A apreensão e incertezas vividas pelas famílias de crianças prematuras se transformaram em abraços, brincadeiras e afeto na tarde deste domingo (26), durante o terceiro Encontro de Prematuros promovido pelo Hospital de Clínicas de Passo Fundo (HC).
Com brinquedos, pintura de rosto, mateada e apresentações artísticas, pais e filhos puderam ressignificar os momentos de dificuldade junto da equipe da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal, que atende recém-nascidos prematuros há 23 anos.
Boa parte das famílias veio de outras cidades para participar do encontro. Não é por acaso: pelo menos 75% dos bebês que passam pela unidade vêm de fora de Passo Fundo. Ao todo, 284 cidades do norte gaúcho são atendidas pela unidade multidisciplinar do local.
Esse é o caso do pequeno Brian, de 3 meses e 28 dias. Em agosto, ele ficou 27 dias na UTI depois que a mãe, Eliane Ferreira Glovacki, recebeu o diagnóstico da Síndrome de Hellp, uma complicação grave de pressão arterial elevada que acontece durante a gravidez.
Por causa da gravidade do quadro, ela precisou sair às pressas de Trindade do Sul, a 112 quilômetros de Passo Fundo, para se internar com urgência no hospital. Quando nasceu, com 32 semanas e quatro dias, Brian precisou passar por uma ressuscitação cardiopulmonar e intubação enquanto a mãe foi para a UTI.
— Foi apavorante. Ela estava quase tendo falência múltipla de órgãos. As estimativas dizem que menos de 40% das mães sobrevivem. Mas aqui o tratamento foi excelente, costumamos dizer que foram anjos que passaram pela nossa vida — contou o motorista Leocir Glovacki, pai de Brian.
Mas a tempestade não dura para sempre, disse Eliane. Três meses depois, a família viajou de Trindade do Sul a Passo Fundo para agradecer pelo apoio da equipe.
— Depois da tempestade vem a calmaria, a gente costuma dizer. É merecido depois de tudo que a gente passou poder estar comemorando. É a oportunidade de reviver tudo e dizer "muito obrigada" por estarmos aqui — disse Eliane, que é pedagoga e cozinheira.
"A prematuridade tem solução", diz médica pediatria
Já foi o tempo em que nascer prematuro era sinônimo de atraso. Hoje, o avanço da medicina e da ciência possibilitam um acompanhamento 360º dos recém-nascidos — ou seja, uma referência multidisciplinar tanto para o bebê quanto para a família, que é essencial no desenvolvimento do indivíduo dali para frente.
A equipe inclui médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e técnicos em enfermagem preparados para fortalecer as famílias durante o momento de vulnerabilidade.
— Hoje o lema é "pequenas ações, grandes impactos", porque o envolvimento da equipe multidisciplinar abre espaço para uma soma de ações que, juntas, possibilitam que essas crianças e adultos estejam hoje saudáveis. Isso mostra que a prematuridade tem solução e o desfecho pode ser lindo, porque são crianças que escrevem uma história de superação desde o começo — disse a médica pediatra e fundadora da UTI neonatal do HC, Giovana Belke.
O estudante Vitor Pinto, 15 anos, é um exemplo. Ele nasceu com 35 semanas de gestação, quando pesava apenas 1.260 gramas, o que equivale a menos que uma garrafa de 1,5 litro cheia de água. Ficou 64 dias internado na UTI — lembranças que ainda emocionam a mãe, a auxiliar administrativa Clair Gribler, do município de Lagoa Vermelha.
— Só quem passou por isso sabe. E, depois de tanta coisa, podemos dizer que ele é um prematuro que faz tanto ou até mais coisas quanto quem não foi. Vitor gravou um CD com músicas autorais, toca gaita, joga futebol. Ontem mesmo ganhou um campeonato em Bento Gonçalves. E hoje vai viajar para ir no Grêmio. Não é porque é meu filho, mas ele é realmente muito especial — diz ela.
Vitor, que joga como meia atacante no futebol e ala no futsal, está prestes a realizar seu sonho, que é se tornar jogador de futebol. Na próxima semana, ele vai ficar cinco dias em Porto Alegre para fazer testes em busca de uma vaga nas categorias de base do Grêmio. Aos 15 anos, cada dia é um presente: ele se dedicou por meses para conseguir um espaço no time enquanto conciliava os treinos com a escola.
— É muito gratificante ver tudo pelo o que eu e meus pais passamos e poder estar conquistando coisas. Depois de tudo, o que vier está ótimo (risos), especialmente quando eu posso jogar bola, é muito especial para mim — conta o adolescente.