Em meio a uma conversa, a amiga me diz: “O veneno só mata se for engolido.” Passei algum tempo pensando nisso para depois concluir: na medida do possível, estou protegido desse tipo de intoxicação. Ele pode não te destruir (metaforicamente), mas por vezes te priva de boas experiências. Exemplificando: quantas pessoas reclamam dia e noite, afirmando estarmos vivendo uma época horrível, sem valores e tal. Porém, ficam paradas ou absorvendo passivamente o conteúdo oferecido. Vamos aos exemplos, pois são ilustrativos na tradução dessa ideia. Todo mundo passa horas nas redes sociais e no whatsapp. Sim, mas há a necessidade se ser assim conosco? Aqui entra algo fundamental para se apropriar outra vez da vontade, da escolha: a disciplina e a investigação criteriosa do que nos torna verdadeiramente felizes. É mais fácil falar: eu sou assim, fazer o quê! Implica em não promover movimento algum, como se nosso destino fosse o de seguirmos até o último dia engessados em comportamentos aprendidos através do senso comum. É redutor pensar dessa forma. Se for preciso, vá contra aquilo que se preconiza, se repete. Lembro de uma bela expressão de Goethe: Crie sua cidadela interior. Se tudo lhe parece ruim, haverá a possibilidade de dizer não, protegendo-se através de uma redoma invisível. Em outras palavras: o comando, a decisão ainda são seus.
E dizemos a toda hora dos amores levianos, superficiais, do escasso comprometimento! De fato, parece ser a modalidade a ditar a conduta da maioria dos jovens hoje. Agora, lembre-se: essa “norma” é uma referência estatística. Há quem prefira investir seriamente e se entregar de maneira visceral à construção da afetividade. Você, tem seguido o consenso ou dedicado o melhor tempo à pessoa que escolheu amar? Atravessar a vida ao lado de alguém é uma benção. A passagem dos anos potencializa as qualidades. É mais importante voltar o olhar para dentro de si. Se o vizinho ou primo resolveram sair por aí em busca de variedade, nada de errado, será a escolha deles. Permaneça a uma considerável distância e verá criticamente, sem se deixar contaminar. Demoramos demais a aprender isso, entretanto, é uma alegria imensa descobrir a própria identidade.
Tenho me esforçado na recusa dos venenos. Participo com curiosidade e interesse desse mundo volátil e deixo de lado a quantidade de opções ou se estou perdendo algo. Faço minha escolha e sigo fiel a ela. Resisto suavemente, sem vociferar contra a realidade - tão diversa de cinquenta, cem anos atrás. O diferente nos educa. Chego perto, mantendo um saudável afastamento para me sentir seguro. As respostas advêm de uma lenta investigação. O exterior, quando desprovido de análise, é um espelho refletindo imagens retorcidas. Por isso a dúvida tem sempre o seu lugar.
Ah, e nem tente se acostumar ao veneno ingerindo-o aos poucos. O efeito será igualmente letal.