O uso da linguagem para expressar o amor é valioso dentro da tradição ocidental. Dizer equivale à confirmação do sentimento. Mas, atente, quando se banaliza pode ser privado da intensidade, igualando-se a um prosaico “bom-dia, vou ao mercado, estou bem”. Posso estar sendo purista, mas o elevo à categoria do sagrado e como tal é preciso ter todo o cuidado para ele não resvalar na ordem das coisas comuns. Pense comigo: há algo de milagroso no fato de determinada pessoa nos escolher como uma espécie de destino para a sua vida. É transformador e pode redimensionar a maneira de ver e sentir o mundo. Deveríamos, então, envolvê-lo em tal zelo a ponto de se transformar no centro da existência. Não basta se manifestar em nós, é fundamental fazer constante vigília, pois a passagem do tempo costuma lhe corroer a força. Acima de tudo, torna-se pleno através das atitudes e do respeito recíprocos. Já convivi com casais que abusavam do eu te amo e, a uma observação mais atenta, percebia-se claramente a fina camada de rancor ou raiva em seus diálogos. Determinados elementos se mostram vitais para definir sua qualidade. Abaixo elencarei alguns, eventualmente diversos dos seus, mas vale a pena o exercício da reflexão.
Manter a admiração recíproca está no cerne e tonifica o universo íntimo quando dois seres se predispõem a morar juntos, enfrentando a repetição e os efeitos nefastos do cotidiano. Parece uma sugestão que flerta com a banalidade, mas acredito pertencer aos comportamentos essenciais para o sucesso da experiência. Somos inclinados a ignorar o que está à disposição e sem o aparente risco de perder. Acho bonito demais constatar que, depois de vários anos de convivência, ainda somos surpreendidos pelo ser amado com a certeza de sermos vistos com a doçura dos primeiros encontros. É uma arte a que poucos se dedicam, pois a segurança tantas vezes nos torna convictos da nossa importância para o outro.
É primordial continuar tendo prazer em conversar com quem está ao nosso lado dia após dia. E, naturalmente, ouvir com interesse os relatos feitos. Infelizmente, isso nem sempre acontece. Sentar ao lado e simplesmente ouvir, falar, partilhar. Não necessariamente escrutinando o desagradável, o incômodo, pois essas DRs permanentes podem ser negativas também. Se o desejo sexual arrefece ao longo dos anos, podemos manter vivo o gosto pela companhia, reafirmando o prazer de estar compartilhando. A pulsão erótica pode diminuir um tanto, mas em seu lugar entram novas pulsações. Hoje entendo perfeitamente o sentido da amizade permeando a maturidade afetiva.
A lista poderia se desdobrar. Porém, estas tarefas já são suficientes para nos ocupar bastante. Mostre em atos o seu querer, pois as palavras podem embalar descuidadamente o que talvez já deixou de existir