Ah, as cartas... Quem nunca esperou por uma não será capaz de dimensionar a ansiedade e a expectativa. Esperar por uma carta, cuidando a aproximação do carteiro, foi uma experiência marcante na vida de muita gente. Demorava dias, às vezes semanas para chegar, entre a postagem e o recebimento. Mas era o que havia para o momento. A carta perdeu importância após o advento do e-mail, das redes sociais, dos aplicativos de mensagens, a instantaneidade abriu caminho, pois o mundo tem pressa, mas certamente elas ainda sobrevivem entre os amantes da escrita e que valorizam a experiência de outra época. E, ainda, uma carta pode ser o que resta quando não há sinal de internet à mão...
Houve até um clássico dos Beatles, a inocente canção Please, Mr. Postman (1963), anos depois regravada pelos Carpenters, para traduzir a experiência. Por favor, senhor carteiro: “Wait just a minute, mister postman (Espere um minuto, senhor carteiro) / Please, Mr. Postman, look and see (Por favor, senhor carteiro, olhe e veja) / If there’s a letter, a letter for me” (Se há uma carta, uma carta para mim). Creiam, quem não viveu esse tempo: era assim a vida. Tempos mais vagarosos, nenhuma instantaneidade, nenhum sinal de mensagem pelo Whats, de transferência via Pix, sequer celular havia, mas certamente tempos muito glamourosos – o que não conflita com os benefícios instantâneos trazidos hoje pela tecnologia. Cada tempo com suas dificuldades e seu glamour.
As cartas persistem, porém. Persistiram ao longo do tempo, até hoje. Com outros propósitos, outros alcances, outras finalidades. Pois está aí a Carta às Brasileiras e aos Brasileiros, em defesa da democracia e do Estado Democrático de Direito, que se impôs como fato político nas últimas semanas. Busca formalizar, tornar claro e público o que se quer dizer. Tem um enorme significado político. Cartas sempre transmitiram recados. De amor, de interesse, de intenção de negócio, de valorização e de proteção da democracia. É o caso da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros, que carrega a peculiaridade de reunir mais de 1 milhão de assinaturas e um representação ampla e diversificada, que inclui empresários e trabalhadores, pobres e ricos, gente anônima e gente famosa, integrantes de diversos partidos. “Clamamos às brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições. No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários.” É um recado de parte significativa da sociedade.
Recados são dados de diversas formas, em lives, em discursos, e ainda por meio de cartas. Quando se diz que certas determinações do Poder Judiciário não serão respeitadas, se transmite um recado claro. A Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa da democracia transmite outro recado, igualmente claro. E assim vamos, entre um recado e outro. Em defesa da democracia.