Já relembrei neste espaço o antológico comercial do jeans US Top. Em 1976, mais exatamente. "Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada, que você pode usar do jeito que quiser." Se você tem idade suficiente, digamos assim, certamente irá relembrar desse comercial. Comerciais, aliás, as boas peças publicitárias, têm o condão de evocar e remexer na memória afetiva. O do jeans US Top é um exemplo clássico. Imprimiu à condição de liberdade o toque da irreverência – e, de fato, irreverência tem a ver com liberdade –, sem adentrar no aspecto político do tema, bem mais explosivo naquele tempo. Mas transmitiu a mensagem. Liberdade era tema recorrente na época, e nem poderia ser diferente. Era um tempo de liberdades restritas pelo contexto histórico, nas artes, nos comportamentos, nas iniciativas e em todo o resto. Um estrago sem tamanho.
Parecia uma etapa vencida da civilização. Mas eis que estamos outra vez metidos nas discussões sobre liberdade. A liberdade tem sido defendida na Câmara por alguns vereadores em torno de questões como o direito de não usar máscaras ou de não ser tolhida a liberdade de ir e vir pelo passaporte vacinal. Paralelamente, o tema da ruptura institucional está presente no debate nacional. O assunto também foi trazido ao debate na Câmara de Caxias há cerca de 10 dias, sob pretexto de que poderes não se entendem e não se respeitam – em especial Judiciário e Executivo. Esse pretexto, logicamente, não justifica aventuras e rupturas. Ruptura institucional, esta sim suprime liberdades, pois decreta o naufrágio de instituições que foram criadas democraticamente pela sociedade organizada. E só a sociedade, por deliberações democráticas, pode revê-las e aperfeiçoá-las. Certamente quem defende liberdades, como alguns vereadores gostam de enfatizar, não deve ser simpático a rupturas, que atropelam liberdades. É bom pensar nisso.
Esta semana, a CIC (Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul) emitiu, por seu presidente, Celestino Loro, um eloquente manifesto pela liberdade de expressão. Fez muito bem em posicionar-se. "A ninguém é dado o direito de calar qualquer pessoa", discursou Loro. O presidente lamentou que a região esteja envolvida em episódios de intolerância, sem explicitá-los, mas eles são evidentes: o boicote a uma cooperativa vinícola por participar da entrega de cestas a pré-candidatos à Presidência e a pressão, que conseguiu seu intento, para barrar a visita do presidente do Supremo Tribunal Federal a Bento Gonçalves. Conviver com os diferentes pontos de vista, e não cancelá-los, eis a mensagem do presidente da CIC. "Pessoas inteligentes optam pelo uso de argumentos", desferiu ele.
Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada, e também a convivência civilizada com quem pensa diferente. Não é querer muito.