Vou ensinar algo revolucionário, que pode mudar a vida de muitos. É relativamente simples, só exige um pequeno treino para descondicionar a mente. É o seguinte: se alguém faz a narrativa de uma determinada situação, referindo-se aos seus sentimentos, evite, a todo custo, responder com a frase: “E comigo, então!” Tem sido um comportamento padrão, reforçado pela necessidade de nos colocarmos em primeiro plano. Será que em tempos idos os seres humanos tinham a tendência a se sobrepor à fala dos outros com uma autorreferência? É notório o aumento exponencial nos últimos anos. Talvez motivado pela incapacidade de ouvir a exposição de dores e alegrias alheias. Chega a ser quase divertido de se observar. A impressão é a de que o interlocutor deixa de absorver o que está sendo dito. Ele simplesmente aproveita o hiato na explanação para garimpar, em si, uma situação de maior relevo, segundo sua perspectiva individual, evidenciando ser mais desafortunado ou privilegiado do que o ser diante dele.
Orgulho-me de raramente cometer esse pecadilho. Porém, isso demanda treinamento e atenção redobrada ao me predispor a estar em estado de atenção frente a algum relato de amigo ou colega. Tudo é uma questão de costume. O bom e velho hábito sendo processado no cérebro até se tornar natural. É uma vitória sobre si mesmo. O resultado é não nos julgarmos tão indispensáveis a ponto de entronizar o Eu como senhor absoluto nas conversas. O escritor Rubem Alves, com sua típica sensibilidade, disse sermos mestres na arte da oratória, mas péssimos na escutatória. Uma constatação certeira em relação aos que se consideram o centro do mundo. E, se não nos mantivermos diligentes, reforçará uma tendência dessa época, mestra em aviltar o sentido da palavra acolhimento. Medir o tamanho da sensibilidade alheia com a nossa é matar a possibilidade de uma conexão profunda.
Ao fazer uma observação pessoal queremos expressar algo relevante para nós, claro. É uma espécie de alívio temporário partilhar fatos ou emoções. A verdadeira tarefa é a de simplesmente acolher. Devemos nos furtar de colocar em evidência episódios ou características a nosso respeito. Exemplo banal, mas elucidativo. Se afirmarem: estou com dor no ouvido, evite contrapor: e eu no joelho esquerdo. Ao acontecer isso, vale a pena ficar atento, pois na maioria das vezes é um reflexo involuntário, por assim dizer. Penso ser indispensável enfatizar esse ponto como um ato de consideração. É uma prática saudável que tende a refinar o contato entre os seres. Afinal, todos precisam se sentir abraçados, com o olhar ou com gestos de afeto.
Aos poucos, podemos aprender tal comportamento até encontrar uma maneira adequada de agir. Praticaremos a generosidade, aptos a perceber a importância de dividir o protagonismo.
Fico aqui na expectativa desta reflexão não ter relação alguma com o seu jeito de ser e agir. Que ótimo se eu estiver pregando para convertidos. Esta reflexão cairá no deserto - é meu desejo mais sincero.