Mulher negra, mãe da Pilar e jornalista. Nascida em Goiás, mal sabe se aprendeu primeiro a escrever ou a falar, mas sabe que desde que aprendeu ambas as funções, nunca mais parou. Gosta de ver as estações do ano mudarem e, por este motivo, escolheu Caxias do Sul para viver. Escreve sobre as dores e alegrias de ser gente e só.

Crônica
Opinião

Uma mulher que não quebra

Ela sabe que recomeçar não é privilégio, é sobrevivência. A queda pode ser feia, mas levantar-se sempre lhe cai bem

Sandra Cecília Peradelles

Enviar email

Ela aprendeu. E se você me permite, aprenda também. Porque o tempo, esse mestre cruel e certeiro, não dá escolha: ou você se dobra ou se quebra. E ela, que já caiu tantas vezes, decidiu ser como bambu: dança ao vento, mas nunca se parte.

A mulher-mãe-trabalhadora, essa que atravessa ruas com a conta no vermelho e a cabeça fervilhando de prazos e responsabilidades, não teme tempestades. Já viveu furacões. Já perdeu o amor, o sono, a paciência e até a esperança por um breve segundo. Mas o tempo, que lhe bate à porta com boletos e cobranças, também ensina que tudo passa. E se tudo passa, nada pode segurá-la para sempre no mesmo lugar.

Ela sabe que recomeçar não é privilégio, é sobrevivência. A queda pode ser feia, mas levantar-se sempre lhe cai bem. O que um dia foi tragédia, amanhã será só lembrança. Como na canção de João Bosco O bêbado e a equilibrista onde a esperança dança na corda bamba de sombrinha, ela também segue. E quando tudo pesa demais, ela encontra refúgio na música, no livro esquecido na cabeceira, no olhar cúmplice de um filho. Entre um café requentado e um ônibus lotado, a vida acontece.

Seus desafios são muitos: a cria que precisa de atenção, o chefe que exige resultados, o coração que ainda acredita no amor, mas teme outra decepção. Ela sente, ela cansa, ela quer parar. Mas não para. Porque quem já sobreviveu a tanta coisa não morre de susto. Aprende a jogar com a sorte e com a mente, treinando o pensamento para não sucumbir à dureza dos dias.

O tempo lhe ensinou que chorar não paga conta, que sofrer não adianta, que esperar não resolve. Então ela age. Move-se, nem sempre com vontade, mas com disciplina. Há momentos em que os sonhos parecem distantes, mas ela aprendeu que persistência é mágica disfarçada de teimosia. Como escreveu Cora Coralina, “Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir.” E ela decide, todo dia, seguir em frente.

Ela compreende que ser forte não significa não sentir. Significa continuar apesar do medo, apesar da exaustão. Significa permitir-se uma pausa, mas jamais uma desistência. A vida pode ser implacável, mas ela aprendeu que dentro dela há uma força silenciosa que a empurra sempre um passo além, mesmo quando pensa que não consegue mais. Não é sorte, é resistência.

E você, que me lê agora, já percebeu como a vida tem sua ironia? Como a gente insiste em se preocupar com o que já superou? Quantas vezes achou que não ia conseguir, e conseguiu? Quantas vezes pensou que era o fim, mas era só um capítulo a mais? A verdade, minha cara, é que o mundo pode até tentar dobrá-la, mas você já provou que não se quebra. Então vá, siga. E que nunca lhe falte música, café forte e um pouco de ilusão para fazer da realidade um lugar habitável.

Leia mais crônicas de Sandra Cecília

GZH faz parte do The Trust Project
Saiba Mais
RBS BRAND STUDIO

Vitrola

00:30 - 02:00