Vixe Maria! Será que o recente eclipse solar em Escorpião, ativando o belicoso Marte no mapa do Brasil, vai jogar ainda mais lenha na fogueira ideológica que consome a nação? Eclodirão de vez os ovos de serpente há tempos chocados? Quem suporta mais fanatismo e violência? E como sair desse desvio de desumanidade que empurra ao abismo o tal país do futuro?
Espio a Lua natal do Brasil, conjunta a Júpiter em Gêmeos. Ela representa o povo, agora entrincheirado em lados opostos por obra e graça de políticas de ódio, mas em essência um povo criativo, sincrético e dado a diálogos e parcerias. Diante do rastro deixado por convicções que destruíram amizades e cortaram até mesmo laços de sangue, urge buscar na memória registros de quando a união brilhou em arte e beleza. A união é escudo contra o mal.
Ah, as duplas brasileiras! Falo das legítimas, surgidas por uma magia natural, constantes ou ocasionais, e não das falsificações mercadológicas que pipocam por aí. Quero louvar quem construiu pontes, e não os genéricos oportunistas.
Ariano Suassuna, que era geminiano, juntou na imaginação Chicó com João Grilo. Dois pobres magrelos nordestinos, mas cheios de graça e esperteza. Deu um caldo que fez o Brasil espelhar-se e rir de si mesmo. Não sei como o Ariano fez isso, só sei que foi assim.
Falando em graça natural, preciso rever algum vídeo que mostre em campo a dupla Garrincha e Pelé. O que esse dois fizeram com a bola, meu Deus! Sem eles, não haveria o mito (ora combalido) do país do futebol, nem haveria as primeiras vitórias nas copas, que deram orgulho ao Brasil. E os dois vieram do povo, prontos, geniais.
Quero lembrar de Vinicius e Toquinho, o poeta maduro e o jovem violonista. Senhor meu, quanta lindeza saiu daquela parceria! Apesar dos tempos ásperos da ditadura, o Brasil cantou em coro o amor, na leveza de quem bebe um chope numa mesa de bar, entre amigos, quantos amigos. Cadê aquela delicadeza, Brasil?
E quero para já o dueto de Bethânia e Gal cantando Sonho Meu, o samba de Dona Ivone Lara. “Vai buscar quem mora longe, sonho meu”. A gente prezava o encontro, não o muro das oposições. E amava a mistura certa do grave de Bethânia com o suave de Gal. Tempero brasileiro é assim: diferenças que valorizam cada ingrediente.
Preciso ouvir de novo, como quem toma um remédio para dor, Gonzagão e Milton Nascimento na clássica Luar do Sertão. Eis o Brasil profundo, interiorano. Carecemos demais de resgatar esse encanto poético pela terra, pelo país. Porque o Brasil não é o que andam fazendo com ele. Não é mesmo.
Careço de rever alguma novela com Tarcísio e Glória em par romântico. Que falta daquela educação sentimental tingida por alguma ingenuidade e muita confiança. Se houvesse problemas e separações, tudo haveria de se resolver no final, bastava ter fé. Ok, a realidade não é assim, mas a gente sonhava. E sonhar cura.
E vou adiante na memória do poder criador do meu país quando expressa seu dom de misturar-se. E evoco Oscarito e Grande Otelo, Roberto e Erasmo, Raul Seixas e Paulo Coelho, Niemeyer e Burle Marx, Marina Lima e Antônio Cícero e tantos encontros faiscantes de grandeza. E penso nos trios, nos quartetos, nos times de várzea, em grupos cada vez maiores, até caber o povo todo em minha imaginação, unido por um respeito amoroso que precisa ser reativado.
Nosso passado alerta o presente: só prosperamos quando nos unimos. De mãos dadas, ou abraçados, ninguém empunha armas. Porque não precisa.