O primeiro evento público do tenente-coronel George Koppe como comandante do 3º Grupo de Artilharia Antiaérea (3º GAAAe), sediado em Caxias do Sul, aconteceu no último dia 04 de abril, durante a apresentação do projeto de restauro do Monumento ao Duque de Caxias. Além de anfitrião do jantar realizado no CTG da unidade militar, ele também foi palestrante, quando falou sobre o uso de drones em combate, um tema que ganhou importância após o uso maciço desses artefatos na Guerra entre Ucrânia e Rússia.
Natural de São Mateus (ES), Koppe foi com dois anos de idade para o Rio de Janeiro, e por isso se considera carioca. Atualmente com 43 anos, é formado como oficial pela Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) em 2002. Tem experiência em outros países, tendo atuado como observador da ONU no Saara Ocidental, na África. E entre 2022-23 fez o Curso de Comando e Estado-Maior Internacional das Forças Armadas Alemãs.
Após assumir o 3º GAAAe em 09 de janeiro, fez um processo inicial de adaptação, onde ficou impressionado com a relação entre a unidade e a comunidade caxiense. Nesta entrevista, ele mostra disposição em esclarecer à população a missão dos militares, e ressalta o entendimento de que o cenário internacional instável precisa servir como alerta, reforçando a necessidade de o Brasil ter forças armadas bem equipadas e atualizadas.
O senhor está em Caxias já desde janeiro. Como está a adaptação à cidade?
Eu estou muito feliz por estar cumprindo essa missão, pois o Exército Brasileiro me confiou o comando desse grupo tradicional, que tem muita interação com a cidade e a impressão de Caxias do Sul é a melhor possível. Uma cidade pujante economicamente, em que as pessoas são muito próximas. Como carioca, me senti muito bem acolhido aqui e desde já agradeço meus amigos do grupo pela calorosa acolhida.
Em sua fala no evento da apresentação do busto do Duque de Caxias, o senhor ressaltou que já notou que, além da função básica, de defesa, o 3º GAAAe tem uma relação mais ampla com a comunidade. Como tem funcionado essa relação?
Perfeitamente. A gente percebe pela característica do colono italiano uma proximidade, há uma interação muito mais próxima do que normalmente nós vemos, por exemplo, quando uma unidade militar está localizada num grande centro. Aqui nós separamos tempo para nos encontrarmos, para interagirmos, e essa interação da sociedade caxiense com o quartel, assim conhecido aqui né, como quartel, só vem aumentar as possibilidades de parceria e a interação com a sociedade. E, na verdade, o Exército é uma extensão da sociedade. Nossos recrutas uma prova disso, servindo ao nosso Brasil e à defesa nacional.
E essa relação mais ampla significa uma compreensão da missão das Forças Armadas? Como o senhor vê esse entendimento por parte da sociedade?
Particularmente aqui em Caxias do Sul existe muita proximidade, fruto do histórico do quartel, pela presença aqui. Então, muitos ex-integrantes que serviram hoje são empresários e pessoas que ocupam altos cargos na cidade, e logo entendem a grandeza e a importância da nossa missão. Mas nós também temos a tarefa de passar àqueles que não conhecem, que nunca serviram, a importância e o papel do nosso quartel, ligado à defesa do nosso espaço aéreo aqui na Região Sul do Brasil e na defesa nacional. Eu faço uma avaliação de que há uma necessidade de nós conscientizarmos cada vez mais a sociedade. Já é histórico termos as visitas escolares e de instituições ao quartel, e tivemos oportunidade de expor os nossos radares e mísseis na Festa da Uva. Sempre que houver uma oportunidade de propagarmos os ideais do Exército e o que fazemos, é importante, pois a sociedade precisa entender que defesa nacional é um assunto que diz respeito a todos nós, nossas propriedades, família e nosso povo.
O senhor esteve até o ano passado na Alemanha, fazendo cursos de aperfeiçoamento, e pode vivenciar, bem proximamente, a realidade da guerra no Leste Europeu. Com base nesta experiência, durante sua palestra, o senhor falou sobre os avanços tecnológicos e como isso tem impactado a guerra e as nações. Que lições o Brasil pode tirar disso?
Hoje em dia, a evolução tecnológica da arte da guerra cresce numa velocidade exponencial. Isso não é apenas investimento em termos de recurso, mas é uma sinergia entre os vários setores da sociedade, a saber: defesa, indústria e academia. Então é a tecnologia, que não se compra e não se vende, e tem que ser desenvolvida. Então hoje, no Brasil, nós temos pessoas capacitadas, mas é necessária essa conscientização para a gente melhorar nossa condição de prontidão, de apresentar a resposta e, principalmente, ter uma tecnologia autóctone, para que possamos valer os nossos ideais os nossos interesses, e fazer valer a vontade nacional.
E a questão do uso de drones na Guerra da Ucrânia, que foi o tema central da sua palestra. Isso veio para ficar?
Isso salta aos olhos, porque nós temos visto, de ambos os lados, um emprego massivo de drones. E muitas vezes, de sistemas de baixo custo, de operação simples, por apenas um soldado, e com um efeito psicológico muito importante no campo de batalha. Isso restringe a liberdade de ação e inflige pesadas baixas, não somente a tropas, mas também danificando equipamentos de alto custo e valor agregado tecnológico. Então, realmente não podemos deixar de mencionar como esse emprego criativo dos drones tem trazido a necessidade de buscar uma doutrina antidrone, de desenvolver técnicas, táticas e procedimentos contra essas ameaças aéreas assimétricas.
Mesmo vivendo uma situação de paz, sem se envolver em conflitos desde a Segunda Guerra Mundial, o senhor ressaltou que o país não pode ficar desguarnecido. Um cenário de rápida mudança, como o que a gente viu na Europa, poderia acontecer também na nossa vizinhança?
O continente sul-americano tem sido classificado como de relativa paz ao longo da história. No entanto, nós temos aqui recursos estratégicos de alta importância. Temos água, terras raras, minerais de alto uso na indústria tecnológica e de material de defesa. Então, existe uma corrida pelos recursos da América do Sul, e isso, aliado ao fato da política sul-americana ser altamente instável, no sentido de alinhamentos hora de um lado e hora de outro, nós podemos ter países que hoje estão aliados com o Brasil amanhã já não estando nessa situação. Nesse contexto, aliado a questões de instabilidades e conflitos como Ucrânia e Israel, que já tem sido uma constante no século XXI, cresce de importância nós fomentarmos e desenvolvermos a mentalidade de defesa no nosso povo. É de extrema importância o Brasil possuir uma capacidade de dissuasão real contra potenciais inimigos e proteger os nossos ativos, nossos recursos estratégicos.