Na última segunda-feira, no trecho da BR-116 entre São Marcos e Caxias do Sul, fui multada pela Polícia Rodoviária Federal. E não foi uma multa leve – na verdade, como me justificou o espirituoso policial rodoviário, “a senhora vai pagar somente pela infração que cometeu”. Justo, eu me senti culpada pela ultrapassagem indevida. Como cidadã, reconheci meu erro, doeu no bolso e aprendi a lição com a punição devida e justa que recebi por parte do Estado.
Alguns quilômetros adiante, ainda indignada comigo mesma e fazendo contas por causa do prejuízo que não estava no orçamento, avistei o paredão de pedra no Km 126 da BR-116, no começo da descida da serra. Como noticiado em julho do ano passado aqui no Pioneiro, rochas enormes, pesando toneladas, se despreenderam da encosta e caíram sobre o asfalto numa noite chuvosa. Por sorte, não houve vítimas.
Contudo, a pista ainda se encontra em péssimo estado, cheia de buracos, sem manutenção. Olhando para o paredão, parece que, a qualquer momento tudo pode desmoronar e cair novamente sobre a pista ou sobre algum veículo. Da próxima vez, pode ser que os motoristas que, como eu, trafegam por ali com frequência não contem com os anjos e com a sorte para escaparem ilesos.
Foi então que percebi o quanto essa balança “Candice versus o Estado” é totalmente injusta: eu tenho um rosto, um documento, um nome, uma identidade e sou punida pelo Estado quando cometo um erro. E o que acontece com essa entidade sem rosto, sem nome, esse amálgama de poder e de incompetência que nos governa, que só arrecada e quase nunca serve aos contribuintes como deveria? Quem responde pelo Estado quando ele é incompetente ou negligente, deixando de fazer a manutenção de uma estrada ou sendo omisso como na tragédia da Boate Kiss ocorrida há 10 anos?
Há um documentário chamado A Corporação (The Corporation, 2003) que apresenta a seguinte premissa: as corporações modernas, se fossem uma pessoa, um ser humano, teriam o perfil de um psicopata: demonstram um desrespeito imprudente pela segurança dos outros, falsidade, incapacidade de sentir culpa e muitas vezes fracassam em se conformar às normas sociais com relação a comportamentos éticos e de viver em harmonia com as pessoas ao seu redor. O exemplo recente do escândalo das Americanas – que prejudicou tanto pequenos acionistas quanto outras empresas com sua dívida bilionária – é o retrato perfeito de que ninguém realmente responde pelos erros de uma grande corporação, porque ela não tem um rosto, não tem uma identidade. Quem será realmente punido pelos prejuízos causados por quem se esconde atrás de uma pessoa jurídica?
O Estado quase sempre age da mesma forma que uma grande corporação: enquanto eu, cidadã e contribuinte, tenho um nome e uma identidade para responder pelos meus atos, o Estado, principalmente na esfera federal, é essa entidade amórfica, traiçoeira, que só cobra e nunca se doa, que só pune e nunca é devidamente punida pelos seus erros.