Este texto não está baseado no livro O Príncipe, de Maquiavel. É fruto da observação direta deste modesto escriba. Estava eu, ainda ontem, conversando com uma mulher que comumente me desperta sentimentos ruins. Tenho enorme dificuldade em lidar com os arrogantes. Nunca o fui e me parece um desperdício de tempo a convivência com eles. Contudo, tantas vezes as circunstâncias nos colocam frente a frente e nada podemos fazer além de ouvi-los. Com os dentes rilhando, confesso. Tenho a nítida sensação de perder preciosas horas. Entretanto, como tenho um pendor para refletir, coloquei-me a seguinte questão: podemos obter algo com pessoas pelas quais nutrimos emoções negativas? Bastante. Pensei em usar o termo inimigos, como no título. Todavia, vou suavizar.
Passar os dias com quem endossa nossas opiniões e não nos desafia ao asseverar sempre a mesma perspectiva sobre o mundo é cômodo, no entanto, sem efeito de aprendizado. Deixa de contribuir para a ampliação da consciência. Passamos a pensar: fulano é tudo o que desejo evitar ser. Sabe um exercício pelo avesso? O anti exemplo nos sugerindo seguir o itinerário contrário.
No início da adolescência, frequentava assiduamente a casa de um colega de faculdade. O pai, homem sisudo e de poucas palavras, implicava quando íamos jantar fora, dizendo: “Tem comida de sobra aqui!” Nesta idade, nem é o alimento posto à frente de nós que importa, só o impulso de sair e estar em lugares diversos, entrar em contato com outras gentes, etc. Ficava irritado com aquilo, pois sequer dependíamos financeiramente da criatura. Pode parecer uma situação prosaica, mas comecei a firmar a ideia de ser, quando adulto, o oposto dele.
Como estava cursando filosofia, encontrei terreno fértil para fortalecer essa convicção. Hoje respiro fundo e permaneço calmo diante de alguém, vamos dizer, chato. E aqui não me coloco em posição de superioridade. Somente ancoro as minhas escolhas a partir de uma maturidade colhida através da leitura e da atenção do que acontece ao redor.
Existir é bem mais do que cumprir um ciclo biológico. É ter a capacidade de fazer escolhas sensatas, ser humilde e continuar a internalizá-las constantemente. Porém, convenhamos, tantos se deleitam em manter a pose de sabedores natos! Acho bem cansativo. Talvez precise ter um espírito cristão e tolerar. Por enquanto, saboreio essas lições, transformando-as em algo positivo. Evito confrontos, pois detesto brigar. Então, a melhor forma de lidar com isso é amparar-me no meu lado pragmático e dizer: está bem. Platão já nos advertiu: quem pratica o mal é por ignorar o caminho da justiça, da ética e das virtudes.
E assim vamos transmutando todas as experiências em uma rica possibilidade de crescimento interior. Como disse um amigo: a vida é curta, mas é larga. Há muito o que conhecer e a estrada pode ser íngreme e valiosa. Lembro do que sentenciou, em anos longínquos, um professor de lógica: “Os homens irracionais não buscam a verdade, apenas os fatos, distorcidos a seu favor.” Você concorda?