Sim, concordo com uma das máximas que circularam nas manifestações em frente a quartéis pelo país, que chegaram no domingo 8 de janeiro de forma violenta às sedes dos Três Poderes, em Brasília, depredando-as, e sendo utilizada essa máxima como argumento para atos antidemocráticos. "Supremo é o povo." Essa é a síntese maior da democracia. Verdadeira, portanto.
Ocorre que esse bordão foi bradado a plenos pulmões na frente da sede do Supremo Tribunal Federal, servindo de justificativa para sua depredação. Como se Supremo e povo fossem antagônicos. E não são.
Será preciso detalhar alguns elementos do funcionamento da democracia. O Supremo, como qualquer instituição pública, e o TSE, Tribunal Superior Eleitoral, por extensão, foram criados e são regulados pela representação democrática da sociedade, isto é, o povo, que estabelece regras para funcionamento, as chamadas "quatro linhas". Essas cortes têm funcionado balizadas por esse regramento, e há uma série de outras instituições na sociedade para fazer funcionar o que se chama de "sistema de pesos e contrapesos", para fiscalizar e conter excessos. O Supremo é um colegiado, são 11 ministros, 11 cabeças. Uma decisão monocrática acaba, na sequência, submetida ao colegiado. E as indicações dos ministros cumprem as regras democráticas estabelecidas. Governos eleitos indicam ministros, e a indicação é submetida ao Senado, que é a representação dos Estados e da sociedade. Todos os presidentes indicam, inclusive o presidente Jair Bolsonaro, que indicou dois ministros.
Outra questão relevante, um aspecto bastante elementar, trazida à tona pelo bordão "Supremo é o povo" é: qual povo? Deve ser "todo o povo", que teve o direito de votar – alguns abriram mão do direito, mas isso é com cada um – em eleições da qual não se tem notícia de fraude. Suprema não é apenas a "fatia do povo" que discorda da escolha soberana de "todo o povo", traduzida pela voz das urnas. Supremo, sim, é o povo, todo o povo. Então, bradar que "Supremo é o povo" desconsiderando a "maioria do povo" não tem lógica: é desconsiderar quem pensa diferente, aliás, a maioria. Com que autoridade desconsiderar quem pensa diferente? É um atropelo e um desrespeito. Havendo fraude, muda de figura, mas não se tem indício e notícia. Não se trata de defender governo A ou B, por óbvio, mas sim a democracia. Vale para qualquer situação evidenciada dentro das quatro linhas, do regramento democrático estabelecido, a qualquer momento, quaisquer que sejam os autores e protagonistas.
Supremo é o povo, sim. Todo o povo, a voz do povo.