Solidão, pode entrar, aceita um café? Puxa uma cadeira, senta aqui, segura a minha mão, vamos conversar. Forcei a convivência, aceitei sua presença, não mascarei a dor de tê-la ali. Foi assim que eu e a solidão ficamos amigas.
Pode parecer não ter muita graça sentar-se sozinha numa mesa com seis cadeiras, tomar um vinho e servir um jantar bem elaborado para si. De fato, não tem. Entre tantas cadeiras, escolho um lugar, sento sem rir, abro a garrafa sem auxílio de ninguém, escolho uma música e janto. Nos primeiros minutos sinto um tanto de angústia ao ver as cinco cadeiras vagas, daí percebo que na verdade não há vazio ali, elas estão preenchidas por toda a vida que emana das minhas memórias.
Eu não quero falar sobre solitude, a coisa plena e feliz de se estar consigo mesma. Ainda não estou evoluída o suficiente, não cheguei lá. Quero falar de se estar só e sofrendo por algo que se perdeu e aceitar isso com naturalidade, olhando para a situação como pessoa adulta, entendendo firmemente que só vai parar de doer, depois que doer muito.
Enquanto dói, vivo minha rotina sem culpa, sem fingir que está tudo bem. Tenho observado meu comportamento diante disso, e, tenho observado também como tudo se comporta ao meu redor.
Enquanto me banho, observo a água passeando sobre minha pele, ansiando para que ela leve e lave a dureza dos dias e meu excesso de passado.
Escorro do banheiro à cama, caminhando na penumbra meio entregue a uma sensação de vazio. Eis que me dou conta que o vazio talvez seja melhor do que todo aquele sentimento que carreguei pesarosamente no peito até ontem.
Deitada, a coberta começa a aquecer meu corpo, agora ele é o elo entre a coberta e o lençol de cetim o qual minha existência desliza, já tenho 34 anos de respirar. Preciso seguir, sigo.
Tenho dormido tarde e acordado muito cedo, mal o sol nasce e eu pulo ligeira da cama. Ontem, por exemplo, o dia amanheceu e eu vi pelas frestas da cortina cambaleante, a noite veio e eu mal me dei conta. Não sei onde foi parar todo aquele sono que eu tinha às 10h da manhã, aquela vontade incontrolável de ficar vagarosa na cama.
Entremeio à minha rotina capricorniana de programar, organizar, agilizar, concretizar, tenho me adaptado bem à solidão e à dor dessa passagem. Criei mínimos costumes que me distanciam do que eu era antes delas chegarem. Preencho meus iniciares de dias com funções e aflições da vida adulta, tomando cafés incrivelmente longos, botando roupas na máquina de lavar, dando água para as plantas, nutrindo corpo e alma com histórias tristes, poemas e músicas de fossa.
Eu sei que tudo vai passar, porque passa, mas agora esse incômodo está aqui e eu vou vivê-lo intimamente, há que se deixar doer até não doer mais.