Quando eu era criança e saía para caminhar na rua, minha mãe sempre me dava a mão e fazia questão de que eu ficasse do lado de dentro da calçada. Nunca entendi se era superstição ou alguma regra do mundo dos adultos que eu só descobriria anos mais tarde, mas sempre obedeci. E realmente foi isso que aconteceu: já mais velho, consegui compreender a lógica que resume muito bem o que significa o amor de mãe: “se um carro descontrolado avançar sobre nós, ele vai me atingir primeiro”, disse a minha.
Já era adolescente quando escutei aquilo, então achei puro egoísmo. É claro que não deve ser assim! Retruquei: “mãe, se tem alguém aqui que deve cuidar do outro sou eu de você, porque eu não saberia fazer muita coisa sem você aqui... Eu ainda não tive tempo para aprender tudo.” Não sei se cheguei a dizer a frase por completo, mas tenho certeza de que a ideia foi exatamente essa.
Só tive mais noção de como o amor de mãe é tão surreal quando andamos de avião e minha mãe riu das instruções da aeromoça – “em caso de despressurização da cabine, primeiro coloque a sua máscara de oxigênio e depois ajude crianças e pessoas com dificuldade”. Para mim pareceu óbvio, mas para ela não. “Filho, é claro que primeiro eu colocaria a sua máscara para te salvar e só depois a minha”, explicou mais uma vez. E nem adiantou bater boca para mostrar que os dois teriam um fim trágico dessa forma, já que a gente só consegue ajudar o outro depois de cuidar de si. Fiquei então imaginando o caos que seria: nós dois brigando enquanto a aeronave cai, disputando para ver quem coloca primeiro a máscara de oxigênio... Em mim.
Essa necessidade de ver o filho feliz é uma particularidade do mundo das mães que eu nunca vou poder entender. Sendo assim, não cabe a mim questionar. No último final de semana, um coração de mãe pulsou tão forte que, depois de ver a filha feliz ao realizar um sonho de vida, sentiu que enfim poderia descansar. Apesar da dor, querer entender por que a dona Maria de Lourdes Mallmann partiu fora de hora não faz sentido, já que até a morte em si nem sempre faz. E talvez seja sobre isso: o amor de mãe de fato não faz sentido – mas com certeza vai ser sentido para sempre.
Podemos não ter aprendido tudo, podemos acreditar que foi cedo demais (sempre iremos), mas os exemplos existiram e as memórias permanecerão, tal qual o amor. E ali na frente, ao sermos coroados com a felicidade de sermos pais e mães, manteremos o legado: será a nossa vez de andar no lado de fora da calçada. E ao sentir a mão dos nossos filhos enroscada na nossa, lembraremos de nossas mães como uma rainha, soberana na missão de ser eternamente nossa guardiã, independente por qual calçada andarmos.
Dedicado a Bruna, Kamila e Patrícia, as princesas de Maria de Lourdes Mallmann.