O começo foi simples e cercado pela incógnita. Era meados de 2008, auge da crise da educação infantil em Caxias do Sul. Os freis capuchinhos e voluntários de ações sociais perceberam o drama de muitas crianças afetadas pela falta de creches na rede pública e tiveram a ideia de colocar os pais no caminho de pessoas dispostas a apoiar a compra de vagas na rede privada. Sem alarde, a Legião Franciscana de Assistência aos Necessitados (Lefan) contatou moradores conhecidos pela caridade em Caxias e selecionou pais que não tinham condições financeiras para arcar com as mensalidades. Nascia ali o embrião do projeto Mão Amiga, hoje referência para outros municípios da Serra.
Neste sábado (7), a iniciativa que une centenas de pais, crianças, voluntários, padrinhos e parceiros da comunidade completa 10 anos. No domingo (8), às 18h, o aniversário será lembrado com uma missa de ação de graças na Igreja dos Capuchinhos. O lançamento oficial do Mão Amiga ocorreu no dia 7 de setembro de 2009, mesma data do aniversário da Lefan. No currículo do projeto, há histórias de cerca de 7 mil crianças atendidas em uma década, muitas delas que passavam o dia em casa, às vezes sob a supervisão do irmão um pouco mais velho. Agora, a gurizada vislumbra uma perspectiva de aprendizado e inclusão ao lado de coleguinhas em escolas estruturadas.
O casal Gustavo Mazzochi, 24 anos, e Ana Lúcia Pereira dos Santos, 26, que o diga. Pais de Maria Eduardo, cinco, e de Luiz Gustavo, dois, eles enfrentaram barreiras financeiras para colocar os filhos numa escolinha. Neste ano, Ana Lúcia conseguiu um emprego, mas o casal não sabia com quem deixar o menino — Maria Eduarda frequenta um colégio regular.
— O salário está apertado, consegui pagar um mês e depois recorri ao Mão Amiga por conselho de uma professora. Assim, achamos uma vaga para o Luiz Gustavo — conta Gustavo, que só tinha ouvido falar da iniciativa.
A solidariedade que garante o pagamento de metade da mensalidade de R$ 600 numa escolinha do bairro Jardim Eldorado balançou o coração de Gustavo e Ana Lúcia. Como contribuição pelo apoio, os dois decidiram virar voluntários do projeto e ajudam a organizar os eventos e a arrecadação de roupas doadas para venda, ações fundamentais para manter a saúde financeira do Mão Amiga.
— Não fosse esse apoio, seria inviável. Então, é nossa forma de retribuir o que recebemos — diz o pai.
O papel dos padrinhos, apoiadores e voluntários
Fosse estender o agradecimento a todos os apoiadores neste aniversário, os integrantes do Mão Amiga precisariam passar horas e horas concedendo abraços e apertos de mão. Atualmente, são cerca de 60 voluntários atuantes e 520 padrinhos que doam dinheiro para custear parte das mensalidades, segundo a voluntária e presidente do projeto, Cíntia Costamilan.
A participação da comunidade e de empresas é quase imensurável, basta ver a grande adesão nos eventos paralelos como o Piquenique Solidário e o Mão Amiga Gourmet, que revertem a renda para o projeto. Se em 2009, com pequenas doações, o Mão Amiga atendia cerca de 40 crianças, hoje, com mais visibilidade, o benefício alcança atualmente 361 meninos e meninas matriculados em 117 escolas parceiras e deve atingir 400 até o final de setembro. As instituições de ensino reduzem o custo da mensalidade para os inscritos no projeto. Mensalmente, são necessários cerca de R$ 100 mil para garantir o atendimento.
— Os recursos para pagar esse custo mensal provêm de padrinhos, eventos que promovemos, recursos da Nota Fiscal Gaúcha, doação através do Imposto de Renda, convênios com algumas empresas e doações espontâneas — elenca Cíntia.
Frei Jaime Bettega, idealizador do Mão Amiga, lembra do início difícil, pois nem todo mundo entendia a finalidade.
— Iniciou pequeno, não sabíamos que seria o Mão Amiga. No decorrer do caminho, o projeto foi sendo adaptado. Não tínhamos funcionários e nem parcerias, apenas uma professora cedida pelo município, mas uma demanda muito grande. Faltava alguém para escutar a situação das famílias para uma avaliação adequada. Diria que tudo foi resultado da teimosia positiva de um pequeno grupo que acreditava que o caminho era esse — orgulha-se Bettega.
O religioso e voluntários estavam certos. O Mão Amiga inspirou a vizinhança e expandiu horizontes para Farroupilha, Flores da Cunha e Bento Gonçalves. Nessas cidades, o serviço é mantido por grupos diferentes, sem relação com a equipe de Caxias do Sul.
— Qualquer pessoa pode apoiar com doações em dinheiro. O valor não importa — ressalta Cíntia.
SAIBA MAIS
:: O Mão Amiga atende crianças de criança de zero a quatro anos de famílias com renda máxima de 1,5 salário mínimo per capita.
:: Após inscrição, a seleção é realizada por uma equipe composta de assistente sociais e psicólogas. Os critérios são técnicos, mas um dos requisitos é que os pais precisam estar trabalhando e a criança deve estar inscrita na lista da Secretaria Municipal da Educação (Smed).
:: Se a família se enquadrar no perfil, a criança é encaminhada para uma escola parceira da rede privada. O custo da mensalidade é reduzido. Os pais pagam a metade e o restante fica sob a responsabilidade do Mão Amiga.
:: Em contrapartida, os pais beneficiados devem ter frequência nas reuniões bimestrais e participar de quatro encontros de formação durante o ano sobre vários assuntos como educação financeira , espiritualidade e aspectos psicológicos.
:: A permanência das famílias no projeto é avaliada anualmente. Caso a família tenha deixado de cumprir os requisitos, a vaga é encaminhada para outra criança.
:: Para buscar informações de como ser um beneficiário, voluntário ou padrinho, basta acessar o site maoamigacaxias.org.br
Jantar beneficente será em outubro
O jantar beneficente Mão Amiga Gourmet, que já ocorre há seis anos, tem ingressos à venda. O evento terá 15 cozinhas diferentes e será realizado no Restaurante Tulipa, nos Pavilhões da Festa da Uva, no dia 19 de outubro, às 20h. Os ingressos custam R$ 160 e estão disponíveis na secretaria do Mão Amiga (Rua General Mallet, 33, bairro Rio Branco). Mais informações pelo email gerencia@maoamigacaxias.org.br ou pelo telefone (54) 3223-5420.
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