O governo do Estado e a empresa HyperloopTT assinaram em janeiro um acordo para promover o estudo inicial de viabilidade de operação de um trem ultrarrápido que permitiria fazer em 12 minutos a rota Porto Alegre–Serra.
Ricardo Penzin, CEO para América Latina da Hyperloop TT, teve várias passagens pelo Vale do Silício. Foi apoiador na elaboração das leis de incentivo à inovação brasileira. Foi head de inovação do Instituto Euvaldo Lodi para a região de São Paulo. Na pandemia, ele deixou a capital paulista para morar na Serra com a esposa, que é de Flores da Cunha. Em maio do ano passado, já esteve na CIC de Caxias apresentando um pouco mais do sistema de transporte baseado na tecnologia que consiste em uma cápsula que levita em tubos de vácuo com velocidade que pode atingir até 1.123 km/h.
A seguir, confira qual a expectativa para o empreendimento no Estado.
Na ocasião do acordo, a empresa destacou o papel protagonista da Serra Gaúcha em ser um dos principais destinos turísticos do país e também abrigar uma das maiores empresas do Brasil. Mas, por que o Rio Grande do Sul entrou na rota desta empresa que tem projetos mundiais?
Os sistemas de transportes mundiais, não só no Brasil, precisam de algum tipo de evolução, de amadurecimento do ponto de vista de atendimento das demandas modernas da humanidade. Os BRICS, países em desenvolvimento, tradicionalmente e historicamente, têm um gap de infraestrutura muito grande. Eles são a grande oportunidade para a logística, e, ao mesmo tempo, existe uma grande necessidade de melhoria de infraestrutura de transporte. Por isso, a gente está aqui no Brasil. E o Rio Grande do Sul, além de ter um governo aberto e de bastante interesse em novas tecnologias, tem um papel muito relevante no ponto de vista de América Latina, com uma referência portuária bastante significativa. Fez com que a gente escolhesse, por esses motivos, que seja o primeiro Estado do Brasil a fazer esse pré-estudo.
E eixo Rio-São Paulo?
Na verdade, nunca houve uma negociação para fazer um estudo de viabilidade Rio-São Paulo. É a maior demanda de transporte que temos no Brasil, o maior tráfego aéreo, maior rodovia, mas nunca houve de fato uma negociação efetiva com os dois governos para que esse estudo saísse do papel.
E o que prevê esse estudo de viabilidade aqui no Estado? Onde vocês já fizeram estudos semelhantes?
Fizemos em vários lugares do mundo, mas os principais são nos Emirados Árabes Unidos, onde vai ser o primeiro, e nos Estados Unidos, que vai ligar Chicago a Cleveland. Esses dois são os mais completos e os mais importantes que a gente já fez. E o que esse estudo levanta? A gente vai entender qual o traçado que essa rota vai fazer de Porto Alegre até a Serra, por onde esse traçado vai passar, se vai haver ou não paradas intermediárias durante o percursos. Por exemplo, vai ter uma estação em Gramado antes de chegar em Caxias do Sul? Como vai ser esse roteiro? Qual será o custo de obra, o retorno de investimento, o impacto na economia, a emissão de gás carbônico...
Só este estudo representa que investimento?
Tem um custo, mas é um custo que não tem investimento do governo. Estamos usando nossa equipe para fazer esse estudo e ver esses números no Brasil. E vamos, provar com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que tem uma credibilidade enorme, que o modal é válido, viável técnica e economicamente, e muito relevante . A gente está investindo o tempo dos nossos engenheiros e a universidade, da mesma forma, para que isso saia do papel.
Pela experiência nos outros países com trajetos de tamanho semelhante, qual o gasto estimado para o Rio Grande do Sul?
A gente está falando em um retorno de investimento, que é importante para o mundo da infraestrutura, de no máximo 20 anos. Se a gente pegar outros estudos que a gente fez pelo mundo, neste setor, 20 anos de investimento é quase um paraíso. Às vezes, falamos de retorno em 50, 60, 100 anos. A gente está falando de uma ordem de U$ 20 milhões, U$ 35 milhões. Mas esse número é bastante variável em função do terreno: muda de acordo com túnel, altura...
E a gente tem a questão de estar em uma área de Serra. Isso deve encarecer o projeto?
Pode. Ou, a gente pode passar por outro lugar. Isso o estudo vai dizer. Por onde vai passar essa rota. Porque o tempo não é um problema para nós, pois somos muito rápidos. Então, às vezes, dar uma volta em uma montanha, vale mais do que furar um túnel.
E como será a sustentabilidade da operação?
Imagina que é um sistema autônomo. Não tem motorista, não tem ninguém lá dentro. Funcionamos com energia solar. Funcionamos com magnetismo. Então o próprio sistema se impulsiona. Não tem necessidade de nada mais para fazer essa propulsão além da energia solar. Então, nosso custo operacional é mais barato do que uma ferrovia. A gente é muito barato do ponto de vista de operação, e somos caros no ponto de vista de construção. Por isso essa relação de retorno de investimento é baixa.
Quando a gente pensa em um projeto deste porte, fica imaginando algo futurista. É uma realidade muito distante?
A tecnologia é muito simples. Não estamos falando de nada que não exista há menos de 20 anos. Temos projetos e patentes que tentaram fazer isso nos Estados Unidos há 100 anos, mas a tecnologia não estava pronta. Estamos falando de um pilar com um tubo à vácuo, que é basicamente um gasoduto. A gente tira o ar dali e coloca uma cápsula, que é basicamente um avião sem asa, num sistema de propulsão magnética que foi desenvolvido há 18 anos nos Estados Unidos pela indústria armamentista. Então, o que a Hyperloop está fazendo é coletar todas essas tecnologias que já existem e transformar em um modal de transporte. Não tem nada futurístico. A ideia de futuro é passada por ser um modal e por ter sido lançada pelo Elon Musk, dono da Tesla. Mas, de fato, a tecnologia é simples. Ela é inovadora, disruptiva, mas ela não é uma inovação que a gente começou do zero. A tecnologia estava ali, a gente só pegou ela e usou. Então, não é futuro. Em 2022, já podemos tê-la nos Emirados Árabes. É um presente bastante presente. Não são 20, 30, 50 anos, é ano que vem. Por aqui, o primeiro passo é o estudo. Então, com o estudo. A gente espera que alguém, aqui no Brasil ou de fora, demostre interesse em evoluir para que, de fato, tenhamos um projeto de construção de médio a longo prazo.
*Colaborou Daniel Giussani