Disputar a Paralimpíada de 2024 em Paris, onde Édith Piaf cantou a vida em rosa na música "La Vie En Rose", é o sonho de três atletas que representam Caxias do Sul. Chegar até a competição na França pode significar mais um passo em uma caminhada de dedicação, de dor e de conquistas por meio do esporte. Afinal, o esforço pessoal cedo ou tarde é recompensado pelos ventos do destino.
Além de Maria Eduarda Stumpf, do taekwondo, que abriu a nossa série especial sobre o paradesporto caxiense, mais dois paratletas sonham com a cidade da torre metálica mais famosa do mundo. O judoca Marcelo Casanova e a nadadora Larissa Rodrigues buscam vagas para os Jogos, que acontecerão de 28 de agosto a 8 de setembro, em 2024. Ambos são atletas do Recreio da Juventude.
Com albinismo e 6,75 graus de astigmatismo, Casanova começou no judô em 2012, com nove anos, por influência do pai, Antônio Casanova, também judoca. Ele vê na família o combustível que o motivou a dar os primeiros passos para o sonho maior.
— A família sempre incentivou, ainda mais que o meu pai já praticava. As dificuldades existiam, mas sempre consegui contornar com ajuda dos senseis. Nunca foi um empecilho. O déficit visual se deve ao albinismo, uma condição genética. Nas provas e treinos é sem óculos e acabei me adaptando ao reflexo de pegada e de defesa. Tem uma diferença muito grande estar com e sem óculos — contou o paratleta de 18 anos.
Casanova competiu nas categorias de base e no adulto até 2020, enfrentando adversários sem qualquer restrição de visão. E com bons resultados. Em 2021, após uma conversa com o técnico Giovani Cruz, optou por buscar mais uma vez o paradesporto, por conta do déficit de visão. E isso o fez modificar o seu planejamento a curto e médio prazo.
Para chegar a Paris, ele sabe que o caminho não perdoa deslizes. O judoca foi convocado pela Seleção Brasileira de Judô Paralímpico para disputar o Campeonato Mundial, que será realizado em Baku, no Azerbaijão, de 8 a 10 de novembro deste ano. Ele vai competir na categoria até 90 kg, na classe J2, para quem consegue ter a percepção de imagens e vultos..
— É bem possível, mas é difícil (Paris). Vai ser suado. O mundial é importante e dá muitos pontos. Para ir para as Paralimpiadas tem que estar pontuando sempre e tentar pleitear uma vaga. Seria sensacional pela experiência, a realização de um sonho, motivação que isso gera no dia a dia. Seria a coroação de um trabalho — explicou.
Marcelo Casanova foi o primeiro atleta paralímpico do Recreio da Juventude. Recentemente, ele foi bicampeão do Gran Prix de Judô Paralímpico, disputado em São Paulo.
"O esporte transforma vidas"
Quem escuta Larissa Rodrigues pensa que ela já tem muitos anos de experiência no paradesporto. A desenvoltura nas palavras reflete a habilidade na água. Medalhista de bronze em duas provas no Mundial de Natação Paralímpica, em Portugal, a jovem de 17 anos não esconde que a grande meta pessoal para os próximos anos é estar em Paris.
— Vejo que eu posso chegar a Paris sendo atleta do Recreio da Juventude, sendo atleta da Dani Gonzalez (treinadora), porque o Rio Grande do Sul tem como levar uma atleta a Paris. Acredito que é continuar me dedicando 100% para isso. Como diz a Dani, respirar a natação, respirar o esporte e treinar cada vez mais, não me desviar desse caminho, não deixar a minha mente crescer o meu ego e ser uma pessoa sempre humilde — relatou Larissa em entrevista ao programa Show do Esportes.
Larissa nasceu com uma má formação congênita em seus braços e pernas. Após uma infância com doses diárias de superação, ela encontrou no esporte o sentido da vida.
— Eu fui adotada com três anos. A expectativa que tinham era que eu vivesse até os seis, porque não tinha cuidados específicos. Por conta da minha deficiência, a minha família não conseguia me cuidar muito bem. Provavelmente, eu não estaria viva hoje, e eu uso isso como um milagre. Nunca imaginei ser uma atleta de ponta, de alto rendimento. Sempre gostei muito de água, de nadar, e aí nasceu um grande sonho e um grande amor por esse esporte. Além de liberdade, a natação me ensina a ter disciplina — destaca Larissa.
No sopro que é a vida, cada minuto pode fazer a diferença para alcançar os objetivos. O primeiro passo é ter a iniciativa de querer mudar a sua rotina através do esporte, que vai além de apenas uma prática esportiva.
— O esporte transforma vidas. Ele deixa a nossa vida com muito mais qualidade. Eu não me tornei só uma medalhista mundial, mas, também, consegui ver potenciais dentro de mim e me ajudou muito na minha saúde. Ser uma esportista é poder incentivar as pessoas através do esporte, e é algo muito grandioso. Acho que as pessoas nunca devem desacreditar de si — finalizou.
PARIS 2024
Pela primeira vez, a cerimônia dos Jogos Paralímpicos não será dentro de um estádio. Paris 2024 promete inovar. Nesta semana, os organizadores anunciaram que o evento de abertura será no coração da cidade do amor. Os paratletas irão desfilar na Champs-Élysées e na Praça da Concórdia. A ideia é contar com um público de 65 mil pessoas.
Faltando menos de dois anos para o momento tão aguardado pelos paratletas, o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) traçou um planejamento para o megaevento na capital francesa. A delegação brasileira deverá ser maior que os 234 atletas dos Jogos de Tóquio. Para os Jogos de Paris 2024, a expectativa é de que cerca de 250 esportistas representem o Brasil.
— Estamos trabalhando para que em Paris 2024 tenhamos um resultado ainda melhor do que em Tóquio. Não está sendo fácil, dados os desafios que enfrentamos ao longo deste ciclo, começando pelo fato de ele ser menor que todos os demais. Mas nossos atletas estão tendo todas as condições de chegar em Paris no mais alto rendimento para escrever um novo capítulo histórico para o Movimento Paralímpico Brasileiro — explica Mizael Conrado, presidente do CPB e bicampeão paralímpico como jogador de futebol de cegos (Atenas 2004 e Pequim 2008).
A meta do CPB para os Jogos de Paris 2024 é se manter no top 8 e conquistar entre 70 e 90 medalhas. Na última edição da Paralimpíada, em Tóquio 2020, o Brasil deixou a capital japonesa com 72 medalhas. Foram 22 de ouro, 20 de prata e 30 de bronze, representando a melhor campanha do país em uma edição dos Jogos.
Para os Jogos de Paris 2024 as modalidades em disputa são: atletismo, badminton, basquete em cadeira de rodas, bocha, canoagem, ciclismo, esgrima em cadeira de rodas, futebol de cegos, goalball, halterofilismo, hipismo, judô, natação, remo, rúgbi, taekwondo, tênis de mesa, tênis em cadeira de rodas, tiro com arco, tiro esportivo, triatlo e vôlei sentado.
Duas modalidades apresentam mudanças significativas nesta edição dos Jogos Paralímpicos: a bocha e o taekwondo. Para a bocha, esse será o primeiro megaevento com separação de gênero. Já o taekwondo teve a inclusão de duas categorias de peso por gênero, todas para a classe K44.
Para o futebol de cegos, que o Brasil é pentacampeão paralímpico, também serão os primeiros Jogos com a nova regra de tempo de jogo (reduzido de 20 para 15 minutos em cada tempo). O judô também disputará com novas regras de classificação visual e de categorias de peso.
CERIMÔNIA DE ABERTURA
NÚMEROS
- De 28 de agosto a 8 de setembro (2024)
- 549 provas (10 a mais que Tóquio 2020)
- 22 modalidades
- 4.400 atletas
- 182 países
- 65 mil lugares na abertura
- Expectativa de 250 paratletas brasileiros
- 235 eventos de medalhas para mulheres
PRÓXIMO CAPÍTULO
BARREIRAS E POLÍTICAS PÚBLICAS
:: Qual foi a semente plantada para que Caxias do Sul se tornasse um polo do paradesporto do Rio Grande do Sul? Pedido feito há dez anos foi fundamental para a criação de uma política pública de incentivo ao paradesporto na cidade.