Dando sequência à trajetória de 80 anos de seu Juvelino Daneluz, tema da coluna de sábado, destacamos hoje a contribuição histórica do professor ao distrito de Santa Lúcia do Piaí. Em abril de 1965, aos 21 anos, seu Juvelino escreveu a poesia Água Azul, relatando o martírio do Padre Cristóvão de Mendoza pelos indígenas, em 1635.
Segundo a lenda, o corpo do jesuíta - introdutor do gado no Rio Grande do Sul - foi jogado nas águas de uma fonte, que teria ficado azul, dando origem ao nome. Considerada milagrosa, a fonte é buscada até hoje para cura e obtenção de várias graças. Já a poesia de Juvelino é declamada até hoje nas festas da comunidade em Santa Lúcia.
ÁGUA AZUL
Por esses campos abertos, onde o Minuano canta
Existe uma água santa que o tempo jamais consome
Como filho dessa terra, falando a pura verdade,
eu digo com sinceridade, porque água azul tem esse nome
Por tempos que já vão longe, por culpa da natureza
Aqui nessas redondezas, onde o varzedo se expande
Aqui nessa mesma terra onde o sol me viu nascer
Há tempos veio morrer o primeiro tropeiro do Rio Grande
E assim conta a velha história, que numa tarde bem fria
De manso a chuva caia, sem pena e sem compaixão
E deixando o campo tristonho, sem saber, ela anunciava
Que dentre em pouco tombava, por relíquia, um coração
E foi por ali, bem por ali, onde o banhado faz costeira
Numa troteada ligeira vinha o padre muito contente
Porém do meio do mato que nada, nada se ouvia
De repente, uma gritaria fez rodeios ao inocente
Eram os índios Ibianguaras que o padre em silêncio escutava
E o chefe cacique gritava, com ódio e rancor aflito:
“Pegai e matai esse desgraçado!”
E com ódio escancarado, tombaram o pai querido
E julgando o padre morto, os covardes índios fugiram
Mas nem sequer pressentiram aquilo que aconteceu
Tendo a face estraçalhada, apesar de tantas flechadas
O padre não morreu
E a noite veio descendo, e o padre Cristóvão chorava
E tristonho reclamava: “Como é triste morrer na míngua”
E sem forças para andar, o corpo todo sangrando,
O padre foi se arrastando até dentro da restinga
No outro dia bem cedo, de novo os índios voltaram
Mas já não mais encontraram no local o prisioneiro
E seguiram rastros de sangue que por ele foi deixado
Pois encontraram o coitado que os contemplava faceiro
“Está vivo ainda?” - ouviu-se um eco sem piedade
E cheios de ódio e maldade, bateram sem compaixão
E não contentes com isso, procuraram outro jeito
Abriram-lhe o meio peito e lhe arrancaram o coração
E como fosse muito uma cova para o pobre do coitado
O corpo botaram de lado, nem fizeram sepultura
E o coração atiraram numa sanga que corria
E desde aquele triste dia a água ficou azul ventura
Padre Cristóvão morreu, hoje Água Azul está na história
No grande museu da glória do Rio Grande do Sul
Pois essa terra querida, que amando eu quero morrer
e morrendo eu quero dizer: bendita tu sejas Água Azul!
ROMARIAS
Conforme já destacado neste espaço, a primeira romaria ao local ocorreu em 1º de dezembro de 1940. A cerimônia foi conduzida pelo padre jesuíta Luiz Gonzaga Jaeger (1889-1963), que convidou o povo até o local onde foi realizada a leitura do martírio para cerca de 300 pessoas.
Já em maio de 1942, Jaeger inaugurou e benzeu a primeira capela na localidade, então denominada Água Azul - o templo foi dedicado a Jesus Crucificado, pois o padre até então era apenas mártir. Participaram da solenidade o Padre João Schiavo, juntamente com o colegiado e noviços de Fazenda Souza e cerca de 2,5 mil pessoas.
A atual, em alvenaria, foi inaugurada em 24 de abril de 1955 pelo padre Roque Castellano.