É por uma perspectiva histórico-crítica que o professor de comunicação e pesquisador na área de cultura popular e movimentos sociais, Dennis de Oliveira, pretende abordar a temática do racismo estrutural, em uma palestra que vai ministrar nesta terça-feira (19), a convite do núcleo caxiense das Mulheres do Brasil. A atividade marca a 4ª edição do Portas Abertas, um ciclo que vem sendo realizado de forma online, desde abril. Os encontros trazem à luz temas relacionados aos comitês de trabalho do movimento, com o objetivo de engajar mais mulheres ao grupo que se declara político apartidário e que começou a atuar na cidade em dezembro de 2020 no combate à desigualdade, violência e outras mazelas. A palestra de Oliveira, que também é escritor, será transmitida ao vivo pelo canal Mulheres do Brasil, no YouTube, a partir das 19h.
O tema central do encontro, organizado pelo comitê antirracismo, coincide com a mais recente obra lançada pelo convidado: "Racismo Estrutural: uma perspectiva histórico-crítica". O livro foi lançado neste ano pela Editora Dandara e, segundo o autor, busca contribuir para uma transcendência do debate, indo além da questão comportamental do racismo e retratando a dimensão estrutural estabelecida na sociedade.
— No livro mesmo eu tenho um exemplo, uma paisagem que eu dou do racismo estrutural: você passa em frente a uma escola particular de alto nível, vê crianças brancas saindo da escola, entrando no transporte escolar ou nos carros dos seus pais, indo pra casa descansar. Você anda alguns metros adiante e vê crianças negras vendendo doces nos faróis dos cruzamentos das avenidas. Além dessa situação, muito comum nas cidades brasileiras, você tem quase uma naturalização disso. Quando você naturaliza paisagens como esta, é uma manifestação do racismo estrutural, que estabelece lugares negros da exclusão e lugares brancos da inclusão — explicou o autor, em entrevista concedida ao Pioneiro nesta segunda-feira (18).
Oliveira é jornalista e milita no movimento negro desde a década de 1980. À época, ele estudava na Universidade de São Paulo (USP), onde hoje atua como professor da Escola de Comunicações e Artes e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados (IEA) — entre outras instituições nacionais e internacionais nas quais leciona ou coordena programas de pesquisa. Em sua trajetória, também fundou movimentos sociais como a Rede Antirracista Quilombação, que atua em São Paulo desde 2013.
Convidado a palestrar pelo movimento de mulheres, Oliveira diz sentir-se honrado e pretende compartilhar em sua fala fundamentos de sua obra e trajetória na militância. Um deles é a contribuição de Lélia Gonzales (1935-1994), intelectual que figura entre as pioneiras nas discussões mundiais sobre a relação entre gênero, classe e raça.
— É uma referência para o movimento negro porque aborda o feminismo negro a partir de um pensamento muito sofisticado. Os movimentos sociais, de modo geral, têm muita dificuldade de entender as agendas antirracistas porque têm concepção muito eurocêntrica, não conseguem entender as particularidades do Brasil. E não tem como achar que isso é algo secundário, porque faz parte da estrutura social brasileira, é uma chave explicativa — comenta Oliveira.
Ele reforça a importância da ampliação do olhar sobre a causa:
— Tivemos avanços, temos movimentos e marcos regulatórios importantes e isso gera reação contrária, naturalmente, porque a população que se julga branca no Brasil se sente incomodada em pertencer a um país de maioria negra. O racismo sustenta as desigualdades sociais e temos que transcender um pouco a ideia comportamental. É uma abordagem importante, mas não se trata só disso, é preciso repensar estruturas sociais.
Movimento de portas abertas
Em abril, quando o Núcleo Caxias do Sul das Mulheres começou a realizar o Portas Abertas, o grupo contava com 150 integrantes. Hoje, este número passa de 200. Segundo Andréa Varaschin Webber, uma das líderes locais, encontros virtuais como a palestra com o professor Oliveira estão ocorrendo a cada 45 dias, em média, e servido como meio de divulgação do trabalho que é realizado pelos comitês, que antes eram cinco e agora chegam a sete frentes de atuação: igualdade racial, violência contra a mulher, saúde, educação comunicação, meninas do Brasil e empreendedorismo.
— Cada edição é amadrinhada por um dos comitês. Desta vez convidamos o professor para falar da problemática do racismo no Brasil e no mundo, algo que vem de uma sociedade patriarcal. A gente precisa cada vez mais falar e pensar sobre nossas atitudes — destaca Andréa, que convida mulheres a assistirem à palestra e engajarem-se ao movimento.
Para fazer parte do grupo e/ou atuar como voluntária nos comitês, mulheres podem se cadastrar no site das Mulheres do Brasil, e preencher um formulário na seção "Junte-se a nós".