As ruas são largas e sem fim. As vistas não alcançam o horizonte, parece não ter chegada essa corrida. Faz tanto tempo que dei a largada, carrego a nítida impressão que foi ontem que ouvi aquele tiro estampido, surdo, avisando: vai, corre, a vida é lá na frente. Desde então, corro em disparada para não sei onde. Às vezes até penso que cheguei ao destino. Delírio! O destino, aparentemente, é o próprio caminho.
Antes que sua interpretação descambe pr'um lado de equívoco quanto ao meu pensamento, informo que não estou perdida, estou fazendo uma travessia desconhecida, e é bem diferente esses dois pontos da análise. Em suma, estou saindo para chegar. Parece simplória a reflexão, mas na realidade é profunda demais.
Minha confusão ao deslizar meus pés sobre a terra que nunca estive se deve a minha necessidade de querer ter controle sobre o que não depende de mim. É extremamente desgastante ter dois caminhos e não ter ciência de por qual se deve, de fato, seguir. Não sou mulher de contar com a sorte, mas estive/ estou a mercê dela como todo o mundo.
Se eu pudesse somente contar comigo, que fácil seria. Dores e benesses que me coubessem seriam minhas por direito e da conta de mais ninguém. Eu poderia chorar ou rir na minha medida. E, se em queda, levantar, curar minhas próprias feridas e seguir.
Acontece, que a realidade não é assim, somos interdependentes e sendo coletivos somos únicos. Na teoria, compreendo. Na prática, sofro. A vida não é um organograma que construo com metas, meios e tempo de execução. Onde finalizada a atividade, fecho com marcador de texto fluorescente e passo para a próxima.
Esse método é a minha grande ilusão de controle, a ilusão que me faz bem, acomoda meu espírito dentro do corpo de luta. Acalma a ansiedade e faz com que eu viva em paz com meu ser astral capricorniano modelo.
Quase todo o universo que me cerca não me dá chances mínimas de controle. Eu sei, já tentei (risos nervosos). Os dias, as noites, a pandemia, a previsão do tempo, a alta do dólar. Nada disso tem a ver comigo, eu apenas lido da melhor forma que consigo. Meu amor, minha filha, meus amigos. Essa tríade eu escolhi nunca intervir com minhas baboseiras militares. Quero-os fluídos, volantes e sem meu excesso de terra.
Estou acostumada com uma vida excessivamente dura. Ao me programar para algo, costumo prever as dores de seu desenvolvimento. Isso tira um tanto da mágica que está no porvir, mas é quase inevitável.
Passo os dias buscando melhorar como pessoa, me corrigir para ser merecedora do sopro de vida que me foi concedido. Eu só devia viver em plenitude, contemplar o universo e ser parte do todo. Eu acho lindo quem tem o dom da contemplação, mas me falta paciência para tal.
Sofro do mal da funcionalidade. Quero me curar, estou exausta de ser tão útil. Os últimos anos vivi para me autoconhecer, foi tanto tempo dispensado a isso que começo a me desconhecer. Bati no teto, não rola mais aprendizado, vou voltar para a terapia.