Além de mapear a trajetória da família, o livro Baú dos Cantelli é recheado de referências à cultura da imigração italiana. Entram aí desde costumes, receitas da mesa farta, provérbios e histórias infantis até brinquedos, rituais religiosos, utensílios domésticos e um glossário típico – que, não raro, despertam a memória afetiva e a imediata identificação dos leitores (leia mais abaixo).
Toda essa riqueza de detalhes é fruto não apenas de um minucioso trabalho de pesquisa e cômpito de lembranças pessoais, mas da paixão da autora Márcia Cantelli Dias por história e genealogia. Aliás, foi quando a tataraneta do pioneiro Joaquim Cantelli visitou pela segunda vez a comuna de Breganze, na província italiana de Vicenza, em 2018, que passado e presente se fundiram – literalmente.
Na terra de onde partiram, em 1881, o tataravô Joaquim e o bisavô Matteo, Márcia conheceu o descendente de ferreiros Bruno Tamiello e o Museu Del Maglio di Breganze, um dos mais importantes espaços de memória sobre as oficinas desse gênero na Europa.A visita rendeu um relato emocionante e uma das mais belas imagens daquele dia, quando um raio de sol “quebrou” a escuridão da ferraria comandada pelos Tamiello desde 1795 (abaixo).
“O signore Bruno inicia explicando que no Maglio tudo se manteve original. Diz que aí se tem a sensação de fazer um tuffo (mergulho) no passado. É preciso manter viva a alma do museu. Ele para à frente de uma parede repleta de ferramentas, estende o braço e pega um papelzinho que está pendurado junto a uma delas e diz: ‘Un particolare. Questa è una ripazione (um conserto). Il fabro é morto ed è morto anche quello que l’ avera portata a ripare. Così diventa parte della storia (o ferreiro morreu e morreu também aquele que levou a ferramenta para a o conserto. Assim torna-se parte da história).”
Próximos à ferramenta que nunca foi buscada repousavam também diversos outros maquinários, documentos, cadernetas, um carrinho de madeira para fazer compras, partituras de instrumentos musicais e até moldes para as primeiras máquinas de gelo – um acervo alusivo ao trabalho secular dos artesãos do clã Tamiello.
“Um lugar de memória, seja por meio dos instrumentos preservados, das memórias transmitidas de uma geração a outra e dos arquivos familiares organizados com disciplina e afinco. Dá vontade de não sair de lá”, testemunhou Márcia em 2018, um ano antes do lançamento do livro por aqui.
Utensílios e costumes
Assim como as memórias preservadas no Maglio di Breganze (citadas acima), diversos capítulos do livro Baú dos Cantelli evocam o cotidiano da família ao longo do século 20, com tarefas, utensílios e costumes devidamente contextualizados pela autora.
Intercalados às lembranças de Márcia “aparecem” o ferro à brasa e o ferrinho de engomar; a palha de trigo extra deixada pela “nonna” Carolina para quando as alças da sporta (cesta) se rompessem; e até o velho rádio de madeira Fiesta, indispensável para o pai Matheus escutar as modas de viola da dupla Tonico e Tinoco.
Entram nesse rol também os bordados em vagonite, a feitura do grostoli e do fregolá, a fabricação da graspa, o jogo de tômbola (bingo), a vanuia – caixa de madeira onde a mãe Dilza “impastava” o pão – e a cama de ferro dos avós Timóteo e Carolina Cantelli, raridade da família desde o casamento dos “nonnos”, em 17 janeiro de 1920. Aliás,é das bodas de ouro do casal, em janeiro de 1970, a foto que abre a matéria, com a devida identificação dos filhos, genros, noras, netos e bisnetos.
Sentados à frente estão os netos Gilceu Cantelli e Marinês Cantelli, Fátima Antônia Pasa, Rejane Cantelli, Márcia Gladis Cantelli (a autora do livro da família, de óculos) e Sirlei Comiotto. Junto aos avós Timóteo Joaquim Cantelli e Carolina Simionato Cantelli, o bisneto Jorge Cantelli Madalosso.
Da esquerda para a direita, Matheus Cantelli e Dilza Baú Cantelli com Marilúcia Cantelli “na barriga”; Ivo Reck e Rosali Cantelli. Na sequência, Vitalis Cantelli, Marlene Terezinha Cantelli, Fernando Antônio Pasa, Adelar Cantelli, Avelino Pasa e Maria Cantelli Pasa; Dileta Cantelli Comiotto e Severino Comiotto; Maria Pandolfo Cantelli e Hermenegildo Cantelli; e, por fim, à direita, o casal Dulce Cantelli Madalosso e Alceu Madalosso – com a filha Rosângela Madalosso (bisneta de Timóteo e Carolina).
Como adquirir
O livro pode ser adquirido pelo e-mail marcia.cantelli@gmail.com e em diversos endereços dos Caminhos de Pedra, em Bento Gonçalves, como a Pousada Cantelli, a Cantina Salvati & Sirena, o Restaurante Nona Ludia e a Ferraria Ferri. Também na Escola São Pelegrino (Rua Coronel Flores, 525), em Caxias. O valor é R$ 50.