No belíssimo filme Close, candidato da Bélgica ao Oscar 2023, vemos duas crianças (ou pré-adolescentes) correndo livremente numa propriedade rural repleta de campos de flores, inventando histórias e se divertindo. Ao final do dia, exaustos pelas múltiplas brincadeiras, pedem permissão aos pais para dormir no mesmo quarto. A relação de cumplicidade e carinho nutrido por eles se mostra latente e esse querer se revela fisicamente. Um repousa com a cabeça debruçada no peito do outro, dão-se as mãos, olham-se para demonstrar afeto, ternura. Estão na idade em que os códigos comportamentais estabelecidos e as inibições ainda não ocupam o lugar central da vida adulta. A escolha do diretor é nunca nomear o sentimento que os une: amizade, amor ou admiração. Aqui pouco importam as definições, mas o exercício de liberdade de pessoas descobrindo a si e ao mundo. Porém, vai surgindo um grande problema. Mesmo em sociedades liberais como a que estão inseridos, grassa o preconceito. Bastante discreto, mas ainda assim capaz de inibir os laços entre pessoas do mesmo sexo. Meninos? Nem pensar! A consequência da interdição será trágica e se verá ao longo do doloroso processo de amadurecimento.
Fiquei profundamente sensibilizado ao acompanhar essa trajetória e pensei no quão capazes somos de privar a nós e aos demais das potencialidades amorosas. Às mulheres, felizmente, é permitido tocar, dizer o quanto gostam umas das outras. A nós, não. O resultado é a criação de seres emocionalmente infantilizados, muitas vezes reprimidos e incapazes de romper a barreira que os impede de usufruir de um bem precioso: a intimidade. Trocamos isso pela agressividade e a violência - sempre mal disfarçadas. A consequência será o desamparo. Veja a forma como é dado o abraço dos homens: um aperto de mãos provocando certo desconforto ou até dor; tapas nas costas, de preferência acompanhados de xingamentos. Pronto: está assegurada a virilidade. Maneira bem estranha de defini-la, calcada na insegurança, deixando de lado a expressão do verdadeiro prazer do encontro. Passamos a vida distanciados, louvando atitudes responsáveis por doenças de toda ordem. Reprimir é torná-las mais latentes ainda. Nunca é saudável colocar barreiras diante do desejo (ele é definidor da condição humana) e a sua realização. Somos criados para nos manifestar secamente, distanciados do gesto e da palavra que nos conduzem à proximidade. Afinal, sob hipótese alguma deve-se deixar uma brecha gerando dúvida sobre a nossa sexualidade. Até quando isso fará parte do imaginário de tantos?
Somos coagidos a deixar de lado o jogo poético para sermos entronizados no áspero universo da masculinidade. A nostalgia do paraíso perdido costuma se tornar frequente depois dessa ruptura. Atravessaremos a existência procurando por algo que está dentro de nós. Bastaria deixar o medo de lado, mas... quem ousa pagar o preço?