— O tempo de viagem muda. Se você vai de avião, é tudo muito rápido, conexão aqui e lá. Não há interação com as pessoas. A nossa velocidade com o carro é de menos de 80 quilômetros, não é a mesma que todo mundo anda na pista, então temos tempo para ver paisagem, a estrada se torna diferente — afirma.
O modelo do trailer foi construído em Jaraguá do Sul (SC) e levou seis meses para ficar pronto. Foi pensado para ser leve. Para acompanhar a construção da nova casa, o casal fez diversas viagens entre a cidade catarinense e Indaiatuba. Essa ligação com o Sul do país fez nascer o planejamento da primeira viagem com o trailer: percorrer as Serras catarinense e gaúcha.
Entretanto, somente a região de Santa Catarina foi visitada, em fevereiro, deixando o lado gaúcho para outra oportunidade. No início deste mês, para que Adriana pudesse comemorar o aniversário na Serra gaúcha, que era um desejo antigo, o casal resolveu voltar para a estrada. Saíram de São Paulo em 26 de abril e devem retornar somente no final deste mês. Antes de chegar a Cambará, na quarta (11), colecionaram roteiros pelas principais cidades da Serra.
— Paramos em Garopaba, fizemos uma parada de uma noite, e seguimos direto para a Farroupilha pela Rota do Sol. Para nós, subir é uma coisa diferente e, como somos novatos, foi uma experiência nova. Ficamos em Farroupilha, fomos para Bento Gonçalves e Gramado. Nesse período, fizemos também a nossa primeira aventura, que foi dormir em um posto, na encruzilhada de Ana Rech, em Caxias. Foi muito seguro, nos colocaram um local adequado para não ficar muito visível, sempre muito bem atendidos — conta Caio.
Até o momento, segundo ele, foram percorridos 2,8 mil quilômetros.
Trailer adaptado e recurso extra para enfrentar o frio
Pais de Guilherme, 28 anos, e dos gêmeos Pedro e Eduardo, 27, Adriana e Caio pensaram o trailer como um projeto de um casal em busca de novas experiências após décadas de trabalho e dedicação com os meninos.
Por isso, o espaço foi planejado com uma estrutura capaz de atender as necessidades de ambos: cama de casal, mesa que fica uma opção de cama para descanso, fogão, micro-ondas, secadora de roupas, ar-condicionado, banheiro e uma cafeteira italiana, que é o xodó da dupla, que se diz apaixonada por café.
Para melhorar a experiência, Adriana investiu na compra de organizadores para pratos e talheres, por exemplo, evitando que eles tenham atrito durante o deslocamento e se quebrem ou façam barulho. O trailer é equipado também com energia solar, que garante mais autonomia na estrada, e faz a captação da água da chuva para abastecer torneira e chuveiro. Em Cambará, com o receio das baixas temperaturas, eles compraram um aquecedor para ajudar a aquecer o ambiente.
— Chegamos em Cambará com a perspectiva de conhecer os cânions. E começou a história da neve, fomos ficando e aqui estamos procurando a neve. Cambará é linda, tem dois cânions absurdos de lindos, um monte de outras coisas para fazer. O clima mudou na cidade desde que começou essa história de neve. Faz bem para as pessoas — afirma Adriana.
De Cambará, o casal vai iniciar o retorno para São Paulo. Antes disso, fazem um passeio em Santa Catarina, incluindo uma parada para revisão do trailer. Nos próximos meses, eles planejam percorrer cidades do interior de São Paulo. O planejamento é uma ação fundamental, segundo eles, para evitar contratempos. Para o futuro, os planos são ainda maiores. Eles querem viajar, em outubro, para Ushuaia, na Patagônia argentina, uma viagem que deve durar de 60 a 70 dias.
A experiência em Cambará, quando os termômetros não passaram dos 5ºC na quarta-feira (18), ajudou a testar o trailer em condições de frio. Além da viagem, Adriana compartilha as experiências do casal em um perfil no Instagram, chamado de Cem Destino. A identificação gera reconhecimento: é comum receberem mensagens de pessoas na estrada dizendo que viram o trailer e querendo conhecer mais sobre as viagens.
— Gera muita interação e dá para fazer novos amigos. Exatamente a experiência que pensamos quando planejamos tudo. Divulgar é também fazer com que mais pessoas pensem que é possível fazer coisas novas depois dos 50 anos. Faz bem para o casal também. Como é um espaço muito pequeno, precisa ter a compreensão do outro. Passamos 24 horas juntos, tem que se amar muito — conta Adriana.