Moradores da região de Caxias do Sul que decidem ir a Gramado ou Canela na alta temporada ou em períodos de grande procura, como feriados, já sabem que o trânsito na RS-235, que liga os municípios a Nova Petrópolis, fará parte do passeio. Especialmente quando há eventos importantes na região, ver veículos enfileirados no pedágio de Gramado, por exemplo, é cena comum.
Mesmo com pouco mais de duas décadas de cobrança de pedágio para o acesso à região turística, nunca houve aumento da capacidade da rodovia, que apresenta pista simples nos 74 quilômetros de extensão, entre Nova Petrópolis e São Francisco de Paula. No caso dos poucos mais de 30 quilômetros que ligam a BR-116 ao pórtico de Gramado, não há nem mesmo acostamento em alguns trechos, embora a rodovia apresente boa sinalização e ausência de buracos.
O novo modelo de pedágios proposto pelo Estado e que passou por discussão pública até o mês passado, propõe mudar essa realidade e finalmente adequar a estrada à demanda. O projeto prevê que todo o trecho entre Nova Petrópolis e Gramado seja duplicado obrigatoriamente até 2029, o sétimo ano de contrato. A ampliação da capacidade incluirá ainda quatro correções de traçado, com o objetivo de suavizar ou eliminar curvas. Um dos pontos é no km 5,5, junto ao Pórtico de Nova Petrópolis, que ganhará uma curva mais suave. Desvios também estão previstos entre os kms 19,4 e 20,8, na localidade de Linha Araripe, e entre os kms 28,5 e 30, em Linha Carrazal, já em Gramado.
O trecho de um quilômetro que antecede o pórtico de acesso a Gramado, para quem vem do sentido de Nova Petrópolis, também será modificado para eliminar o contorno. Essa alteração exigirá a construção do único viaduto previsto no projeto, no km 31,2, próximo ao condomínio Aspen Montain. Ao contrário de outras estradas, como a RS-122 e a BR-470, que receberão várias das chamadas obras de arte, a RS-235 contará principalmente com rotatórias em acessos importantes. Ao todo, serão seis rótulas alongadas e uma no formato tradicional, que exigirão aporte total de R$ 18,7 milhões. Todas elas serão implantadas com a duplicação, orçada em R$ 85,41 milhões.
Embora a ampliação de capacidade da RS-235 seja uma necessidade da região, o anúncio do projeto despertou um dilema em moradores de Nova Petrópolis. Ao mesmo tempo que esperam melhorias na estrada que corta a área urbana (a prefeitura tenta inclusive antecipar os investimentos), também há o temor de que se crie uma via expressa bem no coração da cidade. Para Luciane Sommer, 43 anos, que mora e mantém um mercado na Linha Imperial, criar um traçado que contornasse a cidade seria mais adequado. Ela também reclama das atuais condições da rodovia, levando em consideração que já há cobrança de pedágio.
— No fim de semana e nos horários de pico é o caos. Não sei se duplicar seria a solução. Poderiam achar uma maneira de tirar os caminhões. Nosso acostamento é muito precário, não existe espaço adequado para caminhar ou andar de bicicleta. Pelo fluxo, deve entrar muito dinheiro nesse pedágio. A estrada poderia estar muito melhor — opina.
Além da duplicação do trecho de pista simples, o projeto prevê a implantação de uma faixa adicional nos dois quilômetros que separam a BR-116 do acesso ao Parque Aldeia do Imigrante, justamente o trecho central de Nova Petrópolis. O investimento está previsto para 2038 (15º ano de contrato), ao custo de R$ 6,2 milhões. Em Canela também se prevê duplicação entre os bairros Canelinha e Saiqui.
Embora os investimentos mais pesados sejam em rotatórias e faixas adicionais, o projeto da RS-235 prevê implantação de quatro passarelas para pedestres e melhorias em 93 acessos. Considerando ainda investimentos em recuperação e manutenção, o total a ser aportado pela concessionária ao longo dos 30 anos de contrato será de R$ 407 milhões.
Cobrança desde o primeiro dia
Atualmente sob administração da Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), os pedágios de Gramado e São Francisco de Paula serão mantidos e cobrarão a tarifa desde o primeiro dia de contrato. O valor de R$ 7,10 para carros, contudo, tende a ser alterado para cima ou para baixo, a depender do resultado do leilão que escolherá a concessionária vencedora.
O critério de seleção permite a oferta de até 25% de desconto sobre a tarifa base. No caso da praça de Gramado, esse valor de referência é de R$ 7,66. Com os 25% de deságio, pode chegar a R$ 5,74. Para São Francisco de Paula, a tarifa deve ficar entre R$ 5,60 e R$ 7,47, caso esse critério seja de fato adotado (o Estado avalia possíveis modificações a pedido das regiões).
Mesmo com a permanência da cobrança em São Francisco de Paula, o projeto não obriga a duplicação do trecho entre o município e a vizinha Canela, embora o terreno já pareça estar preparado para a construção de novas faixas na saída de Canela. Também não há previsão de modificações importantes no trânsito, além da manutenção. Investimentos, contudo, podem ser realizados caso o movimento no futuro se justifique. Mesma situação ocorre nos nove quilômetros que separam Gramado e Canela.
Para o casal, Beatriz Pereira de Andrade, 52, e Luciano André Livi, 51, de fato o movimento do trecho Canela-São Francisco de Paula não justifica duplicação. Na avaliação deles, porém, as condições da estrada não condizem com o valor pago pelo pedágio. Em frente ao comércio mantido pelo casal, próximo ao acesso à Barragem do Salto, em São Francisco de Paula, o pavimento foi restaurado há cerca de quatro meses, mas antes apresentava buracos.
— Hoje estraga seu carro, você fica empenhado e ninguém vê — relata Livi.
— Ela deveria ser bem sinalizada e com pedágio mais barato. É justo pagar, porque estamos usando, mas um valor mais baixo — complementa Beatriz.
Já Rodrigo Licks, 40, que possui uma eletromecânica às margens da rodovia em Canela, não concorda com o pagamento de tarifa.
— Nem deveria ter que pagar e já era para estar bom. Você já paga imposto e ainda o pedágio — reclama.
RS-020 e RS-115 também estão contempladas
A RS-235 integra o bloco 1 das concessões rodoviárias, que também contempla estradas do Vale do Paranhana e Região Metropolitana de Porto Alegre. Na Serra, além da ligação entre Nova Petrópolis e São Francisco de Paula, também estão contemplados trechos da RS-115, que também serve de acesso a Gramado a partir de Taquara, e a RS-020, no contorno urbano de São Chico.
No trecho de Gramado da RS-115, o projeto determina a duplicação da rodovia no bairro Várzea Grande até o 5º ano de contrato. Já o contorno de São Francisco de Paula pela RS-020 deve ter pista dupla até o 25º ano de contrato, com três rótulas simples nos acessos secundários e uma rótula alongada no acesso principal. Somente a duplicação tem custo estimado em R$ 14 milhões.
Outra rodovia que terá investimentos na Região das Hortênsias é a RS-466, que liga o acesso a Canela ao Parque do Caracol e outros pontos turísticos importantes da cidade. Atualmente em pista simples, a via deve ter os sete quilômetros duplicados até o 20º ano de contrato.
O que está previsto para a RS-235
- Manutenção constante, recuperação, contenções e monitoramento de encostas nos 74 quilômetros da rodovia, com custo estimado em R$ 274 milhões em 30 anos.
- Serviços de apoio aos motoristas, como guincho e ambulância.
- Duplicação de cerca de 30 quilômetros entre o Parque Aldeia do Imigrante, em Nova Petrópolis e o pórtico de acesso a Gramado, com ajustes de traçado. O custo é de R$ 85,41 milhões e a implantação é no sétimo ano de contrato.
- Faixa adicional entre o entroncamento com a BR-116 e o Parque Aldeia do Imigrante, em Nova Petrópolis. A obra será feita no 15º ano de contrato ao custo de R$ 6,2 milhões.
- Construção de seis rótulas alongadas entre Nova Petrópolis e Gramado ao custo de R$ 2,9 milhões cada uma. Implantação será junto com a duplicação
- Construção de quatro passarelas, com custo total de R$ 3,79 milhões. As estruturas ficarão no acesso ao bairro Pousada da Neve, bairro Piá e Linha Brasil, todas em Nova Petrópolis. O quarto ficará no km 44, em Canela.
- Construção de viaduto no km 31,2, próximo ao condomínio Aspen Montain.
- Pedágio de Gramado será mantido, sem interrupção nas operações. As tarifas iniciais estão previstas para ficar entre R$ 5,74 e R$ 7,66.
- Pedágio de São Francisco de Paula também será mantido, sem interrupção nas operações. As tarifas iniciais estão previstas para ficar entre R$ 5,60 e R$ 7,47.
- Adequação em 93 acessos a estabelecimentos, com custo de 18,2 milhões e implantação no sétimo ano de contrato.
- Total de investimento previsto em 30 anos: R$ 407 milhões.
O que dizem os prefeitos
A RS-235 corta os municípios de Nova Petrópolis, Gramado, Canela e São Francisco de Paula. A reportagem procurou todos os prefeitos para saber o que pensam a respeito do projeto. Apenas o prefeito de Gramado, Nestor Tissot (Progressistas) não retornou à reportagem.
— Tivemos o cuidado de fazer diversas audiências públicas para discutir junto à comunidade a melhor maneira de encaminharmos este assunto. Sabemos que o Estado tem uma proposta pronta de duplicação, mas como a matéria é por 30 anos estamos discutindo a melhor forma de fazer essa concessão. Há o entendimento de que algumas pessoas concordam com a duplicação e outras são contrárias. Temos que ter o equilíbrio, é uma decisão muito difícil, mas envolvendo pessoas teremos a condição de tomar a melhor decisão. Dessa forma teremos a possibilidade de tornar a RS-235 não uma via expressa, mas uma rodovia segura, com acostamento, ciclovia, iluminação.
Jorge Darlei Wolf (PSDB), prefeito de Nova Petrópolis.
— Quando tiver a construção definitiva do edital de concessão, há garantia de uma audiência pública com toda a região para afinar os detalhes. Serão trechos que serão concedidos, isso já está definido pelo governo do Estado, e não há muito o que fazer. O que precisamos ver é a garantia de rótulas, desvios, recuos, a questão das paradas de ônibus e assim por diante. Mas se conquistarmos essas duplicações e melhorias, seria um avanço extraordinário. Às vezes fico me questionando se isso vai ser tão real.
Constantino Orsolin (MDB), prefeito de Canela e presidente da Associação dos Municípios de Turismo da Serra (Amserra).
Por meio da assessoria de imprensa, o prefeito de São Francisco de Paula, Marcos Aguzzolli (Progressistas) disse não se opor à manutenção do pedágio da RS-235 no município. Ele se diz contrário, contudo, a pedágios na RS-020, já que o retorno irá demorar muito tempo para ser sentido no entorno do município.