Por Vítor Ortiz, coordenador da Virada Sustentável, gestor cultural e historiador
De 2022 para cá, a Virada Sustentável de Porto Alegre, festival que mescla cultura e socioambientalismo, colocou na cena urbana da cidade a presença marcante de três ícones porto-alegrenses que se projetaram por seus talentos, tornando-se nacional e internacionalmente conhecidos: José Lutzenberger, no edifício do IPE; Daiane dos Santos, no Edifício da Fecomércio, com vista do Viaduto da Conceição; e agora, no Foro Central, com vista para os caminhantes e ciclistas que percorrem a orla do Guaíba, o nosso grandioso Lupicínio Rodrigues, um homem negro, nascido na Ilhota, que até hoje emociona os brasileiros com a sua obra musical.
Homenagens a Lutzenberger, Daiane e Lupi são tão obviamente meritórias que é de se perguntar por que não haviam sido feitas antes.
O evento efêmero passa e as figuras ficam, incentivando a reflexão, a autoestima, a valorização, a memória
O evento, que ocorre também com música gratuita a céu aberto, projeção na ponte de pedra do Largo dos Açorianos, mostra de filmes na Cinemateca Paulo Amorim e uma exposição sobre a Antártica, desde que adotou a arte urbana no seu repertório, tornou-se menos efêmero, mais abrangente e especialmente sensível.
Com esses murais de grafite, a Virada passou a alcançar um público que seria muito difícil de reunir em um único local e hora. A adoção da arte urbana na sua estratégia de programação possibilitou a transcendência de todo o público já alcançado desde a sua primeira edição, em 2016, uma vez que a arte mural permanece como legado, à disposição dos olhares da multidão.
O evento efêmero passa e as figuras ficam, incentivando a reflexão, a autoestima, a valorização, a memória.
A cultura tem esse enorme poder de realizar conscientização sem ter que apelar para o doutrinarismo. Tem o poder contagiante da alegria sem precisar fazer uso da extravagância. A arte traz a sutileza escancarada da crítica ou autocrítica contida na metáfora, sem que seja preciso dizer nada. Olhe e pense, é o que está dito.
Neste caso dos murais do artista Kelvin Koubik, ganham os cidadãos de todas as classes sociais, ganha a cidade, ganha a cultura. Ganhou a Virada. Adquirimos e perenizamos os valores. Cultivamos futuro e sustentabilidade.