Gosto muito de ficar sozinho. Gosto muito de estar com as pessoas. Acredite, as duas afirmações não se contradizem. É característico do ser humano surpreender-se neste movimento pendular. O desejo de se apartar dos grupos faz parte da nossa condição, pois nos permite estabelecer uma conexão com a realidade subjetiva e os anseios mais íntimos. Entretanto, a presença alheia é uma rica experiência a que devemos aspirar. Precisamos nos vincular aos seres para ter perspectivas variadas. Reafirmar as mesmas crenças com veemência é limitador; melhor é absorver conceitos diversos para obter novas visões sobre o que é essencial para conduzir de modo saudável os relacionamentos.
Como tecer toda uma existência de pura exterioridade? Gerenciar os dias somente sob o ponto de vista de um tempo destinado a se esgotar, seguindo os ditames da biologia — nascer, crescer e morrer? Sinto imensa dificuldade em imaginar como vivem os ocupados unicamente em realizar tarefas, sempre cercados pelos outros, fugindo de si. Nada a esperar, no sentido do crescimento interior, se não nos examinarmos, cumprindo repetidamente o papel de executores de atividades. É na quietude do quarto que fazemos descobertas importantes. Meditar, refletir, ponderar, constituem-se em exercícios de aprimoramento da alma. Conversar consigo é um diálogo frutífero, terreno fértil onde depositamos as sementes para futuras colheitas. Porém, a tendência é fugir desses momentos de intimidade, pois podemos nos deparar com sentimentos desconfortáveis. Mas não há mudanças significativas se obedecermos só aos ditames do universo da ação, do trabalho. Há prazer maior do que permanecer em escolhido isolamento para ler, escutar música ou simplesmente contemplar?
Agora, não nos privemos da felicidade de usufruir do contato com amigos, tecendo relações com próximos e desconhecidos. Encerrar-se em si demasiadamente é ver tudo por um único ângulo, alimentando-se de certezas absolutas. Para mim é difícil recusar um convite para bons encontros. Penso: e se surgir hoje a oportunidade de conhecer quem vá me ensinar algo relevante? É desafiador também, pois pressupõe o acolhimento de uma ótica diferente em relação a tantas coisas. Então eu vou, sabendo da possibilidade de eventualmente me frustrar. O antídoto para essas situações é mesclá-las à solidão, como um plácido rio a correr entre a paisagem das gentes.
Sou grato por manter essa visão que nada exclui. Penso em imagens de deserto para apaziguar meu espírito em instâncias de excessiva proximidade com os demais. Entretanto, logo sou tomado pelo impulso de ouvir alguém, como uma fonte para saciar a sede. Necessito do silêncio e das vozes. Caminho tranquilo dentro de mim. E adoro quando me dizem: vamos?
Quero o cenário do mundo e a doçura da minha própria companhia.