Cada um usa a arma que tem em mãos. Apesar de viver desde os 13 anos no Complexo do Alemão, considerado um dos lugares mais perigosos do Rio de Janeiro, Bruno Itan decidiu que não usaria revólver ou fuzil. Sua arma seria uma câmera fotográfica apontada para a realidade. Com sensibilidade, procura ajustar o foco em cenas que podem dar conta de revelar uma outra realidade por detrás do que o nosso olhar cristalizado está acostumado a ver.
Atualmente, Bruno é fundador do projeto Olhar Complexo, que oferece aulas de fotografia gratuitas a crianças e jovens da favela. Bruno é focado em retratar a realidade e o cotidiano, exaltando a felicidade e simplicidade dos moradores, levando a cultura da fotografia pelas favelas cariocas. Toda essa bagagem ele promete compartilhar aqui em Caxias do Sul.
Na cidade o cara participa, até sexta-feira (30), de ações do Mosaico na Quebrada, no bairro Jardelino Ramos. Entre as atividades, Bruno participa de uma residência artística com o fotógrafo William Cabral. O material vai se transformar em uma exposição futura. Leia a seguir, uma breve entrevista com o fotógrafo que diz estar ansioso para andar e fotografar pelas ruas de Caxias.
Por que esta decisão de registrar imagens da favela a partir da simplicidade, beleza e felicidade?
Desde quando comecei a morar numa favela do Rio de Janeiro, vindo do Nordeste, percebi que as pessoas falavam da favela e tinham um preconceito sobre morar na favela, na hora de procurar emprego também era difícil porque você morava na favela. Foi aí que eu pensei em mostrar as coisas boas e positivas que existiam dentro da favela. E a arma que eu tinha para isso era a fotografia. Desde cedo eu decidi que não ia entrar para o crime. Todas as pessoas que conheci, amigos meus, tinham apenas dois caminhos: ou eram presos ou iam ser mortos. Foi aí que eu optei pela fotografia, que mudou a minha vida por causa do registro do potencial da favela através do meu olhar.
Estou ansioso para andar nas ruas de Caxias do Sul e conhecer. Ansioso por ouvir histórias e registrar um pouco a comunidade com o meu olhar.
BRUNO ITAN
fotógrafo
O Brasil precisa rever seus olhar e sua ideia sobre as periferias?
Sim, precisa não só repensar, como conhecer. Esse é um trabalho importante que faço nas favelas do Rio. Mostrar que não é só a violência que toma conta das favelas. Noventa e nove por cento das pessoas que moram na favela são do bem. Tem um por cento que toma a capa dos jornais. Às vezes, as pessoas compram violência. Mas tento mostrar que não é só violência aqui dentro. As pessoas precisam conhecer não só as favelas, mas quem vive ali dentro. Tento, através do meu olhar, mostrar que aqui tem pessoas incríveis, histórias incríveis.
Qual a importância do Olhar Complexo para a comunidade e o teu trabalho?
É importante porque a gente precisa de exemplos positivos na favela. De negativo, tem um monte aí. Por que entram no crime, no tráfico? Porque aquilo é uma realidade nas favelas. E é um espelho para muitas crianças, muitos jovens, que às vezes não têm a oportunidade de ir para a escola, não têm nada, mas têm a oportunidade de conhecer o crime que está ali, perto da casa dele, na esquina. Está ali onde ele brinca. Tento usar o meu trabalho como uma referência positiva. Às vezes ele vai estar ali na esquina, olhando alguém segurando um fuzil e pode olhar para o outro lado e me ver segurando uma câmera. Temos que mostrar que tem muito potencial aqui dentro: atores, cantores, artistas que também são exemplos para a favela.
Qual a expectativa para a Residência Artística em Caxias do Sul?
Minha expectativa já está sendo muito positiva. Estou ansioso para chegar, ver o local e o território. É importante a gente levar esse olhar diferente sobre o Rio de Janeiro para outros locais e conhecer outra realidade. Apesar de que, às vezes, é parecido, mas tem a geografia do local. Estou ansioso para andar nas ruas de Caxias do Sul. Ansioso por ouvir histórias e registrar um pouco a comunidade com o meu olhar.