Eslen Delanogare, doutor em Neurociências e fundador do canal Reservatório de Dopamina, recentemente abordou o grave problema das casas de apostas online. Ele trouxe uma perspectiva interessante: a popularização das tais “bets” só foi possível porque muitas barreiras que havia antes para uma pessoa poder apostar foram eliminadas graças à facilidade e ao imediatismo de usar os aplicativos de apostas no celular.
Antigamente, era necessário sair, ter dinheiro vivo em mãos (ou bens a pendurar numa casa de penhores), ir até um cassino, bingo ou banca de jogo ilegal e tentar sua sorte (ou, mais provavelmente, cair no colo do azar). Hoje bastam dois ou três cliques: conta bancária, cartão de crédito, oferta de empréstimo de banco estão diretamente no aplicativo sem precisar ir na agência, e assim os recursos para apostas infinitas se tornam acessíveis ali, praticamente sem barreiras físicas.
Este ponto da eliminação de uma barreira para facilitar um comportamento negativo pode ser observado em outras áreas da sociedade. Vamos considerar as atuais campanhas políticas: antigamente, custava muito caro imprimir santinhos e adesivos e fazer faixas e bandeiras. Hoje o material impresso está mais barato e polui visualmente nossas ruas a ponto de pegarmos ranço de candidaturas extremamente vistosas.
Além disso, as redes sociais e seus impulsionamentos fazem a mensagem dos candidatos chegar a milhares de pessoas com um único clique, com rapidez e baixo custo. Não precisa do aluguel de um estúdio, nem de equipamentos de gravação caríssimos, nem de uma equipe numerosa, o que no passado eram barreiras para produzir material eleitoral de áudio e vídeo. Hoje nem comício presencial é necessário porque muitos adotaram o que chamo de “comícios virtuais”, as tais lives, sem a barreira do “olho no olho” com os eleitores.
Hoje é extremamente fácil fazer lives, falar ao vivo no Instagram e no Facebook. A praticidade do uso dessas novas mídias na internet trouxe a falsa sensação de que se pode falar o que se quer e transmitir qualquer coisa sem consequências, e isso acabou respingando nos debates onde alguns candidatos só pensam nos “cortes lacradores” que serão depois publicados e repostados por seus seguidores.
O mesmo vale para as poucas caminhadas nas ruas e nos bairros com tudo cuidadosamente dirigido para capturar abraços ensaiados, enquanto políticos mal olham nos olhos das pessoas e as escutam: tudo é pensado na edição, na foto, no vídeo, no que vai promover mais “engajamento” nas redes. A realidade que se lasque. Não há barreiras para criar a realidade que se quer mostrar.
A internet virou uma zona de comentários maldosos e de frases de impacto intempestivas porque uma barreira foi eliminada. Se não vivêssemos na era do imediatismo, haveria tempo para refletir e analisar antes de publicar um texto ou um comentário ou de disparar mensagens no WhatsApp. Militantes e políticos se dariam conta de que existe um depois da campanha. Certas acusações e certas promessas jamais seriam feitas.
O tempo é sábio, coisa que muito candidato por aí não é.