Há os que se vangloriam de guardar ressentimento por outra pessoa durante anos a fio. Alimentam-se dessa raiva como uma espécie de troféu, considerando tal comportamento um ato digno de admiração. Ignoram o elementar: envenenam o próprio ser, sobrecarregando-o com emoções negativas. Mas, ao contrário dos que assim creem, a grande tarefa é esquecer. Penso a respeito disso ao rever mentalmente uma cena da série Silo, distopia apresentando um mundo pós-apocalíptico, onde os sobreviventes ficam presos em uma área restrita, com medo de voltar a caminhar pelos espaços abertos do planeta, agora contaminados com ar letal. Dentro dessa nova e obscura realidade, os líderes resolvem comemorar, anualmente, o dia do perdão. Na data marcada, todos se esforçam para tornar o rancor menos violento para a alma. Abraçam-se e se propõem a desconsiderar o que tanto pesava em seu interior. Talvez nunca cheguemos a criar efeméride parecida, mas pensar nisso como um exercício de libertação já é relevante. Faço este convite a você e a mim, nesta época permeada de escassos valores.
Ao transformar pequenos agravos em mágoas gigantescas, estamos colocando sobre os ombros um peso gigantesco. Viver é habitar a imperfeição. Compreender isto leva à prática da tolerância, um preceito essencial para estabelecer relacionamentos saudáveis. Hoje podemos ser vítimas de palavras ásperas ou atos condenáveis pelo olhar de alguém. Logo adiante, inadvertida ou precipitadamente, quiçá sejamos nós os agentes a cometer tal “infração”. É fácil perder o controle e proferir duras sentenças, das quais provavelmente sentiremos arrependimento. Ou não. Nosso ego, sempre de prontidão, nos instiga a fomentar a chama da vaidade, evitando a experiência da humildade. Um sentimento profundamente religioso — ela nos permite uma conexão profunda com os demais.
Perdoar é um ato catártico, que conforta. E, convenhamos, tem mais a ver com o ofensor do que com o ofendido. Embora cause fraturas em ambos. De minha parte, tenho procurado, como uma espécie de exame espiritual, afastar-me de todo tipo de confronto. Já coleciono diversas atitudes das quais me orgulho. Sugiro conversar sobre o conflito com quem está envolvido. Normalmente tudo se resolve de maneira simples, sem exaustivos enfrentamentos, para em seguida sermos inundados pela sensação de alívio e resgate de algo fundamental: a capacidade de esmagar a falsa impressão de superioridade.
Comece por quem desperta em você uma lembrança ruim, decorrente de alguma desavença. E, com sinceridade, pergunte a si mesmo o que existe de bom em manter vivo um propósito de vingança tão nefasto. Tenha presente: é uma benção não alimentar semelhante postura. Uma tempestade haverá de ser sucedida por uma brisa mansa.
Crie um calendário interno e não economize em instituir vários feriados do gênero. O resultado será a multiplicação do seu bem-estar.